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Geólogo viaja o Brasil em busca de pistas e histórias de abalos históricos

Geólogo José Veloso acompanhou de perto o mais longo terremoto do país - Paulo Castro/UnB Agência
Geólogo José Veloso acompanhou de perto o mais longo terremoto do país Imagem: Paulo Castro/UnB Agência

Ingrid Tavares

Do UOL, em São Paulo

14/10/2013 06h00

Quando o telefone tocou logo no começo da manhã de 30 de novembro de 1986, Alberto Veloso imaginou que seu pai queria lhe desejar um feliz aniversário. Mas no lugar do esperado parabéns, o então geólogo da UnB (Universidade de Brasília) recebeu a notícia de que João Câmara, uma cidade a cerca de 80 quilômetros de Natal (RN), tinha sofrido seu mais violento abalo sísmico naquela madrugada: 5,1 graus na escala Richter.

O pesquisador não se importou em adiar sua festa de aniversário para voltar ao local que tinha conhecido havia apenas três meses. Desde que pequenos abalos foram sentidos na região nordestina, em agosto daquele ano, Veloso e sua equipe da capital federal instalaram três estações portáteis para medir a força dos tremores de terra.

"Foi assim que nós descobrimos a falha geológica [da Samambaia] que produziu todos os tremores de João Câmara. Quando a detectamos ela tinha dez quilômetros de comprimento, mas, ao fim da série, ela chegou a ultrapassar 30 quilômetros. Ela é hoje a maior falha do país", afirma sobre as marcas produzidas debaixo do solo.

A saga nordestina acabou marcando uma nova fase do especialista: a experiência rendeu seu primeiro livro, O Terremoto que Mexeu com o Brasil, publicado em 2011 pela Thesaurus Editora.

Desde que se aposentou na UnB, onde também chegou a ser chefe do Observatório Sismológico, Veloso tornou-se um caçador de histórias de abalos históricos, como a de um meteoro que causou um tremor em localidades diferentes no século 19. Ele diz procurar não apenas pistas em lugares distantes de casa, mas também compila relatos de antigos moradores sobre os terremotos brasileiros. A ideia, diz ele, é escrever seu segundo livro sobre o tema.

Mas não é só pela coincidência de datas que o professor recorda-se tão bem do caso de João Câmara. Por sete anos, ele visitou frequentemente o pequeno município, já que os abalos foram interrompidos somente em 1993. Nesse período, mais de 50 mil eventos foram registrados pelos especialistas. Desde então, a falha produziu novos tremores, mas sempre com intervalos mais longos dos que os da década de 1980.

Mesmo não sendo o abalo mais forte já registrado no país,ele é o que mais causou danos materiais: mais de 4.000 edificações precisaram ser reconstruídas ou reformadas, o que expulsou cerca de 26 mil pessoas de suas casas. "Se a falha de 30 quilômetros tivesse quebrado de uma só vez, ela poderia ter gerado um tremor de 7 graus de magnitude, que liberaria cerca de 700 vezes mais energia do que o sismo de novembro de 1986. E tudo poderia ter sido bem pior, inclusive para a capital Natal."

Desde 1955, a marca do abalo mais violento do Brasil é de Serra do Tombador (MT), por seus 6,2 graus na escala Richter, capaz "de liberar energia equivalente a cinco milhões de toneladas de dinamite". A partir da magnitude de 5 graus, os sismos têm potencial para causar estragos, como tombar objetos grandes, abrir fissuras, derrubar construções, gerar incêndios e até ferir pessoas. Mas como esse tremor ocorreu em uma área pouco habitada, não causou tantos problemas como em João Câmara. 

De acordo com o Serviço Geológico dos Estados Unidos, cerca de cem mil dos 500 mil terremotos detectados anualmente no mundo são sentidos pelas pessoas, sendo que apenas cem desses podem ser perigosos.

"Por aqui, é comum registrar um tremor de terra a cada semana, mas a maioria é de pequena intensidade. Mesmo assim, o caso de João Câmara mostra que eles podem causar sérios danos ao país."