Coreógrafa Lia Rodrigues estreia em Paris novo espetáculo produzido na Maré
O espetáculo de dança "Encantado", de Lia Rodrigues, encerra a programação imaginada pela coreógrafa brasileira para o Festival de Outono de Paris. O espetáculo estreou na quarta-feira (1°) no Teatro de Chaillot da capital francesa, depois de nove meses intensos de criação, durante a pandemia.
Em cena, onze bailarinos da companhia de Lia Rodrigues, sediada no Complexo da Maré, no Rio de Janeiro, e de onde são originários vários dançarinos.
"Eu fico encantada pelo fato de poder fazer um trabalho de dança no Brasil hoje. A gente tem um presidente genocida, que tem um projeto de destruição não só do meio ambiente como da cultura e de todas as instituições democráticas no Brasil. Então eu acho que é muito importante falar que a gente conseguiu montar um projeto de dança dentro do Centro de Artes da Maré", conta a coreógrafa.
Para ela, o espetáculo é uma forma de resistência ao atual governo brasileiro. "Eu acho que a gente pode ligar a festa à resistência. A festa no Brasil tem um significado muito forte", diz Lia, sobre a primeira parte do espetáculo, em que os bailarinos se cobrem um a um com cobertores que são oferecidos aos moradores de rua do Rio de Janeiro, "principalmente agora, com o aumento gigantesco da pobreza".
Lia explica que "Encantado" são entidades da cosmogonia afro-ameríndia: "São seres que ficam entre o céu e a terra, habitam lugares da natureza."
"Eu fui muito inspirada, no início a pandemia, em 2020, por um livro do Itamar Vieira que se chama Torto Arado, em que uma história é contada por três perspectivas diferentes, e a última é mulheres de um Encantado. Isso foi o ponto de partida para o trabalho", diz Lia, que usa um trecho da música indígena cantada durante as manifestações contra o marco temporal, em agosto e setembro deste ano.
Lia Rodrigues é uma embaixadora da dança contemporânea brasileira na França. O Festival de Outono, o tradicional evento de artes plásticas, dança, teatro e música de Paris, a homenageou nesta 50ª edição dedicando uma programação especial à coreógrafa brasileira.
Mas ao invés de escolher apenas coreografias próprias, Lia Rodrigues convidou outros dez coreógrafos para apresentar do painel coletivo "Retrato Lia Rodrigues".
"O coletivo e a diversidade das formas de olhar o mundo são muito importantes. E este momento está muito duro para os artistas no Brasil. Então eu achei o melhor momento para mostrar a diversidade e a beleza destes artistas, do que eles têm para falar, das suas estéticas e pensamentos; e ao mesmo tempo de eles poderem também estar no mundo com estas propostas e terem trabalho, porque trabalho no Brasil está muito difícil", explica a coreógrafa.
"Este retrato coletivo é o mais parecido com o jeito que eu penso a vida", finaliza Lia Rodrigues.
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