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Leonardo Sakamoto

Ministro da Educação ensina a primeira lição: maquiar currículo funciona

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e Carlos Alberto Decotelli da Silva, novo ministro da Educação - Reprodução/Facebook
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e Carlos Alberto Decotelli da Silva, novo ministro da Educação Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

27/06/2020 08h05

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Ao público que foi assistir à sua posse, em Primeiro de Janeiro de 2019, Jair Bolsonaro louvou a meritocracia como caminho para melhores condições de vida dos brasileiros no mesmo trecho em que disse que "ao governo cabe ser honesto".

Ao apresentar Carlos Alberto Decotelli, nesta quinta (25), o presidente destacou que o novo ministro da Educação contava com doutorado pela Universidade Nacional de Rosário, na Argentina. Baseou-se em informação divulgada pelo próprio.

Foi desmentido nas redes sociais pelo reitor da instituição, Franco Bartolacci. O novo ministro concluiu as disciplinas, mas foi reprovado na qualificação da tese e nunca obteve o título. Considerando que ele conta com um "pós-doutorado" no currículo, teme-se como conseguiu fazer essa mágica

Nas redes sociais, seguidores do presidente prontamente correram para passar pano e bradar que isso era um detalhe irrelevante.

Vamos transpor isso para o cotidiano de milhões de brasileiros: se um candidato a uma vaga diz no currículo e na entrevista de emprego que é formado em tal curso, mas - na verdade - nunca entregou o trabalho de conclusão que lhe daria direito ao diploma mesmo tendo feito todas as disciplinas, mentiu sobre sua formação. Descoberto pelo contratante, dificilmente trabalhará na empresa.

Após a repercussão negativa, Decotelli mudou seu registro na plataforma Lattes, destinado a currículos acadêmicos, assumindo que não defendeu a tese.

Não foi o primeiro neste governo ou em outros. O ex-ministro da Educação Ricardo Vélez Rodríguez colocou livros que não eram seus no currículo Lattes. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não conta com mestrado em direito público pela Universidade de Yale, apesar do título ter sido atribuído a ele por "erro" de sua assessoria segundo o próprio. Luislinda Valois, ministra dos Direitos Humanos de Michel Temer, aparecia como "embaixadora da paz da ONU em 2012" - homenagem que, na verdade, foi concedida a ela pelo reverendo Moon. O currículo da ex-presidente Dilma Roussef aparecia como mestre em Economia pela Unicamp, apesar dela nunca ter defendido a dissertação. Todos os casos foram justamente criticados pelas incorreções.

No caso de Decotelli ainda houve uma tentativa extra de tentar desacreditar o reitor e a imprensa, com o MEC insistindo que ele tinha sim o diploma de doutor ao mostrar um certificado de conclusão de disciplinas ao invés de simplesmente reconhecer e pedir desculpas.

Tal qual o governador do Rio, Wilson Witzel, que havia colocado em seu currículo acadêmico que deu início, em 2015, um doutorado na Universidade Federal Fluminense com um período intercâmbio na Universidade de Harvard. Porém, segundo a instituição nos Estados Unidos ele nunca estudou lá. Descoberto, sustentou que Harvard era uma intenção que não se concretizou.

No que pese o esforço individual para produzir uma tese original e a consequente contribuição para o avanço do conhecimento humano, ter um doutorado não faz de alguém um ser humano melhor do que outro - há prepotentes egoístas que têm mais de um e iletrados que dariam a vida por seu semelhante. E não é condição essencial para ser um bom administrador público. Ou seja, Decotelli pode fazer gestão digna mesmo não tendo esse diploma.

Mas honestidade faz sim de alguém um ser humano melhor. E, nisso, o novo ministro começou devendo.