Ação contesta homenagem em obras públicas de nome de amigos e aliados de prefeito de Maceió
Nos últimos sete anos, a maioria das obras entregues pela Prefeitura de Maceió recebeu nomes de pessoas que estão vivas. Alguns dos homenageados nas principais inaugurações são pessoas ligadas ao prefeito Cícero Almeida (PP). A reiterada prática levou o defensor público Othoniel Pinheiro a ingressar com uma ação popular, que tramita na Justiça desde 2009, contestando o nome de mais de 100 prédios, escolas e obras inauguradas desde 2005.
Segundo Pinheiro, a legislação federal não permite homenagem a pessoas em vida. Já a prefeitura alega que não há qualquer impedimento legal para a prática.
A ação destaca que desde 2004 Maceió possui mais de 100 obras, como escolas, ruas, viadutos, com nomes de pessoas vivas. Para o autor da ação, o uso do nome de pessoas ainda em vida pode trazer benefícios de interesses pessoais de ambas as partes. “Tem o interesse político na prefeitura e o pessoal, em homenagear amigos”, disse.
Pinheiro destacou que "não há dúvidas que dentre os diversos nomes utilizados para dar nome à coisa pública, a grande maioria são de políticos com boa saúde, com as engrenagens em bom estado de conservação e com a vida político-partidária ativa. Essas honrarias, ainda que muito merecidas, quebram os postulados constitucionais da impessoalidade e moralidade."
O defensor observou ainda o perigo do uso de nomes de pessoas vivas em obras “por colocar sempre em evidência determinada pessoa”. “Por exemplo, políticos futuros candidatos podem conseguir divulgação e receber benefício com essa exposição do nome, seja ele político ou pessoal.”
A discussão em torno da legalidade de dar nomes de pessoas vivas em obras e prédios públicos é antiga no judiciário, com decisões a favor e contrárias. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça), por exemplo, decidiu –em março de 2011– revogar resolução da própria entidade, editada em 2008, que permitia a colocação de nome de pessoa viva em repartições e prédios públicos.
De amigos a aliados políticos
A última das homenagens ocorreu no dia 16 de março, com a inauguração da avenida Jornalista Márcio Canuto, que interliga os bairros do Feitosa e Farol. Canuto é maceioense e rasgou elogios a Almeida durante a inauguração da obra: “essa transformação na nossa capital faz de você o melhor prefeito que Maceió já teve”, discursou. A situação se repete em vários outros pontos da cidade. Obras realizadas para melhorar o transporte também receberam nomes de aliados políticos de Almeida.
O principal viaduto inaugurado nesta gestão, localizado em Mangabeiras, leva o nome do padrinho político do prefeito, deputado João Lira (PTB). Lira também é pai da vice-prefeita de Maceió, Lourdinha Lira (PTB). O Viaduto Industrial João José Pereira de Lira custou aos cofres públicos mais de R$ 11 milhões e foi inaugurado em junho de 2008. O viaduto corta a avenida comendador Gustavo Paiva, onde está localizada uma das empresas de Lira.
Outra obra ligada ao transporte foi a construção da passagem de nível Desembargador Washington Luiz Damasceno Freitas, no bairro do Farol. O desembargador também faz parte do meio político e é pai da prefeita da cidade de Piranhas, Mellina Freitas (PMDB). Há um mês, Freitas autorizou um reajuste nas passagens de ônibus, contrariando duas decisões judiciais, a tarifa passou de R$ 2,10 para R$ 2,30.
Outra obra no setor de transporte foi à interligação entre o bairro Gruta de Lourdes com o Murilópolis, por uma das ruas que era sem saída, a Augusto Dias Cardoso. A rua mudou de nome e há cinco anos passou a chamar-se avenida Aryosvaldo Pereira Cintra, na extensão fica a Avenida Juiz Diógenes Tenório de Albuquerque. O juiz é pai do ex-procurador geral do município de Maceió e advogado Diógenes Tenório de Albuquerque Junior.
No Conjunto Mutirão Selma Bandeira, a principal avenida leva o nome do ex-ministro das cidades Márcio Fortes (PP), atual presidente da APO (Autoridade Pública Olímpica). Também no conjunto o Centro de atividades múltiplas recebeu o nome do atual senador Benedito de Lira (PP), que é do mesmo partido de Almeida.
Quatro escolas com o mesmo nome
Outro caso que chama a atenção é do ex-deputado estadual e vereador Luiz Pedro (PMN). Segundo a ação pública, quatro escolas têm o nome do político, que é acusado de assassinato e fez campanha na última eleição quando estava preso.
A promotora de Justiça Cecília Carnaúba, filiada ao PSC, também foi homenageada e dá o nome a uma escola municipal situada no Antares I. Em 2009, a prefeitura inaugurou a Escola Municipal Maria Cecília Pontes Carnaúba, que tem o modelo integral e oferece ensinos de Educação Infantil e Fundamental. A construção da escola foi custeada pelo Fundeb (Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento da Educação Básica) no valor de R$ 673 mil.
O ex-prefeito Corintho Campelo da Paz também recebeu duas homenagens. Ele dá o nome a uma escola no Conjunto Cidade Universitária e também é nome de avenida, rua e travessa, todas localizadas no conjunto Santos Dumont.
Município se diz "autônomo"
A reportagem do UOL entrou em contato com a Secretaria Geral do Município para saber quais critérios são usados na escolha de nomes de obras municipais e o porquê de colocar nomes de pessoas que ainda estão vivas. Segundo o secretário Pedro Alves, a escolha dos nomes pela prefeitura “ocorre pela importância dos trabalhos que determinada pessoa contribuiu em sua área com algum serviço a capital alagoana.” “O município é autônomo em escolher o nome de quem quer homenagear em obras, a escolha do nome de Márcio Canuto se deu pela relevância dele em divulgar a cidade em que nasceu”, disse.
Alves afirma que não existe uma lei municipal que proíba que obras recebam nomes de pessoas vivas e que isso “dá autonomia ao município a escolher quem quiser.” “Não existe uma legislação municipal que proíba e o prefeito não está fazendo nada ilegal, apenas homenageando ainda em vida pessoas que marcaram a história da cidade”, destacou Alves.
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