ESCÂNDALOS NO CONGRESSO

11. Demóstenes é cassado por conexão com empresário Cachoeira

Data de divulgação 
4.mar.2012

Atualizado em 10.out.2012

O escândalo

O senador Demóstenes Torres (DEM-GO) teve seu mandato cassado em 11.jul.2012 após meses de repercussão do escândalo que o relacionou a Carlinhos Cachoeira, empresário preso pela Polícia Federal sob suspeita de chefiar uma máfia de jogos. A cassação foi aprovada por 56 senadores. Outros 19 foram contra cassar Demóstenes e houve 5 abstenções. O placar foi registrado por diversos veículos, inclusive pelo Blog do Fernando Rodrigues, que também analisou a perda do mandato do senador.

O caso começou quando foi noticiado que Demóstenes conversou por telefone 298 vezes, de fev.2011 a ago.2011, com o empresário Carlos Augusto Ramos, o  Carlinhos Cachoeira. O número de telefonemas entre o senador e o empresário foi revelado pelo jornal "Correio Braziliense" em 4.mar.2012, quando Cachoeira já estava encarcerado (aqui, resumo da notícia no site do "Correio"). Ele havia sido preso pela Polícia Federal (PF) em 29.fev.2012 na Operação Monte Carlo, montada para desarticular quadrilha de exploração de jogos com máquinas caça-níqueis, segundo explicou texto do portal "G1".

Após a revelação desses fatos, foi noticiado que outros políticos também tinham relação com Carlinhos Cachoeira. Foi instalada uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para apurar o caso. No Senado, o Conselho de Ética abriu procedimento para avaliar a cassação do mandato de Demóstenes Torres. Em 12.jul.2012, quando este texto foi atualizado, a CPMI ainda não havia encerrado seus trabalhos.

O UOL criou uma página que reúne todos seus textos, fotos e vídeos sobre a "CPI do Cachoeira", nome pelo qual ficou conhecido a CPMI incumbida da investigação. A página reúne notícias sobre outros políticos relacionados ao caso como os governadores Agnelo Queiróz (PT-DF), Marconi Perillo (PSDB-GO) e Sérgio Cabral (PMDB-RJ).

O caso
Ainda sobre a primeira reportagem do caso Cachoeira, o "Correio Braziliense" publicou que a Justiça Federal autorizou os grampos telefônicos que permitiram conhecer as conversas de Carlinhos Cachoeira com Demóstenes Torres. Os diálogos foram transcritos pela PF durante investigações da Operação Monte Carlo, informou o jornal.

Em média, o Cachoeira e o senador trocaram 1,4 ligação de fev.2011 a ago.2011. "Falavam-se diariamente, até mais de uma vez por dia". Segundo o jornal, Demóstenes deu uma explicação sentimental para a proximidade com o suposto mafioso. "A mulher do meu suplente (Wilder Pedro de Morais) o deixou e passou a viver com Cachoeira. Eu e minha mulher tivemos de resolver esse problema. Por isso houve tantas ligações e encontros", disse Demóstenes Torres, segundo publicou o "Correio".

Demóstenes, segundo o "Correio", também recebeu como presente de Cachoeira uma "cozinha importada dos Estados Unidos, com fogão e geladeira, avaliada em US$ 27 mil".

"Boa parte das conversas entre o bicheiro e Demóstenes é para marcar jantares. Os dois evitam estender a conversa pelo telefone. Em um desses diálogos, o "doutor" Demóstenes diz ao "professor" Cachoeira que precisa falar com ele com "urgência urgentíssima". Como o senador tem foro privilegiado e só pode ser investigado pela última instância — Supremo Tribunal Federal (STF) e Procuradoria-Geral da República (PGR) —, o teor desses encontros não foi investigado. Os diálogos serão remetidos à PGR", escreveu o "Correio".

PSDB
Outro congressista envolvido com o bicheiro, de acordo com o jornal, é o deputado federal Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO). A reportagem afirmou que ele obteve de Cachoeira vagas de emprego para eleitores. "Dos deputados que aparecem nos grampos, Leréia é um dos mais frequentes. A investigação detectou 70 contatos telefônicos entre o deputado e o bicheiro. Em outros 20 diálogos, o empresário da jogatina cita Leréia nas conversas", afirmou o texto.

