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Voluntários, muitos dos quais também foram refugiados, ajudam como guias em Viena

Voluntários criaram uma cozinha improvisada para os imigrantes que chegam ao centro de imigração criado na principal estação de trem em Viena, na Áustria - Gordon Welters/The New York Times
Voluntários criaram uma cozinha improvisada para os imigrantes que chegam ao centro de imigração criado na principal estação de trem em Viena, na Áustria Imagem: Gordon Welters/The New York Times

Barbara Surk

Em Viena (Áustria)

26/09/2015 06h01

No centro de migração na ala leste da principal estação de trem, Ragad al-Rachid, uma pequena estudante de psicologia muçulmana síria de 19 anos de idade, está envolvida com os detalhes logísticos para ajudar dezenas de pessoas por dia a se ajustarem à nova vida no país que ela adotou.

Ela grita instruções em árabe para a cozinha improvisada, envia pessoas para um balcão de recepção e a um advogado para aconselhá-los sobre as formas legais para permanecerem na Áustria; ela obtém cartões de celulares locais para os recém-chegados, os ajuda a se conectar ao Wi-Fi gratuito da estação e mostra-lhes como comprar bilhetes para os trens para a Alemanha ou além.

Muitas vezes, ela simplesmente se senta com os refugiados e ouve suas experiências.

Mesmo passando seus dias ajudando milhares de pessoas que transitam pela capital austríaca, ela disse que também se beneficia. Como uma das dezenas de muçulmanos de língua árabe entre cerca dos 2.000 voluntários que estão ajudando os refugiados, ela se vê, pela primeira vez desde que chegou a Viena, entre austríacos que, como ela disse: “Se parecem comigo e pensam como eu”.

A Europa está recebendo as multidões vindas do Oriente Médio e da África enquanto ainda não resolveu a questão da integração das ondas anteriores de muçulmanos. Na Alemanha, foram os turcos. Na França, os argelinos. Mas, em todo o continente, os muçulmanos estão em vários estágios de aceitação, e os jovens, em particular, vêm procurando maneiras de se encaixar.

A história de família de Rachid ilustra o recente êxodo do Oriente Médio para a Europa.

Com a guerra na Síria avançando para seu quinto ano, a família até hoje não retornou à sua casa no subúrbio de Damasco de Mouadamiya, um reduto da oposição sob o cerco do governo.

Mas enquanto Rachid sonha com seu retorno para a Síria, o país vem até ela por meio dos sírios que descem todos os dias dos trens na Hauptbahnhof de Viena, exaustos da viagem pelos Balcãs, traumatizados pelas vivências passadas em sua terra natal destruída pela guerra e com medo do futuro no exílio.

“Eu penso muito nessas histórias”, disse Rachid. “Passei noites sem dormir, e a coisa mais difícil para mim agora é a percepção de que o meu país acabou”.

O que ela acha mais difícil de responder são as perguntas dos refugiados sobre a Áustria. Se ela gosta do país? Quanto tempo leva para se obter asilo, e quanto tempo será necessário para que possam trazer a família? Será que deveriam ir para a Alemanha?

Ela luta para responder, porque sabe que é um processo longo na Áustria, e a maior parte dos refugiados que desembarcam aqui agora não têm meios para se sustentar enquanto esperam.

Viena - Gordon Welters/The New York Times - Gordon Welters/The New York Times
A síria Ragad al-Rachid (centro) ajuda refugiados que chegam ao centro de imigração em Viena
Imagem: Gordon Welters/The New York Times

A política de concessão de asilo está sendo alterada constantemente, porque os pedidos de proteção internacional subiram acentuadamente na Áustria.

Nos últimos três dias, o Ministério do Interior registrou um número recorde de pedidos -com 500 a 700 pedidos por dia, em comparação com 100 a 150 nesta mesma época no ano passado. Até o final de setembro, as autoridades acreditam que terão registrado mais de 9.000 pedidos de asilo, em comparação com 3.000 em março.

O conselho dela aos refugiados muitas vezes é que partam para a Alemanha -e não apenas porque lista de requerentes de asilo na Áustria cresceu tanto.

“Eu me sinto estranha aqui algumas vezes, talvez por causa do meu lenço na cabeça”, disse Rachid. “As pessoas estão sempre me encarando.”

Durante esta crise, a Áustria foi fortemente criticada pelas terríveis condições de seus centros de refugiados nas zonas fronteiriças. Neste mês, ocorreram protestos para que o tratamento fosse melhor, e um grupo de pessoas deixou os centros oficiais de acolhimento e estabeleceu o seu próprio esforço de socorro dos refugiados.

Em três semanas, um esforço conhecido como Trem da Esperança foi estabelecido na principal estação ferroviária de Viena. Agora, está unido ao centro de refugiados gerido por uma instituição de caridade cristã austríaca, Caritas, na mais antiga estação da capital, a Westbahnhof.

Outra voluntária, Monika Alamgir, uma austríaca de 24 anos de idade de origem indiana e bengali, disse que entendia os sentimentos de Rachid. Alamgir nasceu em Viena em uma família muçulmana e fez graduação em educação islâmica. Ela tem quatro irmãs, e três delas, juntamente com sua mãe, cobrem os cabelos.

“Eu gosto daqui, mas é diferente. As pessoas acham você diferente, se você usar um hijab”, disse ela. “Você é visivelmente muçulmana, e nem todo mundo gosta de nós”.

Mas Alamgir disse que ela tinha uma vida boa na Áustria, onde seu pai, jornalista, pediu asilo quase três décadas atrás, quando foi forçado a fugir de Bangladesh.

A principal tarefa de Alamgir na estação de trem é coordenar centenas de voluntários, muitos dos quais são refugiados ou descendentes de gerações anteriores de requerentes de asilo. É essencial que falem alemão, disse Alamgir, mas as línguas mais em demanda são árabe, farsi, urdu e curdo.

O mais importante é que os voluntários saibam e entendam o que os refugiados estão a passando, disse Alamgir.

“Não importa que língua você fale, digo aos voluntários”, disse ela. “Você tem de ser bondoso e amoroso com essas pessoas que passaram por tanta coisa.”