Abandonado, Pelourinho (BA) vê comércio local em crise e fuga de turistas
Nos últimos 40 dias, dois relevantes centros de varejo encerraram suas atividades no centro histórico de Salvador. O que poderia ser um fato isolado ou até mesmo uma decisão empresarial é, na realidade, reflexo de uma crise que provocou o fechamento de 170 estabelecimentos comerciais desde 2005 e reduziu drasticamente o movimento no mais importante ponto turístico da capital baiana.
Uma pesquisa realizada recentemente pela Acopelô (Associação dos Comerciantes do Pelourinho) mostra que o centro histórico de Salvador, tombado pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) como patrimônio cultural da humanidade, deