Post distorce reportagem sobre urnas dos EUA; sistema do Brasil é diferente
Hygino Vasconcellos
Colaboração para o UOL, em Balneário Camboriú (SC)
22/11/2024 14h37
Uma reportagem antiga tem sido distorcida para sugerir que o sistema de votação brasileira não é seguro.
A notícia apresentada no post desinformativo, de 2019, aborda uma decisão da Election Systems and Software de vender nos Estados Unidos apenas urnas eletrônicas com comprovante de votação em papel. A empresa, contudo, nunca prestou serviço à Justiça Eleitoral do Brasil.
O UOL Confere considera distorcido conteúdos que usam informações verdadeiras em contexto diferente do original, alterando seu significado de modo a enganar e confundir quem os recebe.
O que diz o post
A publicação desinformativa traz um vídeo que apresenta as seguintes frases sobrepostas: "BOLSONARO TINHA RAZÃO" e "E AGORA TSE?". No canto inferior direito, há o gif de uma mulher. Ela abaixa a cabeça e cobre os olhos com uma das mãos, sugerindo vergonha.
O vídeo apresenta o trecho de uma reportagem. Inicialmente, a apresentadora diz: "A fabricante de urnas eletrônicas dos Estados Unidos anunciou que mudou de opinião sobre a segurança eleitoral. Agora, a empresa pede que o governo torne obrigatório que todas as máquinas emitam comprovante de voto em papel. Veja na reportagem de Luciana Camargo".
Na sequência, são mostradas imagens de urnas eletrônicas. "A Election Systems and Software disse que não venderá mais equipamentos que não emitam o voto em papel. Até então, a empresa era defensora das urnas eletrônicas sem registro físico como as do Brasil. Em comunicado, o presidente da companhia Tom Burt disse que os comprovantes de papel evitam erros e adulterações por hackers. Em recente apresentação, o professor de ciência da computação da Universidade de Michigan J. Alex Halderman mostrou como é fácil alterar o resultado de uma eleição. Numa urna eletrônica que não emite separadamente o comprovante de cada voto em papel, três voluntários votaram em um único candidato, mas na hora de imprimir o relatório final como resultado, o opositor ganhou por 2 votos a 1. Isso aconteceu porque antes da votação o cartão de memória da máquina havia sido infectado com software de roubo de votos", diz a repórter Luciana Camargo.
Logo após, o vídeo mostra o jornalista Boris Casoy, que diz: "Aqui no Brasil, o TSE precisa implantar essa cópia em papel. A todo momento a gente vê computadores tidos como os mais seguros do mundo invadidos por hackers"
Por que é distorcido
Vídeo é de 2019. Uma busca reversa de imagens não leva diretamente ao vídeo original (aqui), mas confirma que o trecho é de um programa da RedeTV apresentado pela jornalista Amanda Klein. Uma segunda busca - agora no Google (aqui) - leva ao vídeo original (aqui).
Election Systems & Software nunca foi contratada pelo TSE. Empresa citada no vídeo não é a fabricante de nenhuma das urnas eletrônicas utilizadas no Brasil desde 1996 (aqui). As duas últimas versões - a UE2022 e a UE2020 - foram fabricadas pela Positivo Tecnologia e seguem em uso no país. As outras duas versões ainda em uso - a UE2015 e a UE2013 - são da Diebold. O TSE (Tribunal Superior Eleitoral) disse em nota, em 2022, que o vídeo "está completamente fora de contexto" e que a empresa citada "não fornece urnas para o Brasil" (aqui).
Sistemas de votação do Brasil e dos EUA são diferentes. O Tribunal salientou ainda que que não é possível comparar o sistema norte-americano com o brasileiro, uma vez que os dois operam de formas distintas. "No Brasil, os programas utilizados na urna eletrônica nacional são assinados digitalmente e lacrados em uma cerimônia pública. A assinatura digital é uma tecnologia que impede a adulteração dos programas e também serve de barreira para evitar que o equipamento seja infectado por softwares maliciosos. Uma invasão hacker também é uma hipótese improvável, pois a urna brasileira é um dispositivo isolado, sem conexão com a internet", disse o TSE.
Impressão violaria o sigilo do voto. Em setembro de 2020, o STF declarou inconstitucional a impressão do voto por colocar em risco o sigilo e a liberdade do voto. "Para ligar uma impressora à urna, segundo o relator do tema, ministro Gilmar Mendes, que já presidiu o TSE, seria necessário que esta fosse à prova de intervenções humanas. Caso contrário, em vez de aumentar a segurança, seria instrumento de fraudes e violação do sigilo do voto. Ele também ressaltou os riscos de manipulação das impressões, como acréscimos, cancelamentos ou registros de votos-fantasmas", destacou o TSE. No Brasil, já foram feitos testes para implantação de módulo impressor de votos - a primeira vez que isso ocorreu foi nas eleições de 2002. Porém, o sistema foi considerado de "alto custo de instalação" e apresentou "diversos erros", segundo o TSE.
Este conteúdo também foi checado por AFP (aqui) e Lupa (aqui).
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