Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Mercado: Haddad, otimismo e avaliação do governo disparam; e reaças na área
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A Genial/Quaest divulgou uma pesquisa com um resultado espetacular em vários aspectos. Os tais "Mercáduz", estes que vivo zoando aqui, sabem fazer juízo de valor com o bolso — e não devem ser desprezados, claro! —, mas as lentes da moral e da ideologia estão completamente embaçadas. O levantamento entrevistou 94 representantes de fundos de investimento com sede em São Paulo e no Rio. É o terceiro da série. Os outros dois foram realizados em março e maio, respectivamente. O humor em relação à política econômica, ao ministro Fernando Haddad, ao futuro da economia mudou radicalmente. Mas os valentes continuam a desconfiar de Lula. Que nome isso tem? Preconceito odiento. Mas vamos antes às reviravoltas espetaculares.
GOVERNO E HADDAD
Em maio, 86% tinham avaliação negativa do governo; agora, 44%. A positiva saltou de 2% para 20%, e a regular, de 12% para 36%. A mudança em relação a Haddad, ministro da Fazenda, é espetacular: o juízo positivo saltou de 26% para 65%, e o negativo, de 37% para 11%; o médio caiu de 37% para 24%.
POLÍTICA ECONÔMICA
Caíram de 90% para 53% os que acham que a política econômica está errada; os que a veem como certa subiram a serra: de 10% para 47%. Sabem quantos acham que a economia vai melhorar nos próximos 12 meses? 53% -- eram apenas 13% em maio. Dizem que vai piorar 21%, uma queda de 40 pontos (61%) em relação ao levantamento anterior. Seguem em 26% os que não esperam mudanças.
Se eu tivesse dinheiro para botar na mão dessa gente, ficaria um tanto apreensivo, claro. Vejam os números acima. Não obstante, ainda são 66% os que dizem que o governo não está preocupado com a inflação. É mesmo? Convenham: há um certo raciocínio, como direi?, dissociativo nessa avaliação, Subiram de 20% para 34% os que entendem haver, sim, preocupação com os preços.
Bem, dá para intuir quem são os valentes. Muitos devem opinar no boletim Focus. Na pesquisa, não têm nome, mas certamente estão entre as fontes de uma nota só ouvidas pelo jornalismo econômico. E isso explica que 94% considerem correta a decisão de manter a meta de inflação — foi um erro apenas para 6%. Aprovaram a mudança do sistema de metas, que deixará de considerar o ano-calendário, 81%. Só 19% discordam.
CAUSAS DA MELHORA
Neste ponto, voltaria a ficar com medo de deixar meu dinheiro nas mãos deles se o tivesse. Para 32%, a "melhora no preço dos ativos" decorre de "movimentos dos mercados internacionais". É falso como nota de R$ 3. Outros 23% atribuem ao fortalecimento de Haddad. E só 20% veem o essencial: a atuação do Congresso -- com o novo arcabouço e encaminhamento da reforma tributária. O item "medidas do governo" mereceu apenas 3% das menções. É um juízo fraudulento -- com todas as vênias. E há os fanáticos da seita do banco-centralismo: são 20% a tal melhora ao Banco Central. Sei lá quem são, mas cuidado! Poderiam levá-los, leitores, à falência...
E PARA MELHORAR MAIS?
E o que impede de melhorar ainda mais? "Uzmercáduz" sabem reconhecer a mudança da realidade fática, mas ainda continuam apegados a dogmas. Para 45%, falta uma política fiscal que funcione -- para isso, diga-se, o governo Lula levou adiante a proposta do arcabouço. Sobra um pouco para o povo: veem "a baixa escolaridade e produtividade da população" como responsável 21%. O ódio à política ainda é influente:19% apontam "os interesses eleitorais". Só 11% concordam comigo: a alta taxa de juros.
Ah, o culto banco-centralista é um sucesso com essa moçada. Como culpá-la? Com juros nos cornos da Lua, a chance de levar o cliente a perder dinheiro é baixa. Quase não é preciso trabalhar ou correr riscos. Nada menos de 87% acreditam que o Banco Central fez bem em manter as escorchantes e pornográficas taxas de juros. Dizem que foi uma decisão errada 13%. Bem, 100% acreditam que ela vai cair ainda neste ano. Imaginem se não...E 92% acham que será na próxima reunião, em agosto. 56% anteveem queda será de 0,25; para 32%, será de 0,5 ponto.
Roberto Campos Neto é quase Deus. Dizem que sua atuação à frente do BC é positiva 86%. Meros 7% concordam com este escriba e dizem ser negativa "Você não lida com dinheiro, Reinaldo!" Verdade. Se lidasse, também não o entregaria a esses caras. Falta-lhes um pensamento organizado — com todas as vênias. Dizem estar "muito preocupados" com a indicação que Lula fará para a presidência do BC 71%, contra 27% que estão pouco preocupados.
