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Se cavaletes de políticos não forem banidos, restará ao eleitor o pontapé

Especial para o UOL

02/10/2014 06h00

No início de 2013, prefeitos e secretários de várias capitais brasileiras receberam cópias do relatório Calçadas do Brasil. O documento resumia os resultados da campanha realizada pela ONG Mobilize Brasil ao longo de 2012 para aferir o estado de conservação dos passeios públicos nessas cidades.

No Rio, o dossiê foi entregue ao secretário municipal de Conservação, Marcus Belchior. Em São Paulo, foi o próprio prefeito Fernando Haddad quem o recebeu, em mãos, como se dizia antigamente. Entre os pontos avaliados estavam a qualidade do piso, largura da calçada, rampas de acessibilidade, a existência de degraus entre um e outro imóvel, entre vários outros itens. A nota média, numa escala de zero a dez, não passou de 3,8.

Por que a campanha? Dados do IBGE e de pesquisas origem-destino indicam que 1/3 das viagens urbanas são feitas a pé em todas as cidades brasileiras, incluindo trechos de até cinco quilômetros nas grandes capitais.

Caminhar é a forma mais simples e natural de transporte, e pequenas viagens até a padaria, salão de beleza, escola dos filhos ou academia poderiam e deveriam ser feitas a pé por qualquer pessoa. O transporte público somente deveria entrar no jogo quando o percurso passar de um quilômetro. Carros, apenas em caso de viagem, emergência ou para transportar cargas pesadas. É assim no mundo civilizado.

Cidades mundiais, como Berlim, Nova Iorque, Copenhague ou Amsterdã, já perceberam o beco sem saída provocado pelo excesso de carros e têm investido em novas políticas para estimular a volta do pedestre (e dos ciclistas) às ruas. Basta olhá-las e reaprender. Lá as calçadas são largas, lisas, sem buracos e permitem a circulação segura e confortável de crianças, idosos e pessoas com mobilidade reduzida.

Voltando ao Brasil, um dos problemas mais comuns aqui em nossas ruas é a enorme quantidade (e variedade) de obstáculos que atrapalham ou impedem a passagem do pedestre e de cadeirantes pelas calçadas.

A lista é enorme, e inclui um emaranhado de postes de todos os tipos e tamanhos, bancas de jornal, lixeiras mal posicionadas, vendedores ambulantes, mesas de bares e restaurantes e também veículos estacionados sobre a calçada.

Uma das "pragas" mais recentes a roubar o espaço do pedestre são os cavaletes de propaganda eleitoral. Milhares deles espalhados pelas ruas, gramados e calçadas públicas em todas as cidades do país.

Trinta anos atrás ainda fazia algum sentido que os candidatos estampassem seus sorrisos, bigodes e cabeleiras entintadas pelas ruas em outdoors, cartazes e santinhos. Já havia a propaganda no rádio e TV, mas a internet apenas engatinhava.

Agora, além das horas diárias da propaganda obrigatória, os candidatos podem "conversar" com seus eleitores diretamente pelas redes sociais, enviar mensagens personalizadas e abrir seus programas, quando os há, ao debate público.

Os tais cavaletes são uma aberração urbana, especialmente em São Paulo, onde a "Lei Cidade Limpa" restringe a propaganda nas ruas. Eles sujam a paisagem, barram a passagem e se transformam em lixo do dia para a noite. Seja a pé ou de bicicleta, sentimos uma vontade irresistível de chutá-los longe, num ato repleto de simbolismos.

Em 2016 teremos eleições para prefeitos e vereadores. Esperamos que até lá os passeios públicos estejam em melhores condições de conservação, limpos e livres dessa propaganda mequetrefe. Ou então, só nos restará o recurso do pontapé.

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