Antissemitismo domina campanha das eleições legislativas na França após estupro de menina judia

A primeira semana da campanha das eleições legislativas antecipadas na França foi monopolizada por um crime que chocou o país: o estupro coletivo de uma menina judia de 12 anos por três outros adolescentes. Manifestações contra o antissemitismo estão sendo realizadas em todo o país para denunciar crimes de discriminação e ódio contra a comunidade judaica.

Daniella Franco, da RFI

As agressões horrorizaram a França. A polícia francesa revelou detalhes do que classificou de "um calvário" vivido por uma menina judia de 12 anos no último sábado (14) em Courbevoie, na periferia de Paris.

Ela foi levada à força por dois adolescentes de 13 anos e um garoto de 12 anos a um imóvel abandonado, onde foi torturada, agredida fisicamente e estuprada ao confirmar ser de confissão judaica. Os três menores foram identificados e detidos para interrogatório.

A notícia do estupro coletivo veio à tona no início dessa semana, quando começou oficialmente a campanha das eleições legislativas antecipadas. A agressão monopolizou o debate político, em um momento em que o partido de extrema direita Reunião Nacional lidera as pesquisas, com mais de 30% das intenções de voto.

Trocas de farpas entre os partidos

Líderes de todos os partidos se manifestaram nesta semana sobre o estupro coletivo e trocaram farpas sobre o problema do antissemitismo no país. No alvo das acusações está o partido França Insubmissa, da esquerda radical. A legenda integra a coligação da esquerda Nova Frente Popular, junto com o Partido Socialista, o Partido Comunista e o Europa Ecologia Os Verdes, formada especialmente para as eleições legislativas antecipadas.

Logo após os ataques de 7 de outubro de 2023, que deu início à guerra na Faixa de Gaza, alguns membros do França Insubmissa se recusaram a classificar o Hamas como um grupo terrorista. Recentemente, o líder do partido, Jean Luc Mélenchon, também minimizou o problema do antissemitismo na França.

Nesta sexta-feira (21) em entrevista à BFMTV, a deputada Mathilde Panot, do França Insubmissa, argumentou que "nenhum dos membros da Nova Frente Popular foi condenado". A parlamentar também ressaltou que "o antissemitismo precisa ser combatido em todos os lugares" e lembrou que no programa da coligação há um plano contra o ódio racial e religioso.

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De fato, entre todos os partidos, é apenas a Nova Frente Popular que tem, até o momento, propostas contra esse problema. Eles propõem a criação de um Observatório contra as Discriminações e oferecer mais meios para que a Justiça possa processar e punir autores de crimes racistas, antissemitas e islamofóbicos.

O programa do partido centrista Renascimento, do presidente francês, Emmanuel Macron, que foi apresentado em coletiva de imprensa na quinta-feira (20) pelo primeiro-ministro Gabriel Attal. Embora não conte com nenhuma proposta direta direcionada ao antissemitismo, o premiê convocou as autoridades políticas "a erguerem barreiras ao antissemitismo".

Vários membros do governo, entre eles, o próprio Macron, lembram as declarações controversas dos membros do França Insubmissa, e também as origens do partido Reunião Nacional. A legenda da extrema direita é o antigo Frente Nacional, fundado nos anos 1970 por um movimento neofascista, com integrantes de uma ex-milícia nazista.

No entanto, os líderes de hoje do Reunião Nacional alegam que se desvencilharam do passado obscuro. Em uma operação de repaginação, a liderança da legenda foi atribuída a Jordan Bardella, de 28 anos, admirado por parte da juventude francesa. Segundo ele, a comunidade judaica da França sabe que o Reunião nacional é "um escudo aos judeus da França".

Manifestações em toda a França

O estupro coletivo suscitou uma onda de indignação na França. Durante toda a semana, organizações judaicas convocaram protestos nas principais cidades do país. Na quinta-feira (20), uma mobilização foi realizada na Praça da Bastilha, no leste de Paris, com o apoio de várias associações, entre elas, a SOS Racismo e a Fundação das Mulheres.

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Nesta sexta-feira, centenas de pessoas se reuniram diante da prefeitura de Courbevoie, palco do crime. Presente no protesto, o presidente do Conselho Representativo das Instituições Judaicas da França (Crif), afirmou que é "urgente soar o alarme" e "enviar uma mensagem à sociedade francesa" diante do antissemitismo.

Em um balanço publicado em maio, o Instituto Francês de Opinião Pública (Ifop) e a Fundação Pela Inovação Política apontaram que, desde o 7 de outubro de 2023 e a retaliação israelense na Faixa de Gaza, os atos antissemitas tiveram um aumento de 1000% na França. A aversão à comunidade judaica é verificada principalmente entre a camada mais jovem da população: 35% dos entrevistados da faixa etária 18-24 anos acredita que esse sentimento é justificado devido à falsa ideia de que todo judeu apoia o governo do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu.

A imprensa francesa recolheu depoimentos de judeus e judias nas manifestações contra o antissemitismo nesta semana na França. Membros da comunidade judaica denunciam ser frequentemente alvo de ameaças físicas e verbais. Muitas pessoas afirmam que estão ocultando seus sobrenomes para não terem sua religião identificada.

"Há gente que nos persegue", diz a francesa Rebecca ao jornal Le Figaro. "Tememos por nossas vidas. Tem quem diga que exageramos, mas vivemos um inferno cotidiano desde o 7 de outubro", reitera.

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