Queda de ministros ilustra deficiências da política brasileira, dizem analistas
A queda do ministro do Trabalho e Emprego, Carlos Lupi, o sétimo de uma série de demissões que marcou o primeiro ano do governo Dilma Rousseff, reflete as deficiências do sistema político brasileiro, segundo analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Lupi entregou o cargo neste domingo, após denúncias de desvio de verbas públicas do Ministério do Trabalho por meio de ONGs conveniadas com o governo, reveladas em uma reportagem da revista Veja.
Durante audiência na Câmara dos Deputados, Lupi negou ter relações com as organizações e disse que não conhecia o dirigente da ONG Pró-Cerrado, Andre Meira, e que nunca havia viajado em seu jatinho particular.
Dias depois, um site do Maranhão publicou uma foto de Lupi descendo da aeronave. A oposição acusou Lupi de "mentir ao país". O ministro depois mudou a versão e negou ter dito que não conhecia Meira.
A isso se somaram recentes denúncias do jornal Folha de S. Paulo de que o ministro teria sido "funcionário fantasma" da Câmara dos Deputados e teria acumulado cargos simultaneamente de maneira irregular, como assessor parlamentar em órgãos públicos diferentes.
'Presidencialismo de transação'
Para o cientista político João Paulo Peixoto, da UNB (Universidade de Brasília), "a queda de Lupi é mais um episódio lamentável, sem grandes consequências para o governo".
Não há expectativa de retaliações do PDT (Partido Democrático Trabalhista), que conta com 26 deputados e cinco senadores, segundo o analista.
"Até agora, o governo tem se mantido à margem das demissões. A queda dos ministros não implicou em grandes prejuízos na relação do governo com a base", disse.
Para Peixoto, "o problema estrutural está no presidencialismo de coalizão". O termo criado por acadêmicos brasileiros define o "loteamento dos ministérios" entre os partidos da base governista.
"Com esse sistema, todo governo se vê forçado a buscar alianças das mais distintas, com partidos com os quais não tem nenhuma identificação. Enquanto predominar a política de distribuição de cargos públicos, esse processo (de corrupção) continuará", disse.
Para o historiador Marco Antonio Villa, da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), o problema também está no presidencialismo de coalizão, que ele prefere chamar de "presidencialismo de transação".
"Em troca de apoio no Congresso, o governo entrega os ministérios para serem saqueados pelos partidos. Esse tipo de presidencialismo causa crises a toda semana", diz.
Além de Lupi, três dos sete ministros que deixaram o governo o fizeram sob suspeitas de desvio de recursos ligados às máquinas de seus respectivos partidos e o envolvimento de ONGs.
É o caso de Alfredo Nascimento (PR, ex dos Transportes), Wagner Rossi (PMDB, ex da Agricultura) e Orlando Silva (PC do B, ex do Esporte).
Antonio Palocci, ex-Chefe da Casa Civil foi o primeiro a se afastar, em junho deste ano, acusado de enriquecimento ilícito. Pedro Novais (PMDB, ex do Turismo) foi acusado de fazer uso de verbas públicas em benefício próprio.
Apenas Nelson Jobim (ex da Defesa) não saiu sob suspeita de corrupção.
Reforma ministerial
A queda de Lupi não veio em boa hora para o governo, que esperava manter Lupi no cargo até a reforma ministerial de janeiro, segundo os analistas.
Embora Dilma tenha angariado apoio popular com a queda em série de ministros sob suspeita de corrupção, o que vem sendo chamado de "faxina" tem causado paralisia no governo.
Peixoto diz que "gostaria de ver a diminuição dos ministérios".
"No caso do ministério do Trabalho, poderia haver uma fusão com o da Previdência, como já foi no passado", diz.
O professor também defende perfis mais técnicos, a fim de aumentar a eficiência da gestão do governo.
Villa é pessimista em relação à prometida reforma ministerial de janeiro.
"A reforma será pautada pelas eleições municipais de 2012, quando deveira correr atrás da eficiência", diz.
"É assustadora a paralisia do governo", afirma Villa, citando o não cumprimento de metas de programas como o Minha Casa Minha Vida.
Villa diz que é preciso "rever a forma como o governo encaminha os gastos orçamentários e as relações com as ONGS".
"Também há o problema da crise internacional. A impressão é a de que somente o ministro (Guido) Mantega (da Fazenda) está preocupado com a crise, enquanto o conjunto do governo a ignora", diz Villa.
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