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Libertem Mitt Romney!

Mitt Romney acena para smipatizantes durante evento político em Maryland (EUA) - Shawn Thew/Efe
Mitt Romney acena para smipatizantes durante evento político em Maryland (EUA) Imagem: Shawn Thew/Efe

26/10/2015 10h13

Às vezes eu me pego sentindo pena de Mitt Romney. Falando sério! Em outro tempo e em outro lugar, ele poderia ter sido respeitado como um tecnocrata eficaz - um sujeito inteligente, valorizado (embora provavelmente não amado) por sua capacidade de fazer o serviço. Na verdade, foi mais ou menos assim que funcionou quando ele foi governador de Massachusetts, há uma década.

Mas agora é 2015 nos EUA, e o partido de Romney não quer pessoas que façam o serviço. Pelo contrário, ele ativamente odeia programas de governo que melhoram a vida dos americanos, especialmente se ajudarem Aquelas Pessoas. E isso quer dizer que Romney não pode comemorar sua principal realização na vida pública, a reforma da saúde de Massachusetts, que serviu de modelo para o Obamacare.

Isso deve doer. Na verdade, alguns dias atrás, Romney não conseguiu evitar: gabou-se ao "Boston Globe" de que "sem o Romneycare não teríamos tido o Obamacare" e que, em consequência, "muita gente não teria seguro-saúde". E é verdade!

Mas essas verdades não são bem-vindas no Partido Republicano. Ben Carson, que lidera as últimas pesquisas dos republicanos em Iowa, declarou que o Obamacare é a pior coisa que aconteceu com os EUA desde a escravidão; 81% dos prováveis frequentadores do cáucus republicano [reunião da liderança do partido para escolher possíveis candidatos] dizem que essa declaração o torna mais atraente como candidato.

Não é de surpreender, portanto, que Romney tenha tentado rapidamente recuar em seu comentário, afirmando que o Obamacare é muito diferente do Romneycare, o que não é, e que ele fracassou.
Mas, você sabe, não fracassou. Pelo contrário, a Lei de Acesso à Saúde tem sido um sucesso notável, especialmente considerando a oposição de terra-arrasada que enfrentou.

Em primeiro lugar, muita gente - cerca de 16 milhões, na estimativa do governo, número confirmado por fontes independentes - realmente têm seguro-saúde que de outro modo não teriam. Outros milhões estariam segurados se os Estados controlados por republicanos não se recusassem a expandir o Medicaid (apesar de que seria o governo federal a pagar os custos) e geralmente tentassem obstruir o programa.

Até que ponto a segurança assim obtida é boa? Não é perfeita: apesar dos subsídios, as apólices ainda são caras para alguns, e os dedutíveis e a coparticipação podem ser onerosos. Mas a maioria das pessoas inscritas no Obamacare relata alta satisfação com sua cobertura, o que é enormemente melhor do que não estar segurado.

E posso incluir uma nota pessoal? Para dizer a verdade, eu vivo em um meio bastante rarefeito, de classe média-alta e superior, mas mesmo assim conheço muitas pessoas para as quais a Lei de Acesso à Saúde foi mais ou menos literalmente um salva-vidas. Ela é, como Joe Biden não disse exatamente, um negócio muito importante.

Ah, e você percebeu como aqueles anúncios que mostravam pessoas supostamente prejudicadas pelo Obamacare desapareceram? É porque nenhuma de suas histórias se sustentava.
Além disso, o grande negócio do Biden ficou abaixo do orçamento. Os prêmios de seguros nos primeiros dois anos do Obamacare ficaram muito aquém das previsões. Parece que haverá uma recuperação parcial em 2016, mas ainda é mais barato do que se esperava. E acima de tudo os gastos com atenção à saúde baixaram drasticamente.

Enquanto isso, nenhuma das coisas ruins que deveriam acontecer aconteceu. O crescimento do emprego desde que a lei "matadora de empregos" entrou em vigor foi mais rápido do que em qualquer momento desde os anos 1990. Os empregadores na verdade não eliminaram empregos em tempo integral para evitar as provisões da lei. E o deficit orçamentário continua caindo.

Em suma, o presidente Barack Obama, Nancy Pelosi e Harry Reid, que conseguiram aprovar a Lei de Acesso à Saúde apesar da total oposição dos republicanos, têm muito de que se orgulhar. E Romney também, que ajudou a assentar as bases. Em vez disso, porém, ele está jogando no lixo a melhor coisa que já fez.

Você deve se perguntar: Romney realmente pensa que seu partido olharia mais favoravelmente para o Obamacare se ele funcionasse ainda melhor, se não custasse nada? Nesse caso, ele está iludido. Afinal, a grande maioria dos Estados controlados por republicanos recusou dinheiro grátis, para não permitir que o governo expandisse o Medicaid (e assim bombeasse dinheiro para suas economias).

A questão é que, do ponto de vista da base republicana, cobrir os não segurados, ou ajudar os desafortunados em geral, não é uma realização, é um problema. Não se trata de quanto custa em fundos do contribuinte ou de impacto econômico: a base realmente está disposta a perder dinheiro para perpetuar o sofrimento.

E um movimento com esses valores não tem utilidade para os tecnocratas. Pergunte a Ben Bernanke, que perdeu a confiança em um partido dominado pelo "não-sei-de-nadismo da extrema-direita".

Talvez Romney ainda imagine que um partido desesperado o chamará para salvar-se de Donald Trump. Ou talvez ele simplesmente não consiga admitir que escolheu o grupo errado de pessoas para se relacionar. De qualquer modo, esperamos para o bem dele que acabe desistindo de suas ilusões. Confie em mim, Mitt: será uma experiência libertadora.