Distribuição de renda faz EUA passarem por momento de "brasilianização"
A notícia de que a agência de classificação de risco Standard and Poor's reduziu de estável para negativa a perspectiva de rating dos Estados Unidos provocou surpresa e reações de todo tipo. As bolsas de valores caíram mundo afora e o editorial do jornal francês "Le Monde" tratou o assunto com gravidade. O diário parisiense observa que a agência confirma a preocupação do FMI e de muitos sobre a incapacidade do Congresso e do presidente Obama articularem uma política coerente de redução dos deficits e da dívida americana.
Há, entretanto, uma dimensão mais profunda da crise americana que foi agora sublinhada por Joseph Stiglitz. Num importante artigo intitulado "Of the 1%, by the 1%, for the 1%" e publicado pelo número de maio da revista "Vanity Fair" (acessível online), o grande economista americano demonstra os efeitos nefastos da extraordinária concentração da renda ocorrida nos Estados Unidos nas últimas décadas.
Há 25 anos, a faixa do 1% mais rico da população detinha 12% da renda americana e controlava 33% da riqueza do país. Agora, este 1% do topo da pirâmide social tem perto de 25% da renda e 40% da riqueza nacional. Para Stiglitz, o perfil da distribuição da renda dos Estados Unidos coloca o país perto dos níveis de desigualdade social que existem na Rússia e no Irã.
Tal evolução provoca, segundo o artigo, três tipos de efeitos negativos. Primeiro, o aguçamento da desigualdade social reduz as oportunidades de ascensão social que formam a base da democracia americana. Em segundo lugar, as distorções econômicas que geram a desigualdade na distribuição da renda abalam a eficiência da economia americana. Em seguida, a desigualdade desestimula a intervenção pública e a ação governamental para modernizar a sociedade americana.
Tudo isto por causa de um fenômeno que os brasileiros conhecem bem: os ricos não recorrem a serviços públicos, como educação, saúde e segurança, porque podem pagar por serviços similares personalizados fornecidos pelo setor privado. Enfim, Stiglitz completa afirmando que apesar de seus protestos, os ricos devem apreciar a atual política governamental americana, que não consegue redistribuir riquezas nem aumentar impostos sobre os rendimentos dos ricos.
Na mesma ordem de ideias, Stiglitz aponta o tráfico de influência e o poder do grande capital na manipulação das políticas governamentais afirmando: "Quando entram no Congresso, virtualmente todos os senadores e a maior parte dos deputados são membros da categoria composta pelo 1% mais rico, em seguida, são reeleitos com o dinheiro deste 1%, e sabem que se servirem os membros deste 1% (no Congresso) serão recompensados por esta categoria quando terminarem seu mandato".
Ou seja, para o prêmio Nobel de Economia de 2001 a desigualdade social é um elemento chave no emperramento da democracia e no aviltamento da identidade nacional americana.
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