Topo

Josias de Souza

Governo trata sacos alheios como balões de festa

Colunista do UOL

06/03/2020 02h23

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

"Tenho a impressão de que sobretudo a Noruega está de saco cheio", declarou o embaixador da Alemanha no Brasil, Georg Witschel. Referia-se ao futuro do Fundo Amazônia, maior projeto de cooperação internacional já concebido para preservar a floresta amazônica. Em uma década, o fundo recebeu doações de R$ 3,4 bilhões. A Alemanha contribuiu. Mas o grosso (93%) veio da Noruega.

Sob Jair Bolsonaro, o governo passou a submeter o saco dos doadores internacionais ao mesmo teste que as crianças costumam aplicar aos balões nas festas infantis. Consiste em soprar balões para testar o ponto de ruptura. O segredo está em evitar o último hálito que leva à explosão do balão.

No caso do Fundo Amazônia, atuam como sopradores Bolsonaro e o ministro Ricardo Salles (Meio Ambiente). Incomodada, a Alemanha reteve no ano passado o envio de doação de R$ 150 milhões para o Brasil. Bolsonaro soprou: "Podem fazer bom uso dessa grana, o Brasil não precisa disso". A Noruega suspendeu repasse de R$ 133 milhões. Em novo sopro, o capitão ironizou o hábito dos noruegueses de caçar baleias.

Dias depois, em agosto de 2019, o ministro Ricardo Salles sinalizaria que falta método aos sopros do governo. Fez isso ao reconhecer, numa entrevista, que falta ao governo dinheiro e estrutura para realizar a fiscalização ambiental no país. Contou que o GEF, Grupo Especializado de Fiscalização, uma espécie de pelotão de elite do Ibama, dispõe de apenas 13 fiscais em todo país.

Georg Witschel, o embaixador alemão, reafirmou o óbvio: o descaso ambiental do Brasil pode comprometer o acordo comercial firmado entre Mercosul e a União Europeia. Bolsonaro já encarregou o vice-presidente Hamilton Mourão de coordenar reativação do Conselho da Amazônia.

Talvez devesse considerar a hipótese de substituir o ministro do Meio Ambiente por uma criança de cinco anos, dessas que adoram soprar balões em festas infantis. Ouvindo-a sempre que tivesse que tomar decisões sobre a Amazônia, o presidente conseguiria evitar que o balão estourasse na sua cara. A manifestação do embaixador alemão indica que é melhor não encher mais o saco.