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Americanos esperavam que Obama tivesse a resposta para a confusão do mundo

Jorge Ramos

12/09/2014 00h01

"Como o mundo está estranho."

É a terceira vez que escuto o mesmo comentário em uma semana. Para nós que trabalhamos cobrindo notícias, reportar em poucos dias sobre uma guerra, uma invasão, um alerta terrorista, dois furacões e três declarações presidenciais é algo normal. Mas sim, devo reconhecer que é cada vez mais difícil explicar o que está acontecendo no planeta. Existe uma clara sensação de desordem.

Prefiro, é claro, essa desordem moderna à ordem da Guerra Fria. O mundo estava dividido em dois: os que estavam do lado dos americanos e os que estavam do lado dos soviéticos. Vivíamos aterrorizados pelo botão nuclear. Mas tudo era mais fácil de explicar.
Hoje em dia, até o presidente Barack Obama --ex-professor universitário e um orador eloquente-- tem dificuldades para explicar por que o mundo parece especialmente ameaçador e descontrolado. Ele atribuiu essa percepção à acelerada disseminação da informação.

"Quando vemos os noticiários noturnos, temos a sensação de que o mundo está desmoronando", disse Obama durante um discurso em agosto passado em um evento democrata para arrecadar fundos. "Mas a verdade é que o mundo sempre esteve desordenado e confuso. Em parte, o percebemos mais agora devido à mídia social e a nossa capacidade de ver em detalhe íntimo as dificuldades que as pessoas estão sofrendo."

A verdade é que uma boa parte da humanidade esperava que o presidente dos Estados Unidos, a única superpotência mundial, pusesse ordem onde não há. Mas está claro que Obama não pode e não quer. Não pode, por exemplo, evitar a invasão em câmera lenta da Rússia na Ucrânia nem conseguir a paz entre israelenses e palestinos. E não quer se meter em outra guerra, como a do Iraque ou do Afeganistão. Por isso, seu estranho reconhecimento público de que não tem uma estratégia para resolver o conflito na Síria, apesar de dois jornalistas americanos terem sido decapitados em público.

Do modo como eu vejo, cobrindo notícias todos os dias durante 30 anos, atualmente há três grandes tendências ocorrendo no mundo. 1: estão surgindo novas potências que desafiam o domínio dos EUA. 2: ideias, grupos e governos totalitários estão pondo à prova a democracia, a tolerância e o conceito de pluralidade. E 3: grupos radicais estão utilizando a violência e o terrorismo como método para lutar contra Estados e instituições por meio da chamada "guerra assimétrica".

Por isso o mundo está tão desordenado.

Vamos por partes. Primeira tendência. O papel de única superpotência dos EUA (desde a desintegração da União Soviética) é agora questionado pela Rússia expansiva e nuclear de Putin, pela enormidade da China e por grupos regionais como os BRICs (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). Os EUA já não podem andar pelo mundo como um caubói. Estamos na transição de um mundo unipolar para um multipolar.

Segunda tendência. As democracias estão sendo atacadas por todos os lados. A Primavera Árabe é hoje um inverno totalitário. Cuba e Venezuela são experiências ditatoriais. E grupos extremistas islâmicos, do Hamas ao EI e a Al Qaeda, tentam impor pela força sua impiedosa visão do mundo. Há um ressurgimento de ideias e grupos totalitários que não toleram o pluralismo, a verdadeira democracia, as liberdades individuais e o sagrado direito de discordar. É o brutal totalitarismo contra a moderna pluralidade.

Terceira tendência. Narcotraficantes e terroristas são a mesma coisa. Utilizam a violência, o sequestro, a violação, a ameaça e a extorsão para atacar governos e instituições muito maiores. É a guerra assimétrica. Os atos de 11 de Setembro são seu exemplo a seguir: 19 terroristas em quatro aviões mataram quase 3.000 americanos. Por isso a Inglaterra declarou alerta "grave" de terrorismo e os EUA se viram obrigados a atuar depois da decapitação pelo EI dos jornalistas americanos James Foley e Steven Sotloff. Sua ideia é que alguns poucos podem causar destruição máxima.

Por tudo isso --a perda de poder dos EUA, o ressurgimento do totalitarismo e as ações violentas de grupos radicais--, o mundo está uma confusão.

Mas, lembrando minhas aulas de história, nada disso tem que ser permanente: o feito pelo homem pode ser modificado pelo homem. Sim, realmente, o mundo está muito estranho.