Vídeo engana ao sugerir que Moraes admitiu fraude nas eleições
Projeto Comprova
23/11/2023 15h22
Trechos de um diálogo entre ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) durante sessão na Corte são usados de forma enganosa para sugerir que Alexandre de Moraes, presidente da corte e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), admitiu fraude nas eleições. Na sessão, Moraes e o ministro Raul Araújo Filho debatiam uma ação de fraude à cota de gênero, na eleição de 2020, informação omitida nas peças de desinformação.
Conteúdo investigado: Vídeo com trecho de diálogo entre os ministros do Tribunal Superior Eleitoral Alexandre de Moraes e Raul Araújo Filho, durante um julgamento na Corte. O conteúdo traz uma frase em que Moraes cita entender "que houve fraude". Neste momento, uma locução sobrepõe a fala de Moraes: "ele assume que teve fraude". O vídeo contém ainda as seguintes frases: "Olha aí a casa 'caído'. Julgamento no caso das eleições", dando a entender que Alexandre de Moraes estivesse fazendo alusão a uma suposta fraude nas urnas eletrônicas.
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Onde foi publicado: Telegram e Kwai.
Conclusão do Comprova: Vídeos que circulam nas redes sociais enganam ao afirmar que o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Alexandre de Moraes, admitiu fraude nas urnas eletrônicas ou no processo eleitoral brasileiro. Para fazer tal associação, as postagens usam trechos de um diálogo entre Moraes e o também ministro do TSE Raul Araújo Filho durante julgamento na Corte, no dia 23 de maio de 2023. No conteúdo usado na peça de desinformação, Moraes afirma "eu entendo que houve fraude". Apesar de não mencionar a qual pleito o ministro se referia, alguns internautas interpretaram como se a frase fosse relativa às eleições presidenciais de 2022, como mostram os comentários (1, 2, 3 e 4).
A sessão, no entanto, não tem qualquer relação com urnas eletrônicas ou com a contabilização de votos. Na ocasião, os ministros debatiam uma ação de fraude à cota de gênero praticada pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) nas eleições para vereador do município de Roteiro, em Alagoas, em 2020. O julgamento foi concluído no dia 23 de maio de 2023 e o trecho em questão pode ser conferido no YouTube da Justiça Eleitoral.
Na sessão, por maioria dos votos (4 a 3), o plenário do TSE confirmou a ocorrência de fraude, reformando decisão do Tribunal Regional Eleitoral de Alagoas (TRE-AL).
Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 23 de novembro, o conteúdo acumulava mais de 3,4 mil curtidas no Kwai, além de 1,9 mil compartilhamentos. No Telegram, são mais de 3,9 mil visualizações.
Como verificamos: O primeiro passo da verificação foi uma busca no Google pelos termos "Moraes admite fraude", que retornou uma série de checagens sobre o mesmo vídeo (Terra, Estadão Verifica, Uol Confere, Aos Fatos, Reuters e Lupa), além de uma matéria da Justiça Eleitoral, onde é possível encontrar o link do julgamento relativo ao caso citado no conteúdo investigado.
O Comprova enviou uma mensagem via Kwai para um dos responsáveis pelas publicações. Ainda buscamos formas de contatar o canal do Telegram que publicou o conteúdo, mas o perfil não disponibiliza qualquer informação nesse sentido.
Entenda o caso
O diretório municipal do partido Progressistas (PP) ajuizou Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) e de Impugnação de Mandato Eletivo (Aime), apontando fraude no Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (Drap) do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) para o cargo de vereador da cidade alagoana de Roteiro.
Segundo o TSE, duas "candidatas fictícias" - Maria Ramos e Valdelice Lucas - foram registradas para cumprimento da cota feminina. As provas de que essas candidaturas não eram reais foram as seguintes: ausência ou mínima movimentação financeira; inexistência de campanha ou feita de forma simbólica; pouca ou nenhuma votação; e realização de campanha para outro candidato do mesmo partido. Os processos relacionados são: ARespe 0600004-36.2021.6.02.0018 e ARespe 0600869-93.2020.6.02.0018, que podem ser consultados no site do TSE.
