Rubens Paiva não usou fazenda do pai para abrigar guerrilha de Lamarca
Rubens Paiva não utilizou a fazenda de seu pai, localizada na cidade de Eldorado (SP), para acolher o grupo de guerrilha liderado por Carlos Lamarca, ao contrário do que afirmam posts compartilhados nas redes sociais.
A base da guerrilha ficava em Capelinha, uma área de mata fechada no município de Jacupiranga (SP), como apontam documentos do Exército.
O que diz o post
A publicação reproduz um texto supostamente escrito pelo filho de um fazendeiro que havia adquirido uma propriedade no Vale do Ribeira: "Lembro que quem mandava e desmandava lá era o "coronel" Jaime Paiva, proprietário da maior fazenda de Eldorado Paulista. (...) A fazenda era imensa e serviu, a todo visto, como base guerrilheira para Carlos Lamarca, desertor do Exército brasileiro e autor do assalto ao arsenal da Arma, municiando de fuzis a guerrilha no Ribeira, com o apoio de Rubens Paiva, que rompera com o pai, por questões ideológicas".
Por que é falso
Guerrilha chefiada por Lamarca se baseou em Jacupiranga, a 25km de Eldorado. Documentos oficiais do Exército detalham uma operação - chamada de "Registro" - realizada entre abril e junho de 1970 contra o grupo guerrilheiro (aqui e abaixo) na região de Capelinha, em Jacupiranga. No relatório consta que os militares, "informados de que na Região de Capelinha (Município de Jacupiranga) e adjacências existiam bases de Treinamento de Guerrilha Rural, organizaram uma operação de informações com o objetivo de destruir as instalações e capturar os terroristas que ali se encontravam". O documento afirma que "os terroristas haviam comprado duas glebas, sendo uma ao sul e outra ao norte da BR 116, esta última na altura do km 249, região denominada Capelinha, devido ao arroio do mesmo nome".
Relatório não cita fazenda do pai de Rubens Paiva. O documento de 56 páginas não menciona em momento algum a fazenda Caraitá, pertencente a Jaime Paiva. O relatório descreve apenas um episódio envolvendo a cidade de Eldorado, mas em uma praça local - portanto, distante da propriedade da família Paiva. "No dia 8 de maio, às 19h30, foi recebida uma informação de que sete terroristas haviam passado por Eldorado e, na praça local, trocados tiros com os seis policiais (...), ferindo três deles e prosseguindo em fuga na direção de Eldorado-Sete Barras, utilizando um caminhão civil".
Operação no Vale do Ribeira prendeu quatro guerrilheiros. O documento ainda registra que o grupo seguiu em direção à cidade de São Paulo. Os militares prenderam quatro pessoas. Lamarca conseguiu escapar.
Texto enganoso utiliza argumentos usados por Jair Bolsonaro. O ex-presidente passou parte de sua adolescência em Eldorado e disse repetidas vezes que ajudou os militares a procurarem Lamarca na mata da região (aqui) - história desmentida por Darcy Rodrigues, um dos companheiros do guerrilheiro (aqui). Levantamento da BBC Brasil mostra que Bolsonaro citou o nome de Lamarca em pelo menos 33 discursos no plenário da Câmara dos Deputados entre 1995 e 2018 (aqui). Um deles foi este, feito em março de 2012: "Que Fazenda Caraitá é essa? Pertencia à família Paiva. Um dos donos: Rubens Paiva. E o Rubens Paiva, então, foi quem indicou aquela região para o Lamarca, assim como no passado indicaram a região do Araguaia. Então, o Lamarca usava aquela região, indicada por Rubens Paiva, e bancado, financeiramente, por Rubens Paiva". (aqui)
História de Rubens Paiva é retratada no filme 'Ainda Estou Aqui'. O longa é baseado no livro homônimo, de Marcelo Rubens Paiva, e trata dos horrores da ditadura militar no Brasil (aqui). Fernanda Torres, que interpreta Eunice Paiva, ganhou o Globo de Ouro como melhor atriz de drama (aqui). O filme foi indicado ao Bafta, considerado como o "Oscar britânico", na categoria de "Melhor filme em língua estrangeira (aqui). O sucesso da produção motivou perfis de direita nas redes sociais a pregarem o boicote à película (aqui).
Este conteúdo também foi checado pelo Estadão.
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