"Policiais federais transcrevem da seguinte forma um desses diálogos: "Carlinhos solicita a Cida que explique para Maria José como faz para ela tomar posse na cota de Leréia"".

PT
Segundo o "Correio" publicou em 4.mar.2012, "o PT adotou uma postura de cautela diante da divulgação das relações de amizade entre Demóstenes e Cachoeira". O jornal transcreveu frase do líder do PT no Senado, Walter Pinheiro (BA). Ele disse que seu partido não faria "com eles [com a oposição, representada por Demóstenes] o que eles fazem com a gente [governistas]". O petista ainda disse: "Claro que uma ligação com o Cachoeira nunca é uma boa asa, mas temos de aguardar".

Em 9.mar.2012, a versão online da coluna "Radar" da revista "Veja" publicou vídeos que associam Carlinhos Cachoeira a irregularidades em campanhas do PT em Goiás. As imagens relacionam outro congressista ao escândalo: o deputado federal Rubens Otoni (PT-GO).

Segundo a coluna, os vídeos revelam que Cachoeira "abasteceu o caixa dois de uma campanha petista em Goiás". No primeiro vídeo, Cachoeira oferece R$ 100 mil "para ajudar o petista [Rubens Otoni] e insinua já ter contribuído com a mesma quantia para o candidato em outra oportunidade", publicou a coluna. No segundo vídeo, "Cachoeira ensina ao petista – que concorda com todas as frases ditas – como proceder com o dinheiro".

PP
Também foi mencionado no caso Cachoeira o deputado federal Sandes Júnior (PP-GO). Em uma das escutas da PF, ele pede a Carlinhos Cachoeira que pague por uma pesquisa de opinião do instituto Serpes sobre a disputa pela Prefeitura de Goiânia em 2012. O caso foi relatado pelo jornal "O Estado de S. Paulo" em 27.abr.2012. A reportagem afirma que o inquérito da Operação Monte Carlo mostra que o grupo de Cachoeira trabalhava para lançar Demóstenes Torres candidato a prefeito e que Sandes Júnior queria ser vice.

PPS
Stepan Nercessian (PPS-RJ) é outro deputado federal envolvido na história. Segundo publicou a "Folha de S.Paulo" em 31.mar.2012, ele recebeu de Cachoeira R$ 175 mil em 2011.

Outro lado
A primeira explicação do senador Demóstenes Torres, publicada pelo "Correio Braziliense" em 4.mar.2012, foi sentimental. "A mulher do meu suplente [Wilder Pedro de Morais] o deixou e passou a viver com Cachoeira. Eu e minha mulher tivemos de resolver esse problema. Por isso houve tantas ligações e encontros", disse Demóstenes Torres, segundo a publicação.

Quanto à cozinha que ganhou de Cachoeira, Demóstenes disse: "Minha mulher é advogada e boa cozinheira. Nos casamos em 13 de julho do ano passado, e a mulher de Cachoeira nos prometeu um bom presente".

Demóstenes Torres também negou na reportagem de 4.mar.2012 ter recebido doações de campanha do bicheiro e disse não ver problemas em ter conversado 298 vezes por telefone com Cachoeira em 7 meses. "Devo ter conversado 5 mil vezes com [o governador de Goiás] Marconi [Perillo], 10 mil vezes com minha mulher. Não estou ligado a nenhuma atividade criminosa". O senador disse não haver "vedação legal ou ética" por ter recebido presentes de "uma pessoa considerada limpa". "Descobri que ele era contraventor nesta última semana", afirmou, com referência à prisão de Cachoeira pela PF em 29.fev.2012.

Em 6.mar.2012, Demóstenes discursou no Senado, segundo registrou a "Folha" no mesmo dia do pronunciamento. Na ocasião, Demóstenes disse não ter feito favores a Cachoeira, o que seria contestado mais tarde após a divulgação de mais conversas telefônicas dos dois. "O contato social não significa participação em seus afazeres ocultos. Nesta Casa, sempre me opus ao jogo. Atuei às claras no combate às causas costumeiramente tratadas nos subterrâneos. Apesar dos relacionamentos de amizade, nunca tive negócios com Carlos Cachoeira", afirmou Demóstenes em 6.mar.2012.

