Guerra Israel x Hamas: as consequências da resolução aprovada na ONU

Após a aprovação da resolução pelo Conselho de Segurança da ONU exigindo um cessar-fogo imediato, as negociações em Doha, no Catar, correm risco. Israel determinou o regresso de parte da delegação que estava no país. No entanto, o porta-voz do governo catari diz que as negociações prosseguem, apesar das dificuldades.

Por Henry Galsku, correspondente da RFI em Israel

Havia a expectativa da resposta do Hamas e ela veio por meio de comunicado. O grupo voltou a insistir em suas demandas iniciais: cessar-fogo abrangente, retirada completa das tropas israelenses da Faixa de Gaza, o retorno para o norte do território da população palestina deslocada ao sul, e uma "troca de prisioneiros real".

Essas exigências expressam, na prática, a rejeição à proposta que estava sobre a mesa e que, até agora, era a mais favorável ao grupo palestino apresentada por Israel.

"Israel não se submeterá às exigências ilusórias do Hamas e continuará a agir para alcançar todos os objetivos da guerra: libertar todos os reféns, destruir as capacidades militares e governamentais do Hamas e garantir que Gaza não representará mais um ameaça a Israel", disse por meio de comunicado o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

Havia um "otimismo cauteloso" (expressão que se tornou comum neste processo) sobre a atual rodada de negociações. Israel praticamente dobrou o número de prisioneiros palestinos que seriam libertados e, pela primeira vez, demonstrava a intenção de permitir o retorno ao norte da Faixa de Gaza de mulheres, crianças e idosos deslocados ao sul do território.

Ao mesmo tempo, o Catar exercia pressão sobre o Hamas de forma a obter uma resposta positiva por parte de Yahyia Sinwar, o líder do grupo em Gaza.

Netanyahu mal avaliado em Israel

Há uma sensação de perda de esperança, em especial por parte dos familiares dos reféns, que tinham a expectativa de que dessa vez as negociações pudessem produzir algum resultado. Apesar de a resolução também determinar a libertação dos israelenses, é improvável que o Hamas faça isso apenas a partir de uma decisão da ONU. Israel tampouco se mostra disponível a um cessar-fogo sem qualquer contrapartida relacionada aos cidadãos do país sequestrados.

Continua após a publicidade

No campo político, há uma crise de confiança nas instituições e no primeiro-ministro Benjamin Netanyahu; pesquisa do Instituto de Democracia de Israel (IDI) revela que apenas 23% da população confiam no governo. No caso específico de Netanyahu, cinquenta e sete por cento do público consideram seu desempenho "ruim ou muito ruim".

Ao responder sobre a resolução, o premiê israelense divulgou um comunicado que tem como ponto fundamental a ideia de que a decisão do Conselho de Segurança da ONU concede uma espécie de "prêmio" ao Hamas.

"A resolução dá ao Hamas a esperança de que a pressão internacional vai permitir que ele receba um cessar-fogo sem libertar nossos reféns", diz o texto.

Mas a posição de Netanyahu não é unânime, em especial porque ela aprofundou a crise com os Estados Unidos, que não vetaram a aprovação da resolução na ONU.

A situação "poderia ser conduzida de outra maneira. É melhor manter as disputas em salas fechadas e no cenário internacional coordenar tudo com a maior potência do mundo e nosso aliado mais importante", escreveu Yair Lapid, líder da oposição israelense, em sua conta na plataforma X (ex-Twitter).

Em entrevista à RFI, Saar Alon-Barkat, Doutor em Ciências Políticas e professor da Universidade de Haifa, fez análise similar.

Continua após a publicidade

"A decisão não vincula o cessar-fogo à libertação dos reféns israelenses. Mas Netanyahu me parece querer 'vencer' esse conflito com os norte-americanos por questões políticas internas. A resolução é problemática do ponto de vista de Israel, mas considero que as nossas lideranças políticas deveriam saber gerenciar melhor as questões diplomáticas diante da comunidade internacional e em especial do principal aliado do país, os Estados Unidos", disse.

Revelações de abuso sexual

Em meio a esta grande disputa política, as revelações de uma das ex-reféns em Gaza passou a dominar as conversas e a cobertura da imprensa israelense. Amit Soussana, de 40 anos, foi sequestrada pelo Hamas durante os ataques de 7 de outubro e foi libertada na única trégua ocorrida até agora, no final de novembro.

Em entrevista ao jornal norte-americano New York Times, ela relatou em detalhes os abusos sexuais a que foi submetida durante o período em que foi refém do Hamas.

"O guarda começou a me perguntar sobre a minha vida sexual. Eu estava acorrentada pelo tornozelo esquerdo, e às vezes ele se sentava ao meu lado, na cama, levantava minha blusa e me tocava. Ele também perguntava repetidamente sobre minha menstruação e quando ela terminaria", relatou.

Ela também contou ter sido arrastada para o quarto das crianças da casa onde estava presa e, com uma arma apontada contra a testa, foi forçada a praticar um ato sexual pelo seu raptor.

Continua após a publicidade

Por mais que as investigações da ONU e relatos de testemunhas sobre o uso do estupro como arma de guerra sejam conhecidos, Amit Soussana é a primeira das reféns libertadas a falar abertamente sobre o assunto.

O relato tem sido o principal tema de debate em Israel desde a publicação da entrevista e aumenta a ainda mais a pressão por um acordo capaz de libertar os demais reféns.

Deixe seu comentário

Só para assinantes