Sob pressão, Macron vai tentar bloquear acordo UE-Mercosul durante giro na América Latina

A partir de sábado (16), na América Latina, o presidente francês Emmanuel Macron pretende argumentar contra a possível assinatura em breve de um controverso acordo de livre comércio entre a União Europeia e o Mercosul, que traria à tona uma perda de influência francesa e poderia incendiar os debates sobre a questão na região.

O giro do presidente francês pela América Latina vai durar seis dias, e o levará à Argentina e ao Brasil, os dois pesos pesados desse bloco regional, assim como ao Chile.

Emmanuel Macron chega em um momento crucial na região: a cúpula do G20 no Rio de Janeiro, da qual ele participará na segunda e na terça-feira, bem como a cúpula do Mercosul no início de dezembro, encontros  que já foram citados como prazos-chave pelos defensores do tratado comercial, que eles esperam ver concluído até o final do ano.

Mas a viagem do chefe de Estado coincide ainda com uma nova rodada de protestos de agricultores na França, que começa na segunda-feira (18), especialmente contra o acordo.

Menos de um ano depois de uma histórica revolta de agricultores franceses, "a mensagem que será enviada terá um tom alto e claro para a Comissão Europeia", de acordo com um ministro de Macron, que vê nas novas manifestações um reforço na queda de braço com Bruxelas. É a Comissão Europeia que negocia com o Mercosul (Brasil, Argentina, Paraguai, Uruguai e Bolívia) há mais de 20 anos o tão polêmico acordo bilateral União Europeia-Mercosul.

Espanha e Alemanha querem acordo com Mercosul

Vários países europeus, incluindo a Espanha e a Alemanha, querem que o acordo seja concluído, pois ele promoveria a exportação de carros, máquinas e produtos farmacêuticos da UE.

Por outro lado, os fazendeiros franceses e, em uma rara demonstração de unanimidade, e a classe política do país, temem uma inundação de carne do Brasil e da Argentina e alertam para a concorrência desleal de produtos que não estão sujeitos aos rígidos padrões ambientais e de saúde em vigor na Europa.

"Da forma como está, o Mercosul não é um tratado aceitável", reafirmou Emmanuel Macron em meados de outubro.

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No início do ano, a comitiva do presidente francês havia se vangloriado de sua influência, afirmando que ele havia conseguido convencer a presidente da Comissão Europeia a suspender as negociações. Mas, desta vez, Ursula von der Leyen parece determinada a ir até o fim.

Fracasso de Macron poderia deflagrar nova revolta de agricultores

Será que Emmanuel Macron, enfraquecido pela dupla derrota de seu partido e de aliados nas eleições europeias e legislativas, ainda conseguirá bloquear o acordo com o Mercosul? Caso contrário, isso seria um fracasso pessoal. 

Na América do Sul, durante uma turnê que começa na Argentina do polêmico Javier Milei, Macron tentará explicar a recusa francesa aos países do Mercosul e lhes assegurar que ela não é definitiva. Paris está preparada para aceitar um texto que inclua a conformidade com o Acordo de Paris para o clima e os padrões sanitários europeus.

O chefe de Estado francês deve fazer um discurso no Congresso do Chile na quinta-feira, dirigido à América Latina. Não por acaso: este é um país com o qual a UE conseguiu concluir um acordo comercial considerado aceitável por Paris.

Uma posição que não é boa o suficiente para alguns oponentes. "Vocês continuam a dizer que outro acordo com o Mercosul é possível. Nós não queremos isso de jeito nenhum. Bloqueiem as negociações", disse o deputado do partido de esquerda radical, França Insubmissa, Arnaud Le Gall, ao governo em discurso na Assembleia Nacional esta semana.

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França quer convencer Polônia a bloquear acordo

Na Europa, Emmanuel Macron está tentando reunir outros países, como a Polônia, para formar uma minoria de bloqueio contra o acordo com o Mercosul. Mas não há nada que diga que os países que demonstram reservas chegarão ao ponto de rejeitar a proposta, no caso de uma votação.

O governo francês rejeita qualquer possibilidade de fracasso no bloqueio ao acordo, destacando que nenhuma assinatura está prevista na cúpula do G20 no Rio.

"Nada está decidido. O boato de que 'nós somos os perdedores' não foi comprovado de forma alguma", diz uma fonte da comitiva do primeiro-ministro francês Michel Barnier. "Não acho que estejamos tão isolados e em minoria", concorda uma fonte próxima a Macron, que lembra a carta enviada por mais de 600 deputados franceses para Ursula von der Leyen pedindo para a Comissão Europeia não assinar o tratado com o Mercosul. 

Os parlamentares alertam que se Bruxelas "se opuser à França, um dos principais membros fundadores da União", isso provocaria "uma explosão democrática".

Esse é outro ponto de pressão do executivo francês, que parece ciente das dificuldades em reunir os votos necessários para formar uma minoria de bloqueio dentro da UE. Na quarta-feira, o chefe da diplomacia francesa, Jean-Noël Barrot, afirmou que a Comissão Europeia estaria 'extrapolando' seu mandato ao tentar avançar com base na maioria dos votos, em vez de buscar unanimidade entre os 27 Estados-membros do bloco.

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"Recomendo que a posição de um país como a França não seja ignorada", afirmou Michel Barnier após se reunir com Ursula von der Leyen em Bruxelas.

(Com AFP)

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