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Reinaldo Azevedo

Aras tem de pedir inquérito à PF e, depois, de denunciar Bolsonaro ao STF

Augusto Aras: procurador-geral da República. Ele tem de pedir já abertura de inquérito à PF para apurar suposta fraude na eleição de 2018. Bolsonaro diz ter provas. Cadê? - Foto: Adriano Machado/Reuters
Augusto Aras: procurador-geral da República. Ele tem de pedir já abertura de inquérito à PF para apurar suposta fraude na eleição de 2018. Bolsonaro diz ter provas. Cadê? Imagem: Foto: Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

10/03/2020 07h34

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Augusto Aras, procurador-geral da República e procurador-geral eleitoral, está obrigado a pedir à PF que abra um inquérito para apurar a denúncia feita por Jair Bolsonaro, segundo quem houve fraude na eleição de 2018, e ele estaria de posse das provas.

Ocorre que o presidente está contando uma mentira. E prova, pois, ele não tem. É claro que cabe uma denúncia por crime de responsabilidade, com base da Lei 1.079, a do impeachment. Qualquer um do povo pode fazê-lo. O primeiro juízo de admissibilidade é do presidente da Câmara. Hoje, a coisa não prosperaria na Câmara, ainda que Maia a admitisse. Como já expliquei aqui, para que chegasse ao Senado, teria de contar com o apoio de dois terços dos deputados. Por enquanto, não há esse número. Mas Bolsonaro faz um esforço danado para chegar lá.

Só para deixar claro: o presidente comete crime de responsabilidade quando denuncia uma fraude eleitoral que não houve e quando faz chantagem aberta com os respectivos presidentes da Câmara e do Senado: "Ou fazem o que eu quero, ou jogo as ruas contra vocês e o Parlamento".

Veremos se temos, de fato, um procurador-geral que honra o cargo se, depois de o inquérito da PF não chegar a lugar nenhum e de ficar claro que Bolsonaro conta uma mentira quando diz dispor das provas, Aras terá a clareza e o discernimento de apresentar ao Supremo uma denúncia contra o presidente da República por crime comum.

E, claro, estamos muito além do Artigo 340 do Código Penal, que prevê pena de seis meses a um ano para quem "provocar a ação de autoridade, comunicando-lhe a ocorrência de crime ou de contravenção que sabe não se ter verificado".

Na esfera penal comum, o presidente da República, meus queridos, tem de ser denunciado com base nos Artigos 16, 17, 18, 22 e 23 da Lei da Segurança Nacional. Eu os resumo no que interessa ao caso.
16: associar-se com quem tenta mudar o estado de direito mediante ameaça;
17: tentar mudar o estado de direito mediante grave ameaça;
18: recorrer à ameaça para constranger outros Poderes;
22: fazer em público propaganda de processos violentos para mudar a ordem social;
23: incitar a subversão da ordem política e social e a animosidade entre as Forças Armadas e as instituições.

Bolsonaro, reitere-se, cometeu esses crimes nos dois casos: quando denuncia uma fraude que não existiu e quando faz chantagem com os respectivos presidentes da Câmara e do Senado.

Sim, também no caso do crime comum, a Câmara é quem toma a decisão relevante. Caso o Supremo considere que há motivos para processar o presidente, a autorização precisa ser dada por dois terços dos deputados. O crime de responsabilidade é julgado pelo Senado; o crime comum, pelo Supremo.

Esclarecimento: o Artigo 86 da Constituição define no Parágrafo 4º:
"§4º O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções".

Logo, cabe a pergunta: Aras pode denunciar Bolsonaro por crime comum, tendo sido cometido tal crime na vigência de seu mandato? A resposta: sim! Porque tais crimes NÃO SÃO ESTRANHOS AO EXERCÍCIO DE SUAS FUNÇÕES.