Decisão do TSE
Em 11 de abril, o plenário do TSE iniciou o julgamento do caso, que foi concluído em 23 de maio com a confirmação de fraude à cota de gênero por quatro votos a três.
A maioria do colegiado seguiu o voto do relator, ministro Benedito Gonçalves, que apontou a nulidade dos votos recebidos pelo PTB na cidade.
Gonçalves amparou seu voto em um caso semelhante ocorrido em Jacobina, na Bahia. Neste julgamento ocorrido em maio de 2022, o TSE havia definido critérios para a identificação da fraude à cota de gênero, tais como: votação zerada ou pífia das candidatas; a prestação de contas com idêntica movimentação financeira; e a ausência de atos efetivos de campanha.
Sobre as candidaturas em Roteiro, o relator detalhou em seu voto a situação de cada uma das candidaturas analisadas. No caso de Maria Ramos, o magistrado disse que o fato de ela ter recebido apenas três votos, não ter tido movimentação financeira, tampouco atos de campanha durante o pleito não comprovam, isoladamente, a intenção de burlar a cota. Ele apontou, inclusive, a desistência da candidata, segundo ela, em razão do estado de saúde do esposo.
Já com relação à Valdelice Lucas, o magistrado apontou o fato de ela ter recebido dois votos, não ter votado em si mesma, além de ter apoiado outro candidato a vereador que também concorria pelo PTB. Neste caso, foi declarada a inelegibilidade da candidata por oito anos.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o perfil do Kwai que publicou o conteúdo, mas não obteve resposta até a publicação desta verificação. O canal no Telegram não permite o envio de mensagens aos seus administradores, nem disponibiliza qualquer contato dos responsáveis.
O que podemos aprender com esta verificação: O resultado das eleições no Brasil e a segurança das urnas eletrônicas são alvo constante de desinformação nas redes sociais. É comum o uso de linguagem em tom alarmante como se estivesse diante de uma denúncia grave. Além disso, os desinformadores costumam usar fatos verdadeiros fora de contexto para imprimir veracidade ao conteúdo. Ao se deparar com publicações desse tipo, sobretudo quando se trata de eleições, é importante procurar os canais do TSE, órgãos oficiais e veículos de imprensa de sua confiança.
Desconfie também de postagens que usam recortes e trechos curtos de vídeos, sem o devido contexto, para apoiar afirmações contundentes, sensacionalistas ou que se propõem a denunciar algo que vá causar uma reação imediata de indignação nas pessoas.
Por que investigamos: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.
Outras checagens sobre o tema: Este mesmo conteúdo já foi desmentido por diversos sites e agências de checagem como Terra, Estadão, UOL Confere, Aos Fatos, Reuters e Lupa. O TSE também apontou que o vídeo circulou de forma descontextualizada. Sobre as urnas eletrônicas, o Comprova mostrou, recentemente, que terminal do mesário não mostra votos de eleitores, que abertura do código-fonte das urnas é padrão e não tem relação com escolha de conselheiros tutelares e que não há dispositivo nas urnas capaz de alterar votação.
Este conteúdo foi investigado por Norte de Notícias, CBN Cuiabá e Metrópoles. A investigação foi verificada por O Povo, Folha de S. Paulo, Correio Braziliense e O Estado de S. Paulo. A checagem foi publicada no site do Projeto Comprova em 23 de novembro de 2023.
O Comprova é um projeto integrado por 40 veículos de imprensa brasileiros que descobre, investiga e explica informações suspeitas sobre políticas públicas, eleições presidenciais e a pandemia de covid-19 compartilhadas nas redes sociais ou por aplicativos de mensagens. Envie sua sugestão de verificação pelo WhatsApp no número 11 97045 4984.