Em um momento de trevas, papa lança luz sobre a política
Desde que assumiu o pontificado, o papa Francisco não parou de fascinar e surpreender em todos os campos, sobretudo, em sua relação com a política.
Já no início do pontificado, quando se encontrou com 9.000 crianças e jovens de escolas e movimento jesuítas no Vaticano, deixou claro que “envolver-se com a política é uma obrigação para um cristão”. Considerou a política uma das formas mais elevadas da caridade, porque procura o bem comum. Frisou ainda que o fato de a política ser “suja” é um imperativo para o cristão imiscuir-se na política e não fazer o papel de Pilatos lavando as mãos para não se comprometer com a morte de Cristo.
A afirmação do papa Francisco sobre a importância da política como compromisso cristão está no horizonte da sua visão maior, que impregnada do olhar de Cristo, vê o mundo sem lideranças capazes de arrebanhar e construir uma agenda política positiva e portadora de esperança para todos – como Cristo via o povo de seu tempo como ovelhas sem pastores.
O papa usa sua projeção para lançar luzes num momento crítico de muitas trevas, diria o teólogo. E, como diz o sociólogo (Bauman), um momento líquido, por falta de referenciais sólidos, já tudo muda obsessivamente a serviço de um consumismo doentio, que está matando a natureza e sufocando a vida.
Por isso, o momento em que vivemos é muito vazio e propício à intransigência e à falta de diálogo. Parece-me que a iniciativa da Cátedra Diálogo e Cultura do Encontro, de altos estudos, (da Fundação Panamericana para o desenvolvimento integral, em associação com a Universidade de Vila Maria e a Universidade de Rosário, da Argentina, com apoio da PUC-SP), leu bem a postura do papa.
Com certeza a visão de diálogo e cultura do encontro capitaneada pelo papa Francisco não é “água com açúcar”, mas uma busca profunda de solução para os grandes problemas da humanidade. Ninguém se esquece de suas palavras em relação ao naufrágio que matou centenas de refugiados africanos na costa de Lampedusa. “Vergonha” foi a palavra que encontrou para definir a tragédia humana e a irresponsabilidade dos líderes políticos.
Em sua agenda política reina a caridade e a preocupação com o bem comum. Por isso, o papa recebeu pessoas marginalizadas ao interno da Igreja – que um pontífice não tinha recebido ainda –, lavou os pés de prisioneiros, beijou os pés de uma muçulmana, está lutando para que termine totalmente o embargo dos Estados Unidos a Cuba e está olhando para a Ásia (sobretudo para a China) sempre pelo viés do diálogo e da promoção da cultura do encontro.
Portanto, a visão política de Francisco é consequência de sua visão de fé. Com ele, o projeto de uma nova evangelização para a Europa e para os outros continentes de matriz cristã ganha uma força nova e coloca os cristãos em linha de frente na batalha do amor, sem medo de sujar as mãos no envolvimento político de qualidade.
Com a mentalidade do diálogo e da cultura do encontro, o papa Francisco pode reverter o indiferentismo e a descristianização galopante da Europa, que segundo pesquisa recente Ibope/Worldwide está chegando ao fundo do poço: apenas 43% de europeus se declaram religiosos.
Só para termos uma ideia do que chamo de fundo do poço, no Brasil, na mesma pesquisa, 79% se declaram religiosos. Foi certamente a postura política do papa Francisco que fez o presidente de Cuba, Raúl Castro, depois do encontro com o pontífice, sair do Vaticano dizendo que voltaria a rezar e retornaria à Igreja.
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