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Objetivo terrorista é fazer com que as pessoas tenham medo do próprio medo

16/11/2015 11h07

Assim como milhões de pessoas, estive acompanhando obsessivamente as notícias de Paris, deixando de lado outras coisas para me concentrar no horror. É a reação humana natural. Mas sejamos claros: também é a reação que os terroristas querem. E isso é algo que nem todo mundo parece compreender.

Vejam, por exemplo, a declaração de Jeb Bush de que "esta é uma tentativa organizada de destruir a civilização ocidental". Não, não é. É uma tentativa organizada de semear o pânico, o que absolutamente não é a mesma coisa. E comentários como esse, que borram essa distinção e fazem os terroristas parecerem mais poderosos do que são, apenas ajudam à causa dos jihadistas.

Pensem, por um momento, no que é a França e o que ela representa. O país tem seus problemas (qual não tem?), mas é uma democracia robusta, com uma profunda reserva de legitimidade popular. Seu orçamento de defesa é pequeno comparado com o americano, mas de qualquer modo o país mantém uma poderosa força militar e possui recursos para tornar esses militares muito mais fortes, se quiser (a economia francesa é mais ou menos 20 vezes maior que a da Síria).

A França não vai ser conquistada pelo Estado Islâmico, nem agora nem nunca. Destruir a civilização ocidental? Sem chances.

Então o que foi o ataque de sexta-feira? Matar pessoas aleatórias em restaurantes e shows é uma estratégia que reflete a fraqueza fundamental de seus perpetradores. Isso não vai estabelecer um califado em Paris. O que pode fazer, contudo, é inspirar medo, e é por isso que o chamamos de terrorismo, e não devemos dignificá-lo com o nome de guerra.

A questão não é minimizar o terror. Não, é enfatizar que o maior perigo que o terrorismo representa para nossa sociedade não vem diretamente do mal infligido, mas das reações erradas que possa inspirar. E é crucial perceber que há inúmeras maneiras como a reação pode ser errada.

Certamente seria muito ruim se a França ou outras democracias reagissem ao terrorismo com conciliação --se, por exemplo, os franceses se retirassem do esforço internacional contra o EI (Estado islâmico) na vã esperança de que os jihadistas os deixassem em paz. E não direi que não há possíveis conciliadores por aí; na verdade, há algumas pessoas decididas a acreditar que o imperialismo ocidental é a raiz de todos os males, e que tudo ficaria bem se parássemos de interferir.

Mas é difícil encontrar exemplos reais de políticos da corrente dominante, quanto mais governos, cedendo às exigências dos terroristas. A maioria das acusações de conciliação nos EUA parece visar os liberais que não usam o que os conservadores consideram uma linguagem suficientemente firme.

Um risco muito maior, na prática, é que os alvos do terrorismo tentem alcançar a segurança perfeita eliminando toda ameaça concebível --uma reação que inevitavelmente piora as coisas, porque é um mundo grande e complexo, e nem mesmo as superpotências podem consertar tudo.

No 11 de Setembro, Donald Rumsfeld disse a seus assessores: "Arrasem tudo. Relacionado ou não", e imediatamente sugeriu usar o atentado como desculpa para invadir o Iraque. O resultado foi uma guerra desastrosa que, na verdade, deu poder aos terroristas e abriu caminho para a ascensão do EI.

E sejamos claros: isto não foi apenas uma questão de mau julgamento. Sim, Virginia, as pessoas podem e realmente exploram o terrorismo com fins políticos, inclusive usando-o para justificar o que elas imaginam que será uma pequena guerra esplêndida e politicamente benéfica.

Ah, e, apesar do que pessoas como Ted Cruz possam imaginar, pôr fim à nossa relutância em matar civis inocentes não removeria os limites do poderio americano. No entanto, faria maravilhas para o recrutamento terrorista.

Finalmente, o terrorismo é apenas um dos muitos perigos no mundo, e não devemos permitir que ele desvie nossa atenção de outros problemas. Desculpem, conservadores: quando o presidente Barack Obama descreve a mudança climática como a maior ameaça que enfrentamos, ele está exatamente certo. O terrorismo não pode destruir e não destruirá nossa civilização, mas o aquecimento global pode.

Então, o que podemos dizer sobre como reagir ao terrorismo? Antes das atrocidades em Paris, a reação geral do Ocidente envolvia uma combinação de policiamento, precaução e ação militar. Todas envolviam difíceis compensações: vigilância versus privacidade, proteção versus liberdade de movimento, negar os terroristas versus os custos e perigos de travar uma guerra no exterior. E sempre esteve claro que de vez em quando haveria um ataque terrorista.

Paris pode ter mudado um pouco esse cálculo, especialmente no que se refere ao tratamento dos refugiados pela Europa, uma questão agônica que agora se torna ainda mais carregada. E terá de haver um "post mortem" sobre por que essa trama tão elaborada não foi detectada. Mas vocês se lembram de todos os pronunciamentos de que o 11 de Setembro mudaria tudo? Bem, não mudou --nem esta atrocidade mudará.

Mais uma vez, o objetivo dos terroristas é inspirar terror, porque é tudo de que eles são capazes. E a coisa mais importante que nossas sociedades podem fazer em reação é se recusar a ceder ao medo.

Tradutor: Luiz Roberto Mendes Gonçalves