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Opinião: Eleição norte-americana de 2016 já tem sua cota de zumbis

O republicano Chris Christie, governador de Nova Jersey - AFP PHOTO/Stan Honda
O republicano Chris Christie, governador de Nova Jersey Imagem: AFP PHOTO/Stan Honda

Paul Krugman

25/04/2015 00h03

Na semana passada, um zumbi foi a New Hampshire e reivindicou a nomeação presidencial republicana. Bem, na verdade foi o governador Chris Christie, de Nova Jersey. Mas é mais ou menos a mesma coisa.

Você vê, Christie fez um discurso em que tentou se posicionar como um realista fiscal de mentalidade firme. Na verdade, porém, sua ideia de política supostamente firme foi um clássico zumbi - uma ideia que deveria ter morrido há muito tempo diante da evidência que mina sua premissa básica, mas de algum modo continua se arrastando por aí.

Mas não sejamos duros demais com Christie. Uma profunda ligação com ideias há muito refutadas parece ser necessária a todos os republicanos proeminentes. Seja quem for finalmente o vencedor da nomeação para 2016 terá diversos zumbis disputando ao seu lado.

Começando com Christie, que pensava estar sendo inteligente e corajoso ao propor o aumento para 69 anos da elegibilidade para a Seguridade Social e o Medicare. Isso não faz sentido, agora que os americanos vivem mais?

Não, não faz. Toda essa linha de argumentação deveria ter morrido em 2007, quando a Administração da Seguridade Social emitiu um relatório mostrando que quase todo o aumento da expectativa de vida ocorreu entre os ricos. A metade inferior dos trabalhadores, que são exatamente os americanos que mais dependem da Seguridade Social, viram sua expectativa de vida aos 65 aumentar pouco mais que um ano desde os anos 1970.

Além disso, enquanto advogados e políticos podem considerar trabalhar até 60 e muitos anos sem dificuldades, as coisas parecem um pouco diferentes para os trabalhadores comuns, muitos dos quais ainda têm de realizar trabalho manual.

E enquanto o aumento da idade de aposentadoria imporia grandes dificuldades, economizaria muito pouco dinheiro. Na verdade, um relatório de 2013 do Escritório de Orçamento do Congresso descobriu que aumentar a idade do Medicare quase não pouparia dinheiro.

Mas Christie - assim como Jeb Bush, que rapidamente ecoou sua proposta - evidentemente não sabe nada disso. As ideias zumbis comeram seu cérebro.

E há muitos outros zumbis por aí. Considere, por exemplo, a zumbificação do debate sobre a reforma da saúde.

Antes que a Lei de Acesso à Saúde entrasse plenamente em vigor, os conservadores fizeram uma série de duras previsões sobre o que aconteceria quando entrasse. Ela reduziria o número de americanos com seguro-saúde; levaria a um "choque de taxas" conforme os prêmios disparassem; custaria ao governo muito mais do que o projetado e explodiria o déficit; seria um enorme destruidor de empregos.

Na realidade, a lei produziu uma queda drástica no número de adultos sem seguro; os prêmios cresceram muito mais lentamente do que nos anos anteriores à reforma; o custo da lei está ficando bem abaixo das projeções; e 2014, o primeiro ano de implementação plena, também teve o melhor crescimento de empregos desde 1999.

Então, como isso modificou o discurso? À direita, nem um pouco. Até onde posso ver, todo republicano proeminente fala sobre o Obamacare como se todos os desastres previstos tivessem realmente acontecido.

Finalmente, um dos desenvolvimentos políticos interessantes deste ciclo eleitoral foi o triunfante retorno da economia vodu, a alegação pelo "lado da oferta" de que os cortes de impostos para os ricos estimulam a economia de tal forma que pagam por si mesmos.

No mundo real, essa doutrina tem um registro perfeito de fracasso. Apesar das confiantes previsões de catástrofes feitas pela direita, nem o aumento de impostos de Clinton em 1993 e nem o aumento de impostos de Obama em 2013 mataram a economia (longe disso), enquanto o "boom Bush" que se seguiu aos cortes de impostos de 2001 e 2003 não foi marcante, mesmo antes de terminar em crise financeira. O Kansas, cujo governador prometeu uma "experiência de vida real" que provaria que a doutrina pelo lado da oferta estava certa, falhou até em acompanhar o crescimento dos Estados vizinhos.

No mundo da política republicana, entretanto, o poder do vodu nunca foi mais forte. Supostos candidatos presidenciais devem fazer uma audição diante de defensores proeminentes do lado da oferta para provar sua fidelidade à doutrina fracassada. Propostas fiscais como a de Marco Rubio criariam um buraco gigante no orçamento, depois alegam que esse buraco seria preenchido por um milagroso surto econômico. A economia pelo lado da oferta, agora está claro, é o zumbi definitivo: nenhum volume de evidências ou lógica pode matá-lo.

Então por que o Partido Republicano experimentou um apocalipse zumbi? Um motivo, certamente, é o fato de que a maioria dos políticos republicanos representa Estados ou distritos que nunca, jamais votarão em um democrata, por isso a única coisa que eles temem é um desafio da extrema-direita. O outro é a necessidade de dizer ao Grande Dinheiro o que ele quer ouvir: um candidato dizendo qualquer coisa realista sobre o Obamacare ou cortes fiscais não sobreviverá à primária dos irmãos Sheldon Adelson/Koch.

Sejam quais forem os motivos, o resultado é claro. Os analistas tentarão fingir que estamos tendo um debate de políticas sério, mas, no que diz respeito aos temas, 2016 já está destinada a ser a eleição dos mortos-vivos.

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves 

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