Após ele discursar no Senado alegando inocência foram divulgadas notícias de que, por exemplo, ele teria recebido um telefone Nextel antigrampo de Cachoeira para que os dois pudessem conversar ("Folha", 16.mar.2012) e que Cachoeira poderia ter repassado mais de R$ 3 milhões ao senador ("O Globo", 28.mar.2012).

Em 10.jul.2012, véspera da votação da cassação de Demóstenes no Senado, o advogado de defesa, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, concedeu entrevista ao "Poder e Política", projeto do UOL e da Folha. Kakay disse que seria "desproporcional" cassar Demóstenes por causa do uso do Nextel dado por Cachoeira. O advogado disse que todas as outras acusações contra seu cliente não se sustentavam e que talvez coubesse alguma pena alternativa à perda do mandato.

O deputado Carlos Alberto Leréia (PSDB-GO) disse ao "Correio" que não se recordava de Cida ou de Maria José. "Podem ser pessoas que pediram emprego. Conheço atitudes de generosidade de Carlinhos. Ele já me fez favores, como arrumar estágio num laboratório de pesquisa em Anápolis", afirmou. "Anápolis, a 50km de Goiânia, é a cidade de Cachoeira", comentou o jornal.

Em vídeo publicado pelo portal "IG" em 18.abr.2012, Leréia admitiu ser amigo de Cachoeira e que sabia de suas atividades ilegais.

O deputado Rubens Otoni (PT-GO) afirmou que os vídeos divulgados após a prisão de Cachoeira em 2012 mostram conversas filmadas em 2004, quando foi candidato a prefeito de Anápolis, cidade próxima a Brasília, no interior do Goiás.

"O petista conta que lideranças políticas e empresariais de Goiás o procuraram para ajudar Cachoeira a reerguer a Vitapan, sua empresa de produtos farmacêuticos", relatou a coluna "Radar" da revista "Veja". "Como não ajudou Cachoeira durante aquele período, Otoni diz que virou desafeto do bicheiro. Há anos, o petista diz ser chantageado com a possibilidade de divulgação dos vídeos". "Não recebi um real dele. Isso é perseguição", disse o deputado, segundo publicado pela coluna de "Veja".

Sandes Júnior, segundo publicou o "Estado", disse ter recorrido a Cachoeira por causa da proximidade do contraventor com empresários de Anápolis, mas que o patrocínio para realizar a pesquisa não foi conseguido. "Sou de Goiânia e ele é um cara que nasceu em Anápolis, conhece todas as pessoas, os industriais. Mas encontrei com ele depois, num restaurante, e ele falou que estava muito cedo para a pesquisa", disse o deputado, de acordo com o texto do jornal.

Stepan Nercessian (PPS-RJ), por sua vez, disse à "Folha" que dos R$ 175 mil que pegou de Cachoeira, R$ 160 mil seriam para a compra de um apartamento no Rio de Janeiro e já haviam sido devolvidos ao empresários. Outros R$ 15 mil, disse, foram usados para comprar ingressos do Carnaval carioca para Cachoeira.

O jornal publicou ainda que Nercessian afirmou acreditar "completamente" na legalidade do dinheiro de Cachoeira. "Juro que não sei as nuances, mas para mim ele era um empresário. Não estava pedindo um dinheiro 'dado'. Era para devolver", disse.

O que aconteceu?
Quanto a Carlos Leréia (PSDB-GO), Sandes Júnior (PP-GO) e Stepan Nercessian (PPS-RJ), o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou em 24.abr.2012 que fossem abertos 3 inquéritos para investigar as suspeitas de envolvimento do trio com Carlinhos Cachoeira. O decisão de Lewandowski foi registrada no site de "O Estado de S. Paulo".

A corregedoria da Câmara dos Deputados também passou a investigar Lereia, Sandes Júnior e Rubens Otoni. Em 18.jun.2012, já era esperado em Brasília que somente Lereia fosse considerado culpado pela Corregedoria e, portanto, só seu caso fosse levado ao Conselho de Ética da Casa. Essa análise foi feita, por exemplo, pelo colunista da revista "Época" Felipe Patury aqui.

