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Célebre cientista político Olivier Duhamel é acusado de incesto na França

05/01/2021 15h33

A jurista Camille Kouchner publicará na quinta-feira (7) um livro no qual acusa seu padrasto, um reconhecido cientista político francês, de ter agredido sexualmente seu irmão gêmeo quando ele tinha apenas 14 anos. Depois de tomar conhecimento de fragmentos do depoimento, a promotoria de Paris abriu, nesta terça-feira (5), uma investigação por "estupro e agressão sexual" contra Olivier Duhamel, um verdadeiro escândalo na França, onde o especialista participa com frequência de programas de TV e congressos.

Filha de Bernard Kouchner, ex-ministro das Relações Exteriores da França e um dos fundadores da ONG Médicos Sem Fronteiras (MSF), casado com a ex-apresentadora e estrela da tevê francesa, Cristine Ockrent, a jurista Camille Kouchner conhece bem os bastidores das colunas sociais do país.

A Promotoria de Paris abriu nesta terça-feira (5) uma investigação por "estupro e agressão sexual" contra seu padastro, Olivier Duhamel, após a publicação de trechos do livro da advogada, que o acusa de ter agredido sexualmente seu irmão gêmeo adolescente no final dos anos 1980, conforme anunciado pelo procurador de Paris, Remy Heitz.

Horas antes, o renomado cientista político renunciou a todos os cargos, inclusive o de presidente da Fundação Nacional de Ciência Política (FNSP).

"Sendo alvo de ataques pessoais e desejando preservar as instituições em que trabalho, pedi demissão de minhas funções", escreveu no Twitter. Duhamel também apresenta um programa de rádio na Europe 1 e  escreve crônicas para o canal de TV do Senado francês, a rede LCI.

O jornal Le Monde e o semanário L'Obs revelaram na segunda-feira (4) trechos de "La Familia Grande" ("A Grande Família", em tradução livre), da Editora Seuil. "Eu tinha 14 anos, sabia e não disse nada", escreve Camille Kouchner, hoje uma professora de direito de 45 anos.

Ela e seu irmão são filhos do ex-ministro e médico humanitário Bernard Kouchner e da professora de direito Evelyne Pisier (falecida em 2017), que mais tarde se casou com o cientista político Olivier Duhamel.

Na publicação, Camille Kouchner afirma que as agressões sexuais aconteceram durante vários anos.

"Muitos sabiam"

"Meu livro conta quantas pessoas sabiam disso", disse a autora em entrevista à revista L'Obs. "Claro que pensei que meu livro poderia parecer obsceno devido à notoriedade da minha família. Mas aí eu disse: é exatamente por isso que você tem que fazê-lo", acrescentou.

Questionado pelo Le Monde e L'Obs, Olivier Duhamel disse que "não tinha nada a dizer" e não quis reagir à informação.

A FNSP, responsável pelas orientações estratégicas e pela gestão administrativa da prestigiosa universidade francesa Sciences Po, disse ter tomado conhecimento da sua demissão "por motivos pessoais".

O silêncio de uma "família"

O testemunho de Camille Kouchner é também a denúncia de uma época e de um círculo social. "La Familia Grande", em espanhol no título original, refere-se à geração de intelectuais parisienses de esquerda marcados pelo ideal revolucionário de movimentos na América Latina.

Evelyne Pisier, a mãe dos gêmeos, partiu para Cuba em 1964, onde, como aponta o jornal Le Monde, "ela viveu um idílio de quatro anos com Fidel Castro".

Da mesma forma, o livro mergulha no ambiente de permissividade que se seguiu ao Maio de 68 francês, onde qualquer obstáculo ao prazer era sinônimo de repressão.

O depoimento também lembra a publicação, há um ano, de "O Consentimento", de Vanessa Springora, onde a autora aborda a tolerância do mundo intelectual parisiense com o abuso sexual de menores - a começar pelo dela - nos anos 1980.