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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Bolsonaro dá nova data, defende golpistas e fala de droga contra impotência

O, por assim dizer, beijo entre Michelle e Bolsonaro e as duas drogas mais famosas contra impotência - Reprodução
O, por assim dizer, beijo entre Michelle e Bolsonaro e as duas drogas mais famosas contra impotência Imagem: Reprodução

Colunista do UOL

15/03/2023 05h05

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O ex-presidente Jair Bolsonaro participou de um evento com apoiadores brasileiros em Orlando nesta terça, ocasião em que se reencontrou com a mulher, Michelle, que tinha acabado de desembarcar nos EUA. Anunciou que pretende voltar ao Brasil no dia 29, mas não deu certeza:

"Eu sempre marco uma data pra voltar. A data agora marcada é dia 29 desse mês. Quando falta uma semana, a gente estuda a situação, como é que tá o Brasil, como estão os contatos aqui..." Vai voltar? Conviria, entre outras coisas, informar-se sobre o depoimento à PF de Bento Albuquerque, o seu ministro das Minas e Energia que liderava a comitiva das joias ilegais. Volto ao ponto mais tarde.

Ninguém sabe o que significam "estudar a situação do Brasil" e "os contatos aqui", elementos que interfeririam na sua decisão. Pouco antes de reencontrar a mulher, resolveu fazer um de seus gracejos de cunho sexual, depois de provocado pelo interlocutor, que, com sorrisinho maroto, deu a entender que o casal gostaria de ficar a sós. Bolsonaro embarcou no chiste:
"Já tiraram um sarro de mim hoje lá... Já estou aditivado. Numa reunião lá, eu falei: 'Olha, a minha filha Laura, ela foi sem aditivo. Ela [Michelle] vai ficar aqui quatro ou cinco dias".

Isso foi dito entre gargalhadas, também dos presentes, que devem achar a fala muito humana e espirituosa. A gente custa a crer que esteja acontecendo assim mesmo; que um ex-presidente e candidato — ao menos na sua cabeça — a liderar a oposição ao governo Lula resolva dividir com a sua audiência o fato de tomar remédio contra a impotência. Ainda não inventaram aditivo que corrija a brochada ética. Ou inventaram. Chama vergonha na cara. Mas não se compra na farmácia.

DESESTIMULANDO MICHELLE
No evento, Bolsonaro se dedicou a duas coisas: a mandar recados para seus fanáticos daqui e a desestimular o PL a testar o nome de Michelle para aventuras maiores do que uma candidatura à Câmara ou ao Senado. Aquele que anunciou já ter tomado o comprimido contra impotência para receber a mulher -- há um abismo depois do fundo do poço a que essa gente levou o país -- se encarregou, ele próprio de anunciar o destino político do alvo do aditivo farmacêutico: "Não é candidata para o Executivo (...). Ela pode realmente aí, disputar um cargo eletivo". Deixou claro depois que se referia a uma vaga no Legislativo.

E Michelle? Ah, ela também falou:
"É difícil, né? A gente ficou bastante tempo separado. Laurinha tá sentido falta. Nossa vida mudou. Mas eu tenho o controle de todas as coisas sempre, né? Então a gente fica feliz de saber que ele está bem acolhido, bem cuidado, com o carinho de todos vocês, dessa comunidade maravilhosa, brasileira, aqui nos Estados Unidos".

Esse "tenho o controle" pode até levar a especulações sobe uma Michelle rebelde. Tolice. Mas que diabos ela foi fazer lá que não possa fazer daqui? Não deve ter sido para estimular o consumo de aditivos. O casal vai ter de se entender sobre as joias, não é?, o que remete de novo a Albuquerque, que ainda volta a este texto.

GOLPISMO, HERBÍVOROS E CARNÍVOROS
O ex-presidente voltou a defender as pessoas que foram presas no ataque golpista às respectivas sedes dos Três Poderes no dia 8 de janeiro, quando se empregaram, então, métodos terroristas. Segundo disse, elas não cometeram os crimes de que são acusadas e tudo faria parte de um complô:
"O objetivo, no meu entender, disso tudo, é tentar sepultar a direita que mal nasceu".

Como se nota, segundo o biltre homiziado de Orlando, os que enfrentaram e derrotaram os golpistas é que têm objetivos escusos, não aqueles que promoveram, financiaram e praticaram os atos criminosos.

Onde está a maior dificuldade para Bolsonaro voltar ao Brasil? Enquanto ele fica por lá, seus fanáticos aqui ficam sempre à espera do retorno de seu salvador e guia. Fala uma coisinha aqui, outra ali, mas não corre riscos adicionais. Já há processos o bastante para torná-lo inelegível e para mandá-lo para a cadeia se condenado na esfera penal.

Inexiste, vamos dizer, bolsonarismo vegetariano. Não obstante serem conhecidos por "gado" nas redes sociais, seus seguidores podem ser herbívoros no pensamento, mas são bastante carnívoros na ação. Se não for para ter um Bolsonaro com discurso sanguinolento, disruptivo e de confronto, então Bolsonaro para quê?

É quase certo que a Justiça Eleitoral decida a sua inelegibilidade. E a cana? Eis o busílis: ele pode ser preso depois de condenado, com sentença transitada em julgado, o que demora um tanto, e pode ir imediatamente para a cadeia no caso de decretação de uma prisão preventiva. E essa segunda hipótese, para quem tem um 8 de Janeiro nas costas, depende exclusivamente dele. Uma coisa é certa: não se vai tolerar a um indivíduo comum os discursos que fazia o presidente. Pergunto: existe Bolsonaro sem golpismo?

AGORA BENTO ALBUQUERQUE
E há o escândalo das joias. No depoimento dado à Polícia Federal nesta terça, Albuquerque se encalacrou um tanto. Disse pensar que as duas caixas com joias eram presentes ao Estado brasileiro. Aliás, em carta ao governo da Arábia Saudita, datada de 22 de novembro de 2021, o militar da reserva afirmou que tinham sido incorporadas ao acervo público, o que é mentira.

O ex-ministro, claro!, se enrolou: afinal, se era esse o seu juízo, por que não requisitou o formulário apropriado para declarar os presentes? Mais: como explicar que sua comitiva tentou esconder as joias da Receita? Encontradas as femininas, por que ele não declarou as masculinas, de que tinha pleno conhecimento?

Para Bolsonaro, o que há de relevante no depoimento de Albuquerque é justamente a afirmação de que, no que era de seu conhecimento, os presentes eram mesmo encaminhados ao governo brasileiro. O então ministro, é evidente, não agiu como se fossem, mas isso força Bolsonaro a dar a sua própria versão: por que atuou para ficar com os presentes que entraram ilegalmente no Brasil?

ENCERRO
Bolsonaro pode voltar se quiser. Mas não tem mais como ser o atirador que ficou disparando boçalidades na Câmara por quase 30 anos e por mais quatro na Presidência. Ele é um investigado por crimes comuns sem nenhuma imunidade. Se voltar a ameaçar a ordem pública, terá a preventiva decretada. E ainda chegará a condenação, com trânsito em julgado. E seu endereço passará a ser a Papuda. Em caso de visita íntima, permite-se o uso de aditivo.