Erdogan e a nova Turquia
A vitória do primeiro ministro Recep Tayyip Erdogan no primeiro turno das eleições presidenciais turcas foi manchete da maioria dos jornais ocidentais.
O sufrágio tem um duplo significado. De imediato, o resultado eleitoral perpetua o domínio do novo presidente e de seu partido o AKP (Partido da Justiça e do Desenvolvimento) sobre a Turquia.
Primeiro-ministro desde 2003, Erdogan introduziu em 2007 um mudança constitucional que transformou o regime parlamentarista turco num regime semipresidencialista (como o da França, Portugal ou da Rússia), no qual o presidente, doravante escolhido pelo sufrágio direto de todos os cidadãos, amplia seus poderes constitucionais.
Eleito por cinco anos nesta primeira eleição direta, Erdogan pode concorrer a um novo mandato. Se for reeleito, só deixará a presidência em 2024, completando 21 anos ininterruptos no exercício do poder.
O outro dado importante desta eleição e da continuidade de Erdogan no executivo do país se refere ao processo de islamização da Turquia, levada a cabo pelo atual presidente e seu partido.
Como se sabe, a república turca tem um perfil constitucional singular, em que a laicidade oficial -, imposta com mão de ferro por Mustafa Kemal, o Ataturk (Pai dos Turcos) entre 1923 e 1938 -, regula uma nação formada por 98% de muçulmanos.
Contudo, Erdogan, oriundo de uma família tradicionalista de piedosos muçulmanos e que chegou a ser auxiliar de imã na sua juventude, afasta-se da laicidade e islamiza, ou melhor, reislamiza, progressivamente as instituições turcas.
Desde que sua eleição à prefeitura de Istambul, em 1994, Erdogan persegue com determinação o objetivo de transformar a doutrina islâmica em norma nacional da Turquia. Apoiado pelo eleitorado rural e tradicionalista, Erdogan imprime um caráter cada vez mais autoritário ao regime.
Acusado de corrupção, o então primeiro-ministro demitiu ou deslocou para outras funções dezenas de juízes e investigadores encarregados dos inquéritos visando o executivo. A influência de seu partido na imprensa e nos canais da televisão pública pesa sobre toda a sociedade e desequilibrou o escrutínio do último domingo, não deixando a menor chance aos candidatos de oposição.
Governando contra as aspirações da população urbanizada e ocidentalizada, Erdogan inquieta a Europa.
Candidata à adesão à União Europeia desde 2005, a Turquia sempre equilibrou-se entre o Oriente e o Ocidente. A eleição de domingo parece indicar que a balança está agora mais para o lado do Oriente. O editorial do 'Le Monde" depois do anúncio do resultado das eleições é significativo. Seu título diz quase tudo: “Recep Tayyip Erdogan, novo sultão otomano”.
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