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Brasil no G7 significa retorno do país aos trilhos da democracia e oportunidade de negócios, dizem analistas

18/05/2023 10h30

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve desembarcar em Hiroshima na manhã desta sexta-feira (19) para participar do encontro do G7. O convite partiu do primeiro-ministro japonês, Fumio Kishida, já que o país ocupa a presidência rotativa do bloco. Lula havia sido o último chefe do executivo brasileiro a se juntar ao G7 em 2009.

Raquel Miúra, correspondente da RFI em Brasília

A participação do Brasil como convidado na reunião do G7 tem vários significados e aspirações: do retorno do país à ribalta das relações internacionais ao pragmatismo de enxergar na relação com o mundo uma forma de alavancar a economia interna. Além disso há o reconhecimento de que a maior nação latino-americana se afastou dos discursos antidemocráticos que marcaram sua imagem nos últimos quatro anos, como ressaltou à RFI o especialista em relações internacionais Gustavo Glodes Blum, pesquisador visitante na Universidade de Coimbra, em Portugal.

"O G7 se apresenta hoje não mais como as sete maiores economias do mundo, principalmente pela ascensão econômica da China, mas também pela Rússia e mesmo países como Arábia Saudita, que têm um dinamismo às vezes maior que alguns países europeus e da América da Norte. Mas se mostra como as democracias mais ricas do mundo. E essa mudança, que se delineou mais com a invasão russa à Ucrânia, tem um aspecto interessante ao trazer o presidente Lula de volta ao encontro. O Brasil é recebido como um país que defende sua democracia, ao contrário do que foi visto nos últimos quatro anos".

Na parte prática do encontro, Blum avalia que "a participação do Brasil em fóruns internacionais é sempre importante para a imagem do país, como a volta de um player, de um jogador importante. E também significa a tentativa do Brasil de se vincular aos circuitos de acesso a recursos internacionais, não só o Fundo Amazônia, mas também benefícios comerciais".

Guerra da Ucrânia

No jargão das relações internacionais se fala em diplomacia presidencial quando o próprio presidente toma à frente de encontros e viagens, o que pode facilitar a ratificação de negócios e acordos, mas isso não significa que a tentativa de um cessar fogo na Ucrânia, um dos principais assuntos da bagagem de Lula, terá digestão fácil no encontro do Japão.

O analista internacional Lucas Leite, professor na FAAP e pesquisador da UNESP, diz que a própria formação do G7 pode ser um entrave para as pretensões brasileiras nesse tema. "É claro que a questão da Ucrânia vai ganhar destaque. Aí é interessante lembrar que antigamente a reunião era o 'G7 mais 1', o G8, justamente com a Rússia, que hoje está fora. Então haverá sim o tema da guerra. Mas é bom frisar que esse bloco é uma instituição do status quo, desse ordenamento liberal dos Estados Unidos, da Europa. E assim vai defender uma posição específica em relação ao conflito, de que a Ucrânia tem que ser defendida em última instância contra qualquer tipo de agressão, e que a Rússia é o país culpado. Então não sei se há uma abertura grande para um processo de negociação como o defendido pelo Brasil."

Apesar de se diferenciar de blocos mais plurais, como o G20, do qual o Brasil participa de forma efetiva, Leite lembra que aspectos globais do G7 coincidem com a pauta defendida historicamente pela diplomacia brasileira. "A reunião do G7 foca principalmente nesse ordenamento liberal que nós temos do sistema internacional, pautado pela hegemonia dos Estados Unidos, que fala em geral sobre democracia, direitos humanos na perspectiva ocidental, a necessidade de combater mudanças climáticas. Então corrobora muito o que a agenda brasileira tradicionalmente sempre defendeu, com exceção de um governo ou outro, especialmente o governo anterior."

E conclui que "ao participar de encontros internacionais o Brasil ganha visibilidade, protagonismo, capacidade de poder atuar junto às demais potências na discussão de questões que são essenciais."

Comércio

O G7 é formado por Alemanha, Canadá, Estados Unidos, França, Itália, Japão e Reino Unido. Além do Brasil, participam como convidados a Austrália, Coreia do Sul, Índia, Ilhas Comores, Ilhas Cook, Indonésia e o Vietnã, além de representantes das Nações Unidas, Fundo Monetário Internacional, Banco Mundial, Agência Internacional de Energia, União Europeia entre outras organizações.

O Brasil já tem encontros bilaterais já agendados com representantes de alguns desses país. O consultor de comércio exterior Michel Alaby, CEO da Alaby & Consultores Associados, avalia que por isso a viagem ao Japão é também uma oportunidade para estimular negócios e as vendas externas.

"O Japão até já sugeriu um acordo de livre comércio com o Mercosul, o que é um pouco difícil em função da agricultura, porque o Japão subsidia muito a produção agrícola de seu país. Mas é evidente que o presidente Lula terá encontros paralelos. Já foi solicitado pelo Vietnã, pela Indonésia, pela Austrália. Enfim, tudo isso nos leva a crer que há possibilidades efetivas."

Alaby lembra que um dos temas oficiais do encontro é a segurança alimentar do planeta, e aí o Brasil, que tem no agronegócio um de seus pilares econômicos, pode se sobressair. "Evidentemente que nesses eventos o Brasil se mostra ao mundo. E é importante que, após 14 anos, o país seja novamente chamado a esse encontro de grandes potências. E haverá essa discussão sobre segurança alimentar, que é um dos tópicos prioritários do Brasil. Somos um dos maiores players do agrobusiness no mundo, com interesse em expandir as exportações para os outros países."