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Sem realizar reformas, Brasil põe em risco ganhos sociais

Sérgio Lazzarini

Especial para o UOL

07/04/2014 06h00

Retornando de um debate sobre o Brasil no exterior, pude confirmar o encanto da comunidade internacional com os ganhos de renda e redução de desigualdade no país nos últimos anos.  Maior escolaridade, aumentos reais de salário, maior formalização do emprego e políticas de redistribuição fizeram surgir uma nova classe média que não somente trouxe novos padrões de consumo, como também mudou as bases da política.

A popularidade do atual governo tem se sustentado fundamentalmente por esse grupo de eleitores. 

Mas do encanto vem a perplexidade. A pergunta que mais ouvi foi: dado esse vibrante grupo de consumidores (e eleitores), por que a economia brasileira ainda cresce abaixo dos seus pares na América Latina? 

Por que temos um Brasil que aplaude as políticas sociais do governo e outro Brasil que clama por reformas que paramos de fazer?

Na sua essência, o ponto é que distribuição de renda e reformas estruturais devem andar lado a lado. Muitos governos na América Latina perderam popularidade porque implementaram reformas sem cuidar, simultaneamente, de políticas sociais que pudessem dar legitimidade às suas reformas.

Governos subsequentes aprenderam que políticas sociais trazem votos, e prontamente se colocaram como contraponto aos governos reformistas. Mas correm o risco de errar na direção inversa: fazer redistribuição sem cuidar das reformas necessárias para sustentar ganhos de renda.

O Brasil não é a exceção. A nova classe média tornou-se um extraordinário motor de consumo, mas já sabemos que os ganhos reais de salário não foram acompanhados por um crescimento correspondente de produtividade do trabalho. Somado ao já elevado custo Brasil gerado por altos impostos, burocracia e infraestrutura precárias, o resultado não poderia ser outro: perda de competitividade e dinamismo de diversos setores industriais.

Como resposta, o governo optou pelo caminho fácil: cortes temporários de impostos, tarifas de importação, crédito subsidiado, reduções forçadas de juros e preços (que posteriormente tiveram que ser revertidas).

Algumas reformas pontuais, como as recentes concessões privadas, foram abundantemente irrigadas por crédito estatal. Pouco ou quase nada foi feito para melhorar a qualidade do ensino público e simplificar o emaranhado de aprovações necessárias para executar projetos de infraestrutura.

O já anacrônico sistema tributário piora a cada ano. Complicando o cenário, as intervenções criaram uma incerteza sem precedentes aos investimentos e deterioraram o mínimo arcabouço institucional anteriormente construído: as agências reguladoras foram enfraquecidas e as estatais perderam o pouco de blindagem política que tinham.

Sob a ótica dos governantes, pouco importa o Brasil que reclama, e a sua agenda de reformas, já que as políticas sociais têm garantido votos do Brasil que aplaude.

Infelizmente, o ciclo eleitoral tende a premiar o curto prazo. Mas os ganhos sociais não serão duradouros sem um amplo esforço de liderança política para reduzir entraves estruturais ao crescimento.

A solidez da nossa e de várias outras democracias vai depender cada vez mais de líderes que capitalizem sobre as políticas de redistribuição sem negligenciar as reformas necessárias para aumentar a competitividade do setor produtivo e sustentar novos e continuados avanços sociais.

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