Judeus etíopes cobram de Israel inquérito sobre contraceptivo polêmico
A Associação dos Judeus Etíopes em Israel está exigindo que o Ministério da Saúde abra uma investigação sobre a administração em mulheres etíopes de um anticoncepcional polêmico por conta de seus efeitos colaterais.
A droga, chamada depo-provera, teria sido administrada durante anos, sem que as mulheres fossem informadas de suas consequências e sem a possibilidade de recorrer a outros meios anticoncepcionais.
A exigência foi apresentada após o Ministério da Saúde ter recomendado que a indicação do medicamento seja feita com mais restrições.
De acordo com uma carta do diretor-geral do Ministério da Saúde, Roni Gamzu, enviada aos principais planos de saúde do país, "de agora em diante, os médicos ginecologistas não deverão renovar receitas de depo-provera para mulheres etíopes ou de outras origens, se houver dúvidas acerca da compreensão das consequências do tratamento".
A diretora da Associação dos Judeus Etíopes, Ziva Mekonen Dego, disse à BBC Brasil que considera "especialmente grave" o fato de que, mesmo depois de chegar a Israel, as mulheres etíopes continuaram recebendo as injeções "sem saber dos efeitos colaterais".
De acordo com relatórios de ONGs de direitos humanos, mulheres foram induzidas a tomar depo-provera durante anos, enquanto esperavam para imigrar para Israel, em campos de transição na cidade de Gondar, na Etiópia.
Vacina
Segundo depoimentos de mulheres etíopes nos campos administrados por representantes de Israel e da organização judaica humanitária Joint, elas receberam injeções de depo-provera e, em alguns casos, pensavam que tratava-se de "vacina".
O remédio geralmente é recomendado em casos de mulheres que não são capazes de controlar e decidir sobre que tipo de anticoncepcional querem utilizar e que sofrem de doenças mentais graves ou de síndrome de Down.
Para a cientista política Hedva Eyal, da ONG feminista Isha Leisha e autora de uma pesquisa sobre mulheres etíopes que foram induzidas a tomar depo-provera, nesse caso trata-se de um fenômeno decorrente de "paternalismo ou racismo".
"A administração dessas injeções faz com que as mulheres não tenham controle sobre sua própria fertilidade", afirmou Eval à BBC Brasil. "A droga tem quase 100% de eficácia e impede que a mulher engravide por pelo menos três meses."
De acordo com a cientista política, dezenas de mulheres etíopes que foram entrevistadas durante a pesquisa afirmaram que não foram oferecidos outros meios anticoncepcionais e que não tinham ideia de quanto esse remédio podia ser prejudicial.
Situação econômica
Entre os efeitos colaterais da droga estão osteoporose, aumento de peso, depressão e dores de cabeça.
Mulheres entrevistadas por Eyal disseram que sofreram efeitos colaterais, mas não sabiam que eles poderiam ser decorrentes das injeções.
Muitas delas, que saíram de aldeias pobres em áreas rurais, disseram que não sabiam que haviam outros tipos de anticoncepcionais que poderiam utilizar.
Outras disseram que foram "obrigadas" a tomar as injeções e que as autoridades nos campos disseram que "em Israel, a situação econômica estava difícil e era melhor não ter muitos filhos".
Em Israel, vivem cerca de 120 mil judeus etíopes. Vários deles se queixam de discriminação racial por serem negros.
Já houve casos em que condomínios se negaram a alugar apartamentos para pessoas da comunidade, e escolas rejeitaram alunos etíopes.
"O diretor-geral do Ministério da Saúde tomou uma medida positiva e corajosa ao advertir os médicos sobre a questão da depo-provera", avalia Hedva Eyal. "Ele é a primeira autoridade que enfrenta o problema, descobrimos essa irregularidade há anos, mas essa é a primeira vez que fomos ouvidas."
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