Abertura de clube de pôquer em SP tem 'Exalta', cigano Igor e Elvis cover
Depois de colocar uma pulseira de papel dourado no meu braço, a recepcionista da festa inaugural do complexo Maxximus Arena, realizada na segunda-feira, 27, sugere alegremente: "Corre para pegar o show do 'Exalta'!" Como estou com uma lesão no menisco, prefiro não facilitar. Em vez disso, entro a esmo nos diversos ambientes do lugar, incluindo, claro, o Vegas, anunciado como "o maior clube de pôquer da América Latina".
Composto por dois salões de jogos, o clube ocupa uma área considerável dos 3.500 metros quadrados do complexo, que tem ainda restaurante e espaço de eventos. Ao todo, são 34 mesas com capacidade para dez jogadores. No salão abarrotado do andar superior, um dos observadores aponta para um anão na mesa do pôquer e ri alto: "HAHAHAHAHA. Se a polícia entra aqui e pega esse 'de menor' jogando, fecha essa merda! HAHAHAHA"
Gente fina é outra coisa
O convite para a inauguração do complexo prometia uma "noite épica" e vinha com a assinatura de um dos quatro sócios. "Ass: Regi Campos". Além da apresentação do 'Exalta', a festa contou com a presença VIP de cigano Igor, alter ego do ator Ricardo Macchi, e ainda com a performance de um cover de Elvis Presley, e um show burlesco.
Macchi posou para foto à saída do espaço de eventos Coliseum, enquanto a costureira Margareth Eloi fazia malabarismos atrás dele, na tentativa de também ser contemplada na imagem. "Meu marido é dono da maior concessionária Fiat do Brasil. Do Brasil, não! Do mundo! Você não quer falar com ele?"
Esporte da mente
Como estou próximo de Reginaldo "Regi" Campos, aproveito a piada do anão para perguntar se uma casa de pôquer corre risco real de ser fechada pela fiscalização. "De jeito nenhum. Funcionamos dentro da mais absoluta legalidade. O pôquer não é um jogo de azar, é um esporte da mente", explica ele.
Regi veste um terno xadrez em tons esmaecidos de verde e salmão, usa um mocassim bico fino de verniz preto, com uma fivela grande que atravessa o peito do pé, sem meia, e um relógio dourado.
Mind Game Association
Aparentemente, a ideia de "esporte da mente" — segundo a qual a vitória se conquista com estratégia, e não com sorte — serviu para salvar o pôquer da ilegalidade. O advogado Eduardo Tavares, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), lembra que, no Brasil, "a lei das contravenções penais (3.688/41) não tipifica o pôquer como um jogo de azar". "Entende-se que é um jogo intelectual, como o xadrez, ainda que decorra um lucro para quem ganha, e um prejuízo para quem perde", diz
Por sua vez, os entusiastas do pôquer comemoraram em 2010 o reconhecimento do jogo pela International Mind Game Association (IMGA), em um congresso anual da entidade, em Dubai. "Existem laudos nacionais e internacionais que mostram que o fator sorte, no pôquer, não define quem vai ganhar", diz o presidente do Instituto Jogo Legal (IJL), Magno José Santos de Sousa.
Trezentos mil
No Vegas, o esporte da mente pode render R$ 300 mil aos sortudos, perdão, felizardos ganhadores de um torneio que começou no dia da inauguração e teve, até terça-feira, 372 inscritos. O buy in (valor mínimo para participar de uma mesa) era R$ 100, que valiam 15 mil fichas.
Dos R$ 300 mil, R$ 100 mil iriam para o vencedor dos vencedores, que também ganharia uma viagem ao Casino Saint Monticello, no Chile. O resto do dinheiro seria distribuído entre os demais colocados.
Chega de jogo
Continuo meu périplo pelo complexo, cuja fachada tem um pé direito muito alto e é delineada por linhas de neón roxo. No alto, em letras garrafais, brilha o nome da casa, Maxximus, com dois "xx". Uma limusine parada à porta, aparentemente decorativa, faz lembrar um elefante tristonho, envergonhado por ser exposto mais uma vez como chamariz de VIP.
No espaço Coliseum, onde fiz a foto do cigano Igor, está o camarote da festa. Não é fácil entender o critério utilizado para selecionar quem entra no cercadinho, quem fica de fora. Dos dois lados havia desde torcedores de futebol vestindo o short e a camisa do clube, até mulheres de longo estilo "madrinha de casamento", passando por casais formados por playboys e saradinhas; e ainda pagodeiros de boné, regata e chinelo; moçonas turbinadas em trajes ventilados, e pançudos adornados com correntes grossas de metal e relógios chamativos, gênero "prendo e arrebento".
Doni e Van
Em determinado momento, um dos chineludos de boné, estimado 1,70m de altura, se aproxima de uma jovem cerca de um palmo mais alta que ele e a cumprimenta. "Eu sou o Doni. Você?"
Espremida em um vestido branco frente-única, sem calcinha à vista, a moça não se mostra muito receptiva. "...Van", diz apenas, enquanto quebra com os dentes metade de uma castanha remanescente, encontrada nas mesas cheias de restos de comida. Àquela altura, o "mix de folhas verdes com carpaccio", a "tábua de frios", o "escalope de mignon ao molho de estragon", a "batata rústica" e o "tiramissu" já estavam na poupança dos pagodeiros.
A passos lentos, Van dá uma caranguejada até a porta lateral, e então vê que vem chegando uma amiga menos sarada, que carrega nas mãos dois sanduichinhos contrabandeados da cozinha. Van apresenta a amiga a Doni. "Tati, Doni".
Tati também não se anima. Feliz com os sanduichinhos, ela morde um deles, opera um giro de cabeça e diz que vai tentar conseguir um refrigerante. Desaparece. Doni dá uma olhada em volta, aparentemente investigando se tem mais gata no pedaço. Ele verifica que até tem, mas "ficou só as zoada", diz.
Já passa da meia noite, hora de bater em retirada. Eu me despeço dos anfitriões e me encaminho para a porta. Ainda sorridente, apesar da hora, a recepcionista pergunta: "Conseguiu pegar o show do Exalta?"
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