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Depois de ler a bula, dor de artrite praticamente desapareceu

Zanone Fraissat/Folhapress
Imagem: Zanone Fraissat/Folhapress

19/11/2012 00h05

Para ajudar a aliviar minha dor da artrite, um médico me receitou uma medicação –que, visando evitar disputas legais cansativas, é melhor que eu não cite aqui. Assim, lhe darei um nome imaginário: Mortac. Antes de tomar o Mortac, eu fiz o que qualquer pessoa sensível faria e li a bula que veio com as pílulas –aquela que oferece conselhos sábios como evitar tomar o remédio se você planejar acompanhá-lo com uma garrafa de vodca, caso tenha que dirigir um caminhão por 1.600 quilômetros no mesmo dia, ou caso tenha lepra ou esteja grávida de trigêmeos.

A bula me alertou que alguns pacientes podem experimentar reações alérgicas ao Mortac, como inchaço do rosto, lábios e garganta. Ele menciona tontura, sonolência e (particularmente entre idosos) quedas acidentais, turvamento ou perda da visão, danos na coluna vertebral, parada cardíaca ou falência renal e dificuldade para urinar. Alguns pacientes, ela diz, têm pensamentos suicidas ou de automutilação, e se esse for o caso, ela recomenda –quando, eu presumo, o paciente estiver tentando se atirar pela janela– consultar um profissional de saúde. (Apesar de, a essa altura, eu achar melhor contatar o corpo de bombeiros.) Então, é claro, o Mortac prossegue com os riscos habituais de constipação, prisão de ventre, convulsões e, se tomado em combinação com outros medicamentos, falência respiratória e coma.

Sem dizer a proibição absoluta de dirigir automóveis, operar equipamento pesado ou praticar atividades potencialmente perigosas –digamos, operar uma prensa hidráulica enquanto se equilibra em uma viga no 50º andar de um arranha-céu. E se você tomar o Mortac em doses maiores do que a prescrita, você pode esperar se sentir confuso, sonolento, agitado ou ansioso; se tomar uma dose muito pequena, ou interromper repentinamente o uso do medicamento, você pode experimentar perturbações no sono, dores de cabeça, náusea, ansiedade, diarreia, convulsões, depressão, suor excessivo ou tontura.

Mais de 1 entre 10 pessoas que tomam Mortac apresenta aumento do apetite, nervosismo, confusão, perda da libido, irritabilidade, desordens de atenção, falta de coordenação motora, problemas de memória, tremores, dificuldades na fala, comichão, letargia e insônia (juntos?), fadiga, visão turva, visão dupla, vertigem e problemas de equilíbrio, secura na boca, vômito, flatulência, disfunção erétil, inchaço no corpo, sensação de embriaguez ou modo de caminhar anormal.

Mais de 1 entre 1.000 pessoas experimentarão queda no nível de açúcar no sangue, percepção alterada de si mesma, depressão, variações de humor, dificuldade para encontrar palavras, perda de memória, alucinações, sonhos desagradáveis, ataques de pânico, apatia, “estranheza”, incapacidade de chegar ao orgasmo, ejaculação retardada, torpor, movimentos anômalos dos olhos, redução dos reflexos, sensibilidade na pele, perda do paladar, queimação, tremores durante movimentos, consciência reduzida, desmaio, aumento da sensibilidade a ruídos, secura nos olhos, olhos lacrimejantes, batimento cardíaco irregular, pressão sanguínea baixa, distúrbios vasomotores, dificuldades respiratórias, nariz seco, inchaço abdominal, aumento da produção de saliva, refluxo, perda da sensibilidade ao redor da boca, transpiração, tremores, contrações musculares, câimbras, dores nas juntas, dores nas costas, dores musculares, incontinência, dor ao urinar, fraqueza, quedas, sede, aperto no peito ou mudanças na função hepática.

Não se preocupe, é claro: a chance é de apenas 1 em 1.000 de você experimentar esses efeitos colaterais. (Quanto ao que acontece com 1 pessoa em 10 mil –ou 100 mil– é melhor não pensar a respeito. Uma pessoa não pode ser tão azarada.)

Assim que fui amplamente instruído pela bula, eu evitei tomar até mesmo uma única dose do Mortac. Eu estava certo que instantaneamente seria afligido por uma bursite no joelho ou algo assim. (Não importa que a bula não tenha mencionado esse mal em particular.)

Eu pensei em jogar o remédio no lixo, mas temi que seu descarte do modo habitual pudesse levar a mutações de ratos de proporções épicas. Em vez disso, eu selei o frasco de pílulas em uma caixa metálica e a enterrei em um parque, a um metro de profundidade.

De lá para cá, devo dizer, minha dor da artrite praticamente desapareceu.