REFORMA TRIBUTÁRIA
Para 66%, a reforma tributária vai aumentar o bem-estar da população; dizem o contrário 34%. Avaliam que ela diminuirá a guerra fiscal entre Estados 77%; que haverá impacto positivo na indústria 71%, e 52% creem num aumento do emprego. Compraram a tese dos inimigos da reforma 55%, que esperam impacto negativo para o comércio e os serviços. Estou certo de que ninguém conseguiria explicar por quê.
PETROBRAS
Os olhos embotados pela nuvem ideológica se revelam nas questões sobre a Petrobras. Classificam a nova política de preços como negativa 63%; só 6% dizem ser positiva. É uma aberração. Até porque a mudança não foi assim tão grande ainda. Para 97%, há influência política no preço dos combustíveis. Ai, ai... No governo Bolsonaro, vigorou a tal Paridade de Preço de Importação. E aí o Biltre teve de zerar impostos federais e enfiar a mão no caixa dos Estados para garantir a chegada até o primeiro turno.
O BRASIL NO MUNDO E INVESTIMENTOS
Desde que Lula tomou posse, dizem que a imagem no Brasil melhorou junto aos investidores estrangeiros 51%; só 20% sustentam ter piorado, o que é um delírio. Junto à opinião pública mundo afora, 46% apontam melhora, contra 34% que pensam o contrário. Disparou de 26% para 54% o que afirmam que haverá um aumento de investimentos estrangeiros no país. Caiu de 23% para 7% os que acham que vão diminuir. Para 39%, ficará na mesma -- eram, 51%.
POLÍTICA
Oscilou de 55% para 57% os que não veem chance para um candidato em 2026 que não seja ligado nem a Lula nem a Bolsonaro. Para 43%, isso é possível (antes, 45%). Sem Bolsonaro, saltaram de 66% para 77% os que apontam Tarcísio de Freitas (Republicanos), governador de São Paulo, como o nome a substituí-lo nesse campo ideológico. Caíram de 25% para 19% os que apostam no governador de Minas, Romeu Zema (Novo).
ESPERANÇA NO FUNDO DA CAIXA
Então vamos ver. O juízo positivo sobre Haddad saltou, nesse público, de 26% para 65%; 47% já acham que a política econômica está no rumo certo; para 53%, a economia vai melhorar nos próximos 12 meses; 51% dizem que a imagem do Brasil junto a investidores estrangeiros melhorou; 54% esperam aumento de investimentos vindos de fora. Esse é o governo do arcabouço fiscal e da reforma tributária.
E, no entanto, 95% dos valentes do mercado financeiro entrevistados pela Quaest dizem confiar pouco ou nada em Lula. É bem verdade que a desconfiança em Bolsonaro também é grande: 82%. Em Geraldo Alckmin, é de 76%. Em Haddad, depois de tudo, é de 40%. Sabem quem está no azul no quesito "confiança"? Romeu Zema, com 50%; Tarcísio de Freitas fica com 55%, e Roberto Campos Neto, com 72%.
Ainda bem que "Uzmercáduz" não elegem ninguém sozinhos, embora sejam peças importantes na estabilização de governos. Digam-me cá: além de ter engrolado alguns reacionarismos asquerosos, o que fez Zema para que apenas 15% não confiem nele? Dá para comprar a sua obra, já em segundo mandato, à de Lula?
Sabem qual é a síntese? "Uzmercáduz" acham que Lula está, sim, fazendo um bom governo — daí os 65% de juízos positivos sobre o desempenho de Haddad, a mudança de ânimo em relação à economia e a expectativa positiva sobre investimentos estrangeiro, mas lhes falta saber fazer o "O" com o copo, como se diz na minha terra, em matéria de política.
Talvez essa gente saiba mesmo cuidar de dinheiro, leitor. Mas se vê que, por ora, que segue cuidando mal do Brasil. A melhora evidente das perspectivas econômicas, inclusive as de longo prazo, se deve à eleição de Lula e à forma como este vem exercendo o mandato. Mas o preconceito, por natureza, costuma tomar o lugar da realidade.
ENCERRO
De todo modo, a vitória do governo é evidente. Afinal, há quatro meses, só 10% viam Haddad no caminho certo -- agora, 65%, e só 2% diziam que a política econômica estava correta; hoje, 47%. Alimento, assim, a esperança, ainda que reste no fundo da caixa, de que até "Uzmércáduz" aprendam alguma coisa.