Em 11.jul.2012, mesmo dia em que o Senado cassou o mandato de Demóstenes Torres, a Corregedoria da Câmara recomendou abertura de processo disciplinar somente contra Lereia. A Mesa Diretora da Casa deve ainda se pronunciar sobre aceitar ou não a recomendacão, segundo explicou a "Folha" na reportagem sobre a decisão da Corregedoria.

Demóstenes
Já no Senado, o caso do senador Demóstenes Torres teve maior repercussão.

Após ele discursar no Senado alegando inocência foram divulgadas notícias de que, por exemplo, ele teria recebido um telefone antigrampo de Cachoeira para que os dois pudessem conversar ("Folha", 16.mar.2012) e que Cachoeira poderia ter repassado mais de R$ 3 milhões ao senador ("O Globo", 28.mar.2012).

Em 27.mar.2012, Demóstenes deixou o cargo de líder do DEM na Casa, de acordo com notícia da agência "Reuters".

O partido de Demóstenes ameaçou expulsá-lo e ele mesmo pediu desfiliação em 3.abr.2012, segundo registrou o portal "IG". "Diante do prejulgamento público que o partido fez, comunico minha desfiliação do Democratas", afirmou o senador na carta enviada ao DEM.

Já o DEM, enviou um comunicado à imprensa com o seguinte texto: "O Democratas fez valer o que tem como um dos seus princípios: não tolerar a corrupção e a improbidade. A postura do partido confirma a sua bandeira de não conviver com comportamento aético. Os democratas podem bater no peito, mais uma vez, e dizer que não convivem com a corrupção".

Em 10.abr.2012, o Conselho de Ética da casa abriu um processo disciplinar contra Demóstenes, de acordo com notícia do UOL.

Foi escolhido para relatar o caso o senador Humberto Costa (PT-PE). Em 29.mai.2012, Demóstenes prestou depoimento ao conselho e negou fazer lobby por Cachoeira. A "Folha" publicou relato do depoimento, além de fotos e vídeos. Em 25.jun.2012, o Conselho de Ética aprovou por unanimidade a recomendação feita por Humberto Costa para que o mandato de Demóstenes fosse cassado. A votação foi noticiada pelo UOL.

Em 4.jul.2012, A Comissão de Constituição de Justiça do Senado considerou legal o processo de cassação aberto contra Demóstenes, segundo registrado pela "Folha". Por fim, em 11.jul.2012, o plenário do Senado cassou o mandato de Demóstenes Torres. A cassação foi analisada pelo Blog do Fernando Rodrigues, mesmo autor deste Monitor.

Sem mandato, Demóstenes retomou seu emprego de procurador de Justiça em Goiás. Mas, em 10.out.2012, a corregedoria do Ministério Público de Goiás (MP-GO) informou, segundo noticiado pelo portal "G1", que o ex-senador havia sido afastado do cargo de procurador. A medida, de acordo com o órgão, foi decorrente da instauração do processo administrativo disciplinar para investigar a suposta ligação de Demóstenes com o esquema de Carlinhos Cachoeira.

 

CPI
Concomitantemente aos processos contra os congressistas, foi instaurada uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) para investigar as relações de políticos com Carlinhos Cachoeira.

A CPI fez sua 1ª reunião em 25.abr.2012. A composição do grupo está disponível aqui. O senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) foi escolhido como presidente da CPI e o deputado Odair Cunha (PT-MG) como relator.

Demóstenes foi à CPI em 31.mai.2012 mas se recusou à falar. O UOL publicou aqui relato sobre a sessão da CPI com presença de Demóstenes, além de fotos e vídeos.

Em 15.jun.2012, o presidente da CPI, senador Vital do Rêgo, afirmou em entrevista ao "Poder e Política", projeto do UOL e da "Folha", que o ritmo dos trabalhos da CPI indicava que o prazo para término dos trabalhos, 4.nov.2012, não seria respeitado.

O UOL criou uma página que reúne todos seus textos, fotos e vídeos sobre a CPI do Cachoeira.

 

UOL Cursos Online

Todos os cursos