Mesmo sem 'estoque', cidades da Argentina exportam médicos para o Brasil
Embora uma das bases do programa Mais Médicos seja o código de recrutamento de profissionais da Organização Mundial da Saúde, que permite a atuação de estrangeiros em países com proporção profissional/habitante menor que em sua terra natal, esta condição está afetando áreas de um país com quase que o dobro da nossa proporção de médicos. Na Argentina, cidades fronteiriças com o Brasil estão preocupadas com o êxodo de profissionais em busca de um salário melhor oferecido pelo projeto do governo federal.
Em El Soberbio, três dos oito médicos do principal hospital público se inscreveram no programa. O município possui 67.698 habitantes e faz fronteira com o Rio Grande do Sul. Oscar Ahuad, ministro da Saúde (equivalente a secretário) da província de Misiones, onde está localizado o município, afirmou, em reportagem ao jornal argentino “Clarín”, que considerava pedir ao governo provincial que uma queixa formal fosse formulada ao Brasil sobre o assunto.
O ministro foi procurado pela reportagem do UOL, por telefone, diversas vezes nos últimos cinco dias, para confirmar a informação, mas não atendeu ou retornou as ligações.
- 9826
- http://noticias.uol.com.br/enquetes/2013/06/24/voce-e-a-favor-da-contratacao-de-medicos-estrangeiros-para-atuar-em-areas-carentes.js
De acordo com Ricardo Vargas, funcionário administrativo do hospital de El Soberbio, a saída dos médicos não prejudicaria o funcionamento da instituição, pois seriam substituídos com facilidade. No entanto, a afirmação não corresponde à queixa do ministro da Saúde de Misiones ao jornal argentino.
No Brasil há 1,8 médico por mil habitantes, enquanto na Argentina esta proporção chega a 3,2. Entretanto, as diferenças entre capitais e interior são comuns a ambos os países. Em Posadas, capital de Misiones, segundo o Colégio de Médicos local, há um profissional para cada 196 habitantes. Já na região da fronteira, em locais como El Soberbio, o número chega a cerca de 1.400 moradores por médico.
“O médico finge que trabalha e o Estado finge que paga”
A 193 km de El Soberbio, a cidade de Puerto Iguazú (também em Misiones), do outro lado de Foz do Iguaçu (PR), apresenta outra realidade. Segundo o diretor do hospital público El Semic, Telmo Albretch, três médicos já foram para o Brasil e outros quatro estão esperando o fim dos trâmites da segunda etapa de inscrição (terminada em 30 de agosto). Nenhum dos sete possui especialização. Ele diz ainda não se preocupar com a saída dos funcionários, mas entende o interesse dos profissionais, dada a situação financeira insatisfatória.
Opinião: Drauzio Varella
A questão dos médicos estrangeiros caiu na vala da irracionalidade. No meio desse fogo cruzado, com estilhaços de corporativismo, demagogia, esperteza política e agressividade contra os recém-chegados, estão os usuários do SUS.
Insisto que sou a favor da contratação de médicos estrangeiros para as áreas desassistidas, intervenção que chega com anos de atraso. Mas devo reconhecer que a implementação apressada do programa Mais Médicos em resposta ao clamor popular, acompanhada da esperteza de jogar o povo contra a classe médica, é demagogia eleitoreira, em sua expressão mais rasa.
Leia, na íntegra, o artigo de Drauzio Varella
“Aqui eles recebem 10.000 pesos por seis horas diárias (aproximadamente R$ 4.000) e o salário no Brasil é tentador (R$ 10.000). Eles não cumprem este horário no nosso hospital. Não há muito controle e, como o dinheiro não é suficiente, eles precisam trabalhar em outros lugares. No fim das contas, o médico finge que trabalha e o Estado finge que paga”, conclui.
Apesar da tranquilidade provisória quanto à exportação de profissionais, Albretch, ex-ministro da Saúde da província, afirma que caso o êxodo continue e inclua médicos especializados, a situação pode ficar preocupante.
Realidade é diferente nas maiores províncias
Segundo o Consulado do Brasil em Buenos Aires, a primeira convocatória atraiu 47 médicos na província homônima, a maioria composta por brasileiros e argentinos formados no país. O número caiu na segunda convocatória, encerrada em 30 de agosto, com 15 inscritos.
Mas, devido à maior divulgação do programa, após a matéria do jornal “Clarín”, publicada em 5 de setembro, a responsável pelo programa na representação diplomática brasileira, Giuliana Ciccu, afirma que o número de pedidos de informações aumentou: “Com a perspectiva de novas inscrições em outubro e a matéria do jornal, acho que este número deve se elevar bastante”.
O mesmo ocorre na província de Córdoba, cuja capital homônima é a segunda maior cidade argentina. O cônsul-adjunto, Carlos Liborio, diz que, no total, até agora foram dez médicos na primeira convocatória e dois na segunda. Pelo tamanho da província, a emigração de profissionais não vai afetar o panorama de saúde local.
“Em toda a província de Córdoba há muitos médicos. Não condiz com a situação dos municípios de fronteira com o Brasil. E 40% do total de inscritos são formados por brasileiros que terão a possibilidade de voltar para o país.”
OPINIÕES SOBRE O MAIS MÉDICOS
- "Erramos. A população ficou contra a gente", dizem médicos'
- Janio de Freitas: Silêncio de entidades sobre ataque a cubanos é 'perturbador'
- Janio de Freitas: Dirigentes corporativos da classe médica brasileira passaram a um histerismo gaiato e primário
- Gilberto Dimenstein: Debate sobre os médicos me dá vergonha
- Hélio Schwartsman: Reações destemperadas de órgãos e conselhos médicos à vinda dos cubanos quase dão razão ao governo brasileiro
- Mario Magalhães: médicos covardes, egoístas e impiedosos
- Eliane Cantanhêde: Ninguém pode ser contra um programa que leva médicos, mesmo estrangeiros
- David Uip: Não se resolve a carência de médicos no interior do Brasil contratando profissionais estrangeiros sem revalidação do diploma
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.