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"Eu também sou sociedade civil", diz jovem da Maré que discursou para o papa

Carolina Farias

Do UOL, no Rio

27/07/2013 17h13

O jovem Walmyr Goncalves da Silva Júnior, 28, é morador da comunidade Marcílio Dias, no Complexo da Maré, uma das áreas mais carentes e violentas da zona norte do Rio do Janeiro. Ele foi escolhido como representante da sociedade civil pela Arquidiocese do Rio para discursar neste sábado (27) para o papa Francisco e um seleto grupo de 1.500 personalidades da cultura e da sociedade carioca no Theatro Municipal --entre eles representantes de famílias tradicionais e socialites. Voluntário da Jornada Mundial da Juventude e também da Pastoral da Juventude, o rapaz usou elementos da realidade em que vive para elaborar o discurso para o pontífice e a plateia.

"Falei sobre a violência, sobre jovens matando jovens. A criminalização do tráfico é uma marca das comunidades periféricas cariocas. São os três Ps --preto, pobre e periferia”, disse Walmyr. “Usei isso de mais marcante na provocação para o discurso. Eu também sou sociedade civil."

Os jovens mortos na tragédia de Santa Maria (RS) e os 20 anos do massacre da Candelária também foram lembrados por Walmyr. Estudante de história que trabalha também como missionário na paróquia de Nossa Senhora Aparecida, em sua comunidade, o rapaz falou ainda sobre as manifestações atuais dos jovens por melhores condições na sociedade.

"A JMJ também deixa um legado social que ultrapassa a igreja. Esses jovens estão na rua, lutando por seus direitos, por justiça, por melhor qualidade na educação e por uma vida plena de abundância", disse o estudante.

Ao terminar o discurso, ele agradeceu ao papa por "acreditar na juventude" e ouviu de Francisco: "obrigado pelo seu testemunho". "É uma confusão de sentimentos. Me senti pequeno, não por ele ser um homem grande ou por ser papa, mas por eu representar uma sociedade maior do que eu, com histórias mais interessantes que a minha", disse Walmyr.

A escolha de seu nome para o discurso foi anunciada ao jovem há duas semanas, mas ele teve de manter segredo. Somente a irmã ficou sabendo. Nem a avó, com quem mora desde que os pais morreram, pode saber da escolha do neto para representar a sociedade. Para escrever o texto, além de sua realidade como inspiração, ele rezou para pedir sabedoria.

"Pedi a Deus para falar o que era importante para dialogar para o papa sobre a juventude", afirmou. Na plateia, somente a irmã pode prestigiá-lo. A avó ficou doente na noite de sexta-feira (26). Ela tomou um susto ao ver o neto na televisão. "Ela me ligou chorando, emocionada", disse o rapaz.

Walmyr se preparava para receber peregrinos em sua casa, mas como a irmã também trabalhou como voluntária, ele achou melhor não hospedar ninguém para não deixar a avó sozinha com essa responsabilidade. "Mas estou feliz mesmo assim. Temos 30 equatorianos hospedados na paróquia", contou.

Por volta das 15h20, ele se preparava com a irmã para ir para Copacabana, na zona sul, para participar da vigília com o papa e se juntar aos outros jovens da sua comunidade e paróquia. Cansado após encarar o desafio, ele tentava convencer a irmã a "encurtar" a peregrinação. "Estou todo arrumado, de camisa e sapato social, além de cansado. Estou tentando convencê-la a irmos de metrô", disse.