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Denúncias de tráfico de crianças e adolescentes crescem 86% em 2013

Leandro Prazeres

Do UOL em São Paulo

20/02/2014 06h00

O número de denúncias de tráfico de crianças e adolescentes no Brasil aumentou 86% entre 2012 e 2013. O crescimento foi registrado pela SDH (Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República) com base nos dados do Disque 100, obtidos pelo UOL. O Disque 100 é um serviço telefônico disponibilizado pelo governo federal que recebe denúncias de violações de direitos humanos de todo o Brasil.

Em 2013, foram feitas 186 denúncias, uma média de quase uma a cada dois dias. Especialistas afirmam que a maior parte do tráfico de crianças atende ao mercado de exploração sexual e adoção ilegal.

De acordo com os dados do relatório anual do Disque 100, foram registradas 186 denúncias de tráficos de seres humanos envolvendo crianças e adolescentes em 2013. Em 2012, foram 100. 

O ouvidor nacional de direitos humanos da SDH, Bruno Renato Teixeira, diz que não há uma relação direta entre o aumento no número de denúncias e o aumento do crime em si, mas que o número de casos de tráfico de crianças e adolescentes no Brasil pode ser maior que a quantidade de denúncias que chegam ao Disque 100.

“Todos os casos que nós recebemos são encaminhados para as autoridades. Mas nem todas as denúncias que chegam para eles são encaminhados pra gente. Isso me faz crer que o universo de casos pode ser maior ”, diz Bruno.

Bruno afirma que a veiculação, em 2013, da novela Salve Jorge, da Rede Globo, teve um impacto positivo no aumento das denúncias que chegaram ao Disque 100. Um dos núcleos da novela mostrava o drama de vítimas de tráficos de seres humanos para exploração sexual.

“Houve um grande incremento no número de denúncias após a novela. As pessoas passaram a entender um pouco melhor o que é o tráfico de seres humanos e o grau de conscientização da população sobre essa prática também aumentou”, diz Teixeira.

O ouvidor explica que a SDH não monitora o resultado das denúncias que chegam ao Disque 100. Depois de receber as chamadas, o serviço encaminha as informações para os órgãos estaduais ou federais responsáveis pela apuração do crime. No caso do tráfico de crianças e adolescentes, o órgão acionado é quase sempre a Polícia Federal.

O UOL procurou a PF para saber a quantidade de inquéritos e indiciamentos envolvendo tráfico de crianças e adolescentes. A assessoria de imprensa da Polícia Federal informou que  órgão tem os dados sobre tráfico de pessoas separados por faixa etária disponíveis referentes ao ano de 2013.

O coordenador da unidade de prevenção do UNODC (Escritório das Nações Unidas Sobre Droga e Crime), Nívio Nascimento, explica que o tráfico de crianças e adolescentes, assim com outras formas de tráfico de seres humanos, é um crime de difícil detecção.

“O máximo que a gente pode fazer é nos basear pelo número de casos constatados pelas autoridades. Acadêmicos debatem bastante sobre como estimar esses dados”, afirma.

Mesmo sem dados concretos, Nívio diz acreditar que o número de casos de tráfico de crianças e adolescentes no Brasil deve ser maior que o número de denúncias registradas pelo Disque 100. "Deve haver muito mais. Num país com as dimensões do nosso, vários casos são subnotificados e ainda temos a questão do tráfico interno que dificulta ", explica Nascimento.

De acordo com o Diagnóstico sobre o Tráfico de Pessoas nas Áreas de Fronteira, divulgada em outubro do ano passado pelo Ministério da Justiça, a Polícia Federal instaurou 47 processos para apurar a venda e o tráfico de crianças e adolescentes entre 2005 e 2011 (dados mais recentes disponíveis).

FRONTEIRA

Ainda de acordo com os dados divulgados pela SDH, 35% (66) das denúncias foram feitas em alguns dos 11 Estados brasileiros que fazem fronteiras com outros países.

A pesquisadora Daniela Alves, do Ceiri (Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais), diz que essa concentração de casos na região de fronteira se deve, em parte, à fragilidade do controle migratório brasileiro.

“Não podemos esquecer que nossas fronteiras terrestres são frágeis, porosas e também podem facilitar o tráfico internacional de crianças e adolescentes”, diz a especialista.

Longe da região de fronteira, os líderes no ranking das denúncias de tráfico de crianças e adolescentes são: São Paulo (25 casos), Minas Gerais (22) e Rio de Janeiro (21).

Daniela Alves explica que a liderança de São Paulo nesse ranking se deve ao tamanho de sua população e o movimento do aeroporto internacional de Guarulhos.

“Além da questão populacional, São Paulo tem o mais importante aeroporto internacional do Brasil, levando a expectativa de que haja maiores tentativas de tráfico, bem como maiores casos de fracassos”, explica Daniela.