Leonardo Sakamoto

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Opinião

Trump usa queda de avião em guerra política, mas não abafa vexame dos EUA

Após o helicóptero do Exército, daqueles Black Hawks que aparecem em filmes de Hollywood, bater de frente com um avião da American Airlines, matar quase 70 pessoas e cair em chamas a poucos quilômetros a Casa Branca, o presidente Donald Trump disparou a apontar culpados. Tenta, dessa forma, usar o incidente em sua guerra ideológica, mas também afastar a imagem de vulnerabilidade e de incompetência dos Estados Unidos perante o mundo por conta do vexame.

Sem citar evidências, Trump culpou os programas de diversidade da Administração Federal de Aviação, que, segundo eles, autorizariam que pessoas com problemas mentais e psicológicos e baixa capacidade técnica atuassem como controladores de voo. Um despautério. Apontou que esses programas foram criados por Barack Obama e Joe Biden e que eles os combateu.

Aproveitou dessa forma uma tragédia para respaldar uma de suas bandeiras, o combate a políticas de diversidade apoiadas pelo governo. Faz o que já havia feito em sua primeira gestão, quando culpou migrantes por ataques que haviam sido cometidos por cidadãos norte-americanos.

Mas também usou a justificativa para produzir uma distração. A colisão transmite ao mundo um sinal de incompetência e de vulnerabilidade da maior superpotência do mundo e, portanto, do governo que a lidera. Pois um acidente desse porte em um aeroporto que serve a capital dos EUA passa ao mundo a imagem de um país mambembe.

A segurança aérea dos EUA volta, dessa forma, a ser colocada em dúvida, mesmo após os protocolos adotados com os atentados terroristas de 11 de setembro de 2001. "Ah, mas acidentes acontecem a todo momento e a toda hora." Sim, mas o que houve aqui foi um acidente de um helicóptero do Exército dos EUA, com uma aeronave de uma das mais importantes companhias aéreas do mundo, quase do lado do Pentágono, quando tudo deveria operar sob os maiores padrões de qualidade.

E se o governo de Washington não consegue controlar direito nem seu céu e seus militares e garantir segurança ao público que está em um voo regional comercial, como pode querer se vender como um país que vai "fazer a América grande de novo" - do inglês Maga (Make America Great Again, lema do novo presidente).

Independentemente do que apontar a investigação, a menos que ela conclua se tratar de um "ato terrorista", o acidente passa uma imagem de um país mais frágil do que ele quer se afirmar.

Claro que não dá para culpar Trump pelo que aconteceu. Mas a pressa dele em apontar culpados e instrumentalizar o caso precisa ser devidamente criticada. Porque o que acontece lá funciona como laboratório para outros grupos de extrema direita ao redor do mundo, inclusive aqui.

Em tempo: no dia da posse de Donald Trump, quando anunciou que iria incentivar a queima de petróleo em um mundo de mudança climática, ironizei que, muito em breve, ele culparia migrantes e pessoas trans pelo aquecimento global. Foi com previsível consternação, portanto, que o ouvimos culpar as políticas de diversidade por um acidente aéreo entre civis e militares.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL