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Mega-apagão na Índia pode ser indicativo de crepúsculo dos BRICs

Vendedores improvisam com luz de lampião durante o blecaute em Calcutá, na terça-feira (31). Milhões de pessoas foram afetadas pelo blecaute, em 15 Estados do país - Rupak De Chowdhuri/Reuters
Vendedores improvisam com luz de lampião durante o blecaute em Calcutá, na terça-feira (31). Milhões de pessoas foram afetadas pelo blecaute, em 15 Estados do país Imagem: Rupak De Chowdhuri/Reuters

03/08/2012 13h02

A pane de energia elétrica ocorrida na Índia entre os dias 30 de julho e 1º de agosto, com seu pico no dia 31, atingindo perto de 700 milhões de indianos, já é considerada como o maior apagão da história. Entre as causas apontadas para explicar a ruptura do sistema elétrico do país aparecem a seca, que aumentou o uso de bombas elétricas de água nas zonas agrícolas e de aparelhos de ar condicionado nas cidades, a falta crônica de investimentos no setor energético e a incompetência das autoridades federais e estaduais.

A notícia fez lembrar os apagões intermitentes no Brasil no final da segunda presidência de Fernando Henrique Cardoso, cujas consequências foram importantes. Além de reduzir o crescimento econômico do país em 2001 e 2002, o apagão desgastou politicamente o governo. Para uma parte da opinião pública brasileira, a crise demonstrou os limites da política de liberalização da economia implementada por FHC. Certa ou errada, tal percepção favoreceu a eleição de Lula e a política mais estatizante defendida pelo PT. Acessoriamente, a crise projetou também no noticiário nacional o nome de Dilma Rousseff, então secretária de Minas e Energia do Rio Grande do Sul, único Estado que não precisou fazer racionamento de energia.

Nesta perspectiva, qual serão as repercussões políticas e econômicas do mega-apagão na Índia? Embora o governo federal indiano, formado pela coalizão partidária liderada pelo primeiro-ministro Manmohan Singh (o primeiro Sikh não hindu que dirige o país), tenha jogado a culpa nos governos estaduais indianos, seu partido, o Congress, está sendo diretamente responsabilizado pela incúria administrativa que gerou o apagão. A mídia indiana considera que o caos provocado durante os três dias de crise energética humilhou o país.

Tal ponto de vista é retomado e ampliado pela mídia ocidental. Vídeos e fotos de trens parados, engarrafamentos e a confusão que o apagão criou nas grandes cidades do norte da Índia, acentuaram a ideia de que o país está meio desgovernado. Assim, a revista britânica “The Economist” escreve “O impacto [do apagão] na economia indiana vai muito além da queda da produção. O blecaute atinge duramente a reputação do país, e evidencia suas péssimas infraestruturas que estão travando seu esforço para alcançar a China”.

Mas a comparação entre a Índia e a China foi mais além e estendeu-se ao conjunto dos BRICs (sem a África do Sul, que muitos consideram ter sido indevidamente incluída no grupo). Uma reportagem da CNN sobre o mega-apagão mostra ainda a queda do PIB neste ano na Índia (6,5% comparados com 10,1% em 2010), no Brasil, e na China (7,5%, a primeira taxa inferior a 8% dos últimos oito anos). Entrevistado na mesma reportagem, o criador do conceito dos BRICs, Jim O’Neill, da Goldman Sachs, declarou que a crise dos BRICs é mais importante do que a crise na zona euro. Seu argumento baseia-se no fato de que o crescimento dos BRICs tem impulsionado a economia mundial: no ano passado os BRICs adicionaram 2,2 trilhões de dólares ao crescimento da economia mundial, o que equivale a um pouco mais do que o PIB da Itália.

Para a maioria dos comentadores, a questão agora consiste em saber como se dará a aterrisagem econômica nesses países, e principalmente na Índia e na China. Deste ponto de vista, a Economist faz uma distinção essencial. Na Índia, as reformas podem ser implementadas pacificamente, dentro do quadro democrático. Ao inverso, a ditadura chinesa, pouco equipada institucionalmente para gerir crises graves, continua sendo a grande incógnita da história contemporânea.