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Rio: 46% dos moradores de favelas querem que UPPs continuem, diz estudo da Universidade de Stanford

Daniel Amaral/Agência O Dia/Estadão Conteúdo
Imagem: Daniel Amaral/Agência O Dia/Estadão Conteúdo

Marina Lang

Colaboração para o UOL, no Rio

28/03/2018 19h54

Uma pesquisa da Universidade de Stanford, da Califórnia (EUA), divulgada em evento das ONGs Observatório das Favelas e Redes da Maré nesta quarta-feira (28), indica que 46% dos moradores de comunidades do Rio de Janeiro desejam a continuidade das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), implantadas em 2009 em diversas favelas do Rio. Outros 15% rejeitam a ideia e 39% afirmam que concordam "em parte" com a manutenção das UPPs.

Os dados, que foram coletados a partir de longas entrevistas porta a porta com moradores, impressionaram os pesquisadores. Foram feitas 6.588 entrevistas nas favelas Batan (zona oeste), Morro da Providência (centro), Complexo da Maré (zona norte), Rocinha (zona sul) e Cidade de Deus (zona oeste) entre dezembro de 2015 e março de 2016.

Apesar de desejarem a continuidade das UPPs, os moradores defendem mudanças na conduta dos policiais. Eles querem segurança com a perspectiva de respeito aos direitos dos cidadãos --o que se aproxima da proposta inicial da política de UPPs.

A pesquisadora que coordenou o estudo, a professora Beatriz Magaloni, diretora do Laboratório de Pobreza, Violência e Governança da Universidade de Stanford, ressalta que os moradores não querem uma polícia que cometa abusos e violência, como invasão de domicílios, assassinatos ou agressões.

"O que os moradores querem é uma melhor polícia. Uma polícia mais eficiente, menos violenta, menos abusiva e menos corrupta", afirmou Beatriz durante a apresentação do estudo na tarde de hoje.

"A pesquisa tem o objetivo de orientar política pública [para se] fazer política pública. A UPP foi um fracasso no nosso entendimento. É um absurdo que um comandante de UPP vire chefe de favela", disse o ativista Jailson de Souza e Silva, do Observatório das Favelas.

A equipe de intervenção, que comanda a segurança do Rio de Janeiro desde 16 de fevereiro, tem planos de reestruturar o programa de UPPs, extinguindo unidades com baixo desempenho. Na semana passada, o chefe do GIF (Gabinete de Intervenção Federal), general Mauro Sinott, informou que quer esvaziar a UPP da Vila Kennedy --favela que vem sendo usada como palco de experiência piloto de pacificação durante a intervenção-- e transferir seus policiais para o 14º Batalhão da Polícia Militar, responsável pela área.

Desconfiança, medo e indiferença

Intitulado “Percepção de moradores sobre segurança pública e a implantação das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) em favelas do Rio de Janeiro”, o trabalho tem como objetivo explorar os temas de segurança pública e violência na visão dos moradores de cinco comunidades do Rio.

Segundo os pesquisadores, a ideia é dar voz aos moradores das favelas e aprofundar as discussões sobre a segurança pública na cidade. O próximo passo é encadear os dados obtidos com a criação de políticas públicas e leis mais eficientes sobre o tema.

Os principais sentimentos de moradores das favelas relacionados a policiais também foram descritos na pesquisa --desconfiança foi o mais citado, seguido por medo e indiferença. Respeito, raiva e admiração foram mencionados na sequência.

Os dados revelam ainda que 13% dos moradores tiveram suas casas invadidas pela polícia. 

Segundo o levantamento, 76 famílias relataram ter tido um parente assassinado pela polícia nos últimos seis meses.

Enquanto 20% dos moradores sofreram algum tipo de agressão de policiais, 15% declararam ter algum amigo que morreu assassinado por agentes. Outros 20% relataram conhecer pessoas assassinadas pelo tráfico.

O levantamento ainda identificou que os dados entre comunidades não são homogêneos. "No Batan, a aceitação da polícia e da UPP é muito maior do que na Rocinha", diz Beatriz.

"O maior problema nas favelas hoje são os conflitos armados. Seja com bandidos, seja com milicianos, seja com a polícia", acrescenta o ativista Silva. De acordo com dados do laboratório de dados da violência Fogo Cruzado, 3.014 tiroteios foram registrados em 34 UPPs entre julho de 2016 e fevereiro de 2018.