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Capitão do barco é acusado pela morte de mais de 800 migrantes no Mediterrâneo

na Catania, Itália

21/04/2015 18h30

O capitão da embarcação lotada com centenas de imigrantes e que naufragou no fim de semana foi apontado pela procuradoria italiana como o único responsável pela tragédia, uma das piores já ocorrida o Mar Mediterrâneo.

Ainda abalados e exaustos, os sobreviventes deste novo desastre marítimo, que teria matado cerca de 800 pessoas, chegaram nesta terça-feira à Sicília, junto com dois traficantes de seres humanos que foram presos.

A responsabilidade do capitão do barco, um tunisiano de 27 anos, Mohammed Ali Malek, é inquestionável, segundo a procuradoria de Catânia, na Sicília, já que o homem provocou o naufrágio por ter sobrecarregado o barco e se mostrar sem condições de realizar manobras adequadas.

Esta catástrofe tem duas causas principais, segundo a justiça, em um comunicado.

"Por um lado, as manobras equivocadas decididas pelo comandante do barco que, em uma tentativa de abordar o cargueiro (que acudiu em socorro), provocou a colisão com esta embarcação maior", afirmou a fonte.

"Por outro lado, o excesso de passageiros do barco, que perdeu o equilíbrio por causa dessas manobras equivocadas e pelo deslocamento dos imigrantes a bordo", acrescentou.

O barco afundou por esses motivos, enfatizou o texto. A procuradoria também destaca que o cargueiro português que tentou socorrer os imigrantes "não contribuiu em absoluto para o naufrágio".

O balanço oficial da tragédia é de 24 mortos e 28 sobreviventes, mas o número de desaparecidos soma cerca de 800 pessoas, entre elas crianças e mulheres, segundo organizações humanitárias internacionais.

Em Nova York, o Conselho de Segurança da ONU condenou o pior de uma série de naufrágios no Mediterrâneo e exigiu o fortalecimento da resposta global aos problemas migratórios e ao tráfico de seres humanos.

Os 15 membros do Conselho manifestaram seu apoio aos países do sul da Europa, que enfrentam o fluxo de refugiados e pediram para "fortalecer a resposta global a este desafio comum, com a finalidade de proteger os migrantes de serem vítimas dos traficantes de seres humanos".

Em uma declaração unânime, o Conselho de Segurança condenou "o crime transnacional organizado e as atividades ilícitas como o contrabando de migrantes", ao mesmo tempo que destacou que isto tem um impacto na estabilidade da região.

Na segunda-feira, o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, já tinha pedido que a Europa redobre os esforços para enfrentar esta crise e lembrou que Itália, Grécia e Malta "têm a carga mais pesada" ao lidar com a maciça chegada de refugiados.

"O Mediterrâneo se transforma rapidamente em um mar de sofrimento para milhares de imigrantes", disse Ban.

Presos no porão

A justiça não confirmou esta cifra, mas estima em 850 o número de imigrantes a bordo da embarcação, com base em relatos dos sobreviventes e estimativa da tripulação da embarcação portuguesa.

Somente 24 corpos foram recuperados e esse pequeno número de sobreviventes é explicado pelo fato de que muitos imigrantes, em sua maioria mulheres e crianças, estavam presos no porão do barco.

A investigação prosseguirá para determinar o número de mortos, inclusive procedendo à recuperação dos restos da embarcação. O chefe de governo italiano, Matteo Renzi, aludiu a esta possibilidade para "dar uma sepultura decente às vítimas".

"Havia um pouco mais de 800 pessoas a bordo, entre elas crianças de 10, 12 anos. Havia sírios, eritreus, somalis... Saíram no sábado às 08h00 de Trípoli", segundo Carlota Sami, porta-voz na Itália do Alto Comisariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur).

O porta-voz da Acnur, Adrian Edwards, por sua vez, declarou o naufrágio do barco no domingo frente ao liberal da Líbia é "o incidente mais mortífero no Mediterrâneo já registrado".

Esta cifra foi confirmada por um porta-voz da Organização Internacional para as Migrações (OIM), Flavio Di Giacomo.

A OIM informou ainda que mais de 1.750 imigrantes perderam a vida no Mediterrâneo no correr do ano, um número 30 vezes maior que no mesmo período de 2014.

"Com a mais recente contagem, a OIM calcula que o número de mortos desde o início de 2015 é atualmente 30 vezes superior ao de 2014 nesse mesmo período, quando foram assinalados 56 mortes de imigrantes no Mediterrâneo", declarou o porta-voz da OIM, Joel Millman, em Genebra.

"A OIM teme que o total de 3.279 mortes de imigrantes em 2014 seja superado este ano em algumas semanas, e possa alcançar os 30.000 até o final do ano, se nos basearmos no balanço atual", acrescentou.

Segundo Edwards, apenas no mês de abril, foram 1.300 mortos, o que estabelece um trágico recorde de mortes.

Fluxo ininterrupto

E o fluxo não para: nesta terça-feira, a marinha italiana anunciou ter resgatado 446 imigrantes, entre eles 59 crianças, a bordo de outra embarcação a 150 km do litoral da Calábria, sudeste da Itália.


Na véspera, a Guarda Costeira salvou 638 imigrantes embarcados em seis lanchas pneumáticas, em seis operações de resgate distintas, alguns a menos de 60 km das costas líbias.

Também na véspera, a União Europeia convocou uma cúpula de chefes de Estado e de Governo e revelou um plano de ação para tentar dar respostas ao drama dos imigrantes no Mediterrâneo.

O plano de ação apresentado pela Comissão Europeia possui dez pontos, que incluem reforçar as operações de controle e resgate para responder à situação de crise migratória.

Este plano será apresentado na quinta-feira aos chefes de Estado e de governo da União Europeia durante a cúpula extraordinária, informou a Comissão em um comunicado.

A reunião foi pedida no domingo pelo chefe do Governo italiano, Matteo Renzi, com apoio de outros dirigentes, após o naufrágio no qual cerca de 800 pessoas morreram ao largo da costa líbia no domingo.

O plano apresentado também propõe a apreensão e destruição de embarcações utilizadas para transportar os migrantes, o reforço da cooperação entre as organizações europeias e um programa para deportação rápida dos candidatos à imigração não autorizados a permanecer na UE.

O Vaticano propôs nesta terça-feira que se reconheça em nível internacional, com categoria jurídica de crime contra a humanidade, o tráfico de pessoas.

Para as organizações de ajuda aos emigrantes, no entanto, o que falta é colocar a questão humanitária no centro do debate, pois "podemos fechar uma rota de emigração clandestina na Líbia, mas então será aberta outra em outro lugar", explicou à imprensa o presidente da Cruz Vermelha italiana, Francesco Rocca.