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Transplante de cabeça pode se tornar realidade em apenas 2 anos, diz médico

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Imagem: iStock

Do UOL, em São Paulo

26/02/2015 21h00

Um cirurgião italiano tem planos de realizar o transplante de cabeça de uma pessoa viva para o corpo de um doador e afirma que a tecnologia que permitiria tal procedimento estará disponível em apenas dois anos.

Segundo o médico Sergio Canavero, o projeto que reunirá uma equipe de cirurgiões terá início em junho em Maryland, nos Estados Unidos.

Durante anos, Canavero vem afirmando que a ciência médica avançou ao ponto que um transplante de corpo inteiro é uma possibilidade real. Ele publicou recentemente um artigo no qual explica como seria a cirurgia. Em entrevista à revista ”New Scientist”, o médico disse que os transplantes de corpo inteiro seriam usados para prolongar a vida de pessoas afetadas por doenças terminais.

“Se a sociedade não quiser algo assim, não vou seguir em frente. Mas se as pessoas não querem essa possibilidade nos Estados Unidos ou na Europa, não significa que não possa ser feito em outro lugar”, disse.

Pelo procedimento descrito pelo médico italiano, os cirurgiões iriam resfriar a cabeça do paciente e o corpo do doador, para que suas células não morressem durante a operação. O pescoço seria então cortado, as veias ligadas com tubos bem finos, e a medula espinhal cortada com bisturi bem afiado para minimizar danos aos nervos. A cabeça seria movida e transplantada para o corpo do doador. Para permitir que nervos e medula de um corpo se fundissem a outro, a equipe usaria uma substância chamada glycol polyethyleno. O paciente seria mantido em coma durante semanas, para evitar que se movesse, permitindo a correta ligação. Após sair do coma, Canavero afirma que o paciente seria capaz de falar e mover o rosto, mas considera que seria preciso um ano de fisioterapia para que o paciente voltasse a mover o corpo.

Além da tecnologia, o maior entrave para a realização de uma cirurgia tão radical está na questão moral e ética. Para que pudesse ser realizada, o processo envolveria o uso de primatas em testes, o que poderia levantar a ira de grupos de proteção aos animais. E depois, testes em humanos.

“O maior problema em relação a esse procedimento é mesmo a questão ética”, afirmou Canavero à revista “New Scientist”. “Será que esta cirurgia deveria ser feita? Muitas pessoas, com certeza, vão discordar”.

A ideia de transplantes de corpo inteiro -- ou transplantes de cabeça, dependendo da perspectiva -- já foi tentada anteriormente. Em 1970, Robert White liderou uma equipe na Universide Case Western Reserve em Cleveland, nos Estados, que tentou transplantar a cabeça de um macaco no corpo de outro animal da mesma espécie. Os cirurgiões pararam antes de finalizar a ligação da medula espinhal, então o macaco acabou paralisado, sem conseguir mover o corpo.

No ano passado, pesquisadores da Universidade Médica de Harbin, na China, avançaram nos procedimentos com ratos de laboratório. Eles esperam aperfeiçoar o procedimento do que consideram “um marco na história médica que poderá salvar milhões de pessoas”.

Apesar do entustiasmo de Canavero, muitos cirurgiões e neurocientistas acreditam que há dificuldades enormes que não permitiriam que tal cirurgia fosse feita em futuro próximo. O maior entrave é que ninguém sabe como reconectar nervos espinhais e fazê-los funcionar novamente. Se isso fosse possível, pessoas paralisadas devido a acidentes poderiam voltar a andar novamente.

“Não há evidência de que a conectividade de nervos, medula e cérebro poderiam levar ao pleno funcionamento das funções motoras após um transplante de cabeça”, afirmou Richard Borgens, diretor do Centro para Pesquisa de Paralisia na Universidade Purdue em Indiana, nos Estados Unidos, à revista “New Scientist”.

“As chances deste projeto se realizar são pequenas, pois se trata de um projeto muito grande”, afirmou à revista Harry Goldsmith, professor de cirurgia neurológica na Universidade da Califórnia. “Eu não acredito que vá funcionar um dia, há muitos problemas envolvidos nesse procedimento”.

Patricia Scripko, uma neurologista no Sistema de Saúde Valley Memorial na Califórnia, também não acredita no sucesso da empreitada, mas admitiu a possibilidade. “Se um transplante de cabeça fosse realizado algum dia, acho que seria um caso isolado. Não creio que vá acontecer porque ninguém acorda e diz ‘Estou ficando velho, tenho artrite, talvez eu devesse pegar um corpo que funcione melhor e seja mais bonito’”.