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Revista francesa realça multiplicidade de vozes femininas na poesia contemporânea brasileira

27/04/2022 08h50

O que há de novo na poesia brasileira contemporânea? Muitas mulheres escrevendo poesia, de forma inovadora e múltipla. Essa constatação levou a revista de poesia francesa "Place de La Sorbonne" a publicar em seu último número, que acaba de ser lançado na França, um dossiê especial sobre a multiplicidade de vozes poéticas femininas no Brasil.

O dossiê "Vozes de mulheres; poesia (e política) no Brasil de hoje" foi organizado por Patricia Lavelle, professora do Departamento de Letras da PUC do Rio de Janeiro. Ela escolheu onze poetas brasileiras, todas vivas, para exemplificar a emergência desse fenômeno. São elas: Ana Martins Marques, Josely Vianna Baptista, Leila Danziger, Lu Menezes, Nina Rizzi, Simone Brantes, Lubi Prates, Marilia Garcia, Angélica Freitas, Izabela Leal. A própria Patrícia Lavelle fecha a lista. "Essa lista de 11 não é exaustiva. Há muitas outras", garante.

Todos os poemas foram publicados na prestigiosa revista "Place de La Sorbonne" em português e francês. Lavelle também assina a tradução da maioria das poesias ao lado de Inês Oseki-Depré, com colaboração pontual de Marc de Launay e de Dolors Català. "Essa questão de traduzir em francês foi para mim muito importante. É um modo de recuperar essa língua e criar espaços para ela dentro da outra", conta a autora de Bye Bye Babel, seu primeiro livro de poesias.

Grandes poetas mulheres do século 20

O ponto de partida do dossiê foi a constatação da multiplicidade de vozes poéticas femininas nos últimos 20 anos. O Brasil tem grandes nomes de poetas mulheres, ­como Cecília Meirelles, Hilda Hilst, Adélia Prado, Ana Cristina César ou Cora Coralina, que marcaram a história da poesia nacional no século XX. Mas para Patrícia Lavelle o fenômeno atual é realmente uma novidade porque "a metade da cena poética é ocupada por vozes femininas, o que não era o caso no século XX".

A organizadora lembra que, mesmo com essas poetas incríveis, antigamente os dossiês de poesia eram, por exemplo, "compostos por 9 homens e uma mulher. Hoje em dia não é mais assim. Aconteceu essa pluralização". Ela ressalta ainda que esse é um fenômeno "intergeracional".

"São mulheres de idades diferentes. Eu acho que ele encontra eco no que está acontecendo no contexto poético contemporâneo na França também, sempre tendo essa preocupação de dizer que não se trata de um 'identitarismo', de um exclusivismo", indica. Lavelle explica que essa "pluralização de vozes" revela um universo nada "homogêneo" e vários pontos de vista.

A temática feminina não é dominante. "Achei importante enfatizar a relação das mulheres com a tradição, com o próprio passado literário, com o próprio passado poético".

Fenômeno é também político

O fenômeno é também político e revela o Brasil de hoje, que vive "um momento muito importante da visibilidade das mulheres na vida pública".

Patrícia Lavelle acredita que a recrudescência de certos discursos misóginos de extrema direita nos últimos anos no país "é uma reação ao fato das mulheres estarem ocupando cada vez mais espaços públicos, na politica, na vida econômica, na cultura". Por isso, no Brasil como na França, "conferir visibilidade à potência criativa desta produção feminina tem hoje um caráter político", aponta.