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Um ano depois, trabalho em home office pode ser mais produtivo do que presencial

17/03/2021 07h52

Há exatamente um ano, a pandemia de coronavírus transformou a vida profissional de milhões de pessoas pelo mundo. O trabalho à distância, até então restrito a poucos setores, se generalizou de um dia para o outro e impôs adaptações. O resultado é que, quando é realizado em condições adequadas, o home office pode trazer ganhos de eficiência de em torno de 20%, conforme estudos de consultorias especializadas.

Lúcia Müzell, da RFI

Nesta semana, o Instituto Sapiens, da França, publicou um relatório indicando que o trabalho remoto não apenas impediu o pior na economia do país, evitando uma queda de mais 9% do PIB, como se mostrou uma fórmula eficaz para elevar a produtividade. O diretor do estudo, o economista Erwann Tison, nota que, em casa, os colaboradores têm menos distrações do que no escritório - são menos interrompidos, perdem menos tempo com atividades dispensáveis e economizam os minutos valiosos gastos em transporte.

"Vimos que o teletrabalho, quando é feito com parcimônia e não a 100%, pode levar ao aumento de 22% da produtividade dos funcionários, um índice semelhante ao já encontrado em várias outras pesquisas no mundo. Ao permitir um melhor equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal, o funcionário não precisa mais se ausentar do trabalho para resolver algum problema pessoal, por exemplo", observa o economista.

As boas condições de trabalho para um funcionário render ainda mais em casa do que no escritório são essenciais: deve dispor de um local adaptado para as atividades profissionais, incluindo suporte tecnológico adequado, e silêncio para poder se concentrar.

"Se a pessoa precisa cuidar dos filhos ao mesmo tempo ou a sua empresa não previu as condições para ele poder trabalhar, a produtividade será menor que no escritório, com certeza", destaca.

Ambiente de casa é o melhor que existe, diz psiquiatra

O psiquiatra especialista em depressão no trabalho, Marc Willard, confirma que, pouco a pouco, chefes e empregados foram se adequando à nova realidade, de modo que hoje ele escuta mais relatos de satisfação do que queixas relacionadas ao home office.

"Acho que a produtividade é bem melhor se estamos em casa, mas em boas condições. Não há lugar melhor para trabalhar do que num local que nós mesmos escolhemos, e onde não estaremos sendo importunados pelos colegas", afirma Willard, autor de La dépression au travail (A Depressão no Trabalho, em tradução livre), entre outras obras relacionadas ao tema. "Mas se você tem o seu chefe que te liga quatro vezes por dia, vira um escândalo. É como voltar a uma organização do trabalho do século 19."

O especialista em informática de finanças Marcello Faga é funcionário de um grande banco francês e viveu a reviravolta do teletrabalho como uma "pequena revolução": começou atrapalhada, tanto do lado da empresa quanto da equipe. Mas com o passar dos meses, essa nova forma de trabalhar evoluiu e se mostrou ideal - ainda mais para um pai de família que acabou de receber um segundo bebê em casa. Ele tem liberdade de horários, a confiança dos chefes e, em troca, devolve um desempenho tão ou até mais engajado quanto antes da pandemia.

"Tenho o meu cantinho para trabalhar em silêncio e fico completamente à vontade. Tenho em casa a mesma estrutura que eu teria no escritório e sinto que, em geral, a minha produtividade não mudou em casa. Quando a rede está funcionando tão bem quanto na empresa, podemos até incrementar a nossa produtividade", avalia. "As mudanças na situação familiar devem ser levadas em conta nessa situação, e a verdade é que eu estaria mal de estar na empresa e longe do meu bebê e da minha companheira."

Estresse profissional é proporcional ao controle que temos, ou sofremos

O psiquiatra ressalta que o estresse profissional é diretamente ligado ao controle que podemos ou não ter sobre as próprias atividades. É por isso que os profissionais liberais tendem a sofrer bem menos com burn out, ao gerenciarem o tempo como preferem. O paralelo agora é feito com o teletrabalho - para funcionar, precisar ser baseado na confiança.

"Significa deixar a pessoa trabalhar como ela deseja. O trabalho remoto impõe novas relações que devem permitir a autonomia completa, para aqueles que podem, de exercer o seu trabalho", ressalta Willard. "A tarefa que você precisa executar em home office não tem mais nenhuma razão de ser feita obrigatoriamente entre 8h e meio-dia e entre 14h e 18h."

Um país como a França passou de 3% de trabalhadores em home office total ou parcial, em fevereiro de 2020, para cerca de 40% atualmente. Erwann Tison é mais um dos que apostam que, independentemente da pandemia, o trabalho à distância veio para ficar.

É por isso que essa nova forma de gestão de pessoal deve ser levada a sério tanto pelos governos, quanto pelas empresas. Trabalhar à distância e gerenciar uma equipe de casa são tarefas que se aprende - do contrário, os resultados podem começar a despencar, minados pela desmotivação gradual do grupo, pelo isolamento.

"Não é porque estamos à distância que não devemos organizar momentos de troca e conversas entre a equipe, inclusive prever tempo para as relações informais entre os funcionários. É preciso implementar isso para funcionar", sublinha o economista. "Pode ser um dia por semana em presencial, com toda a equipe, ou usando as ferramentas digitais que nos permitem conversar à distância. É indispensável, e cabe aos chefes conseguir manter esse espírito de coesão, de grupo."

Se você está em home office todo esse tempo, as conclusões de uma pesquisa australiana publicada em fevereiro podem lhe tranquilizar sobre um ponto: os funcionários trabalham tão bem à distância com ou sem... pijamas. O estudo mostrou que trocar de roupa e se arrumar em casa tem impacto no moral dos colaboradores, mas não na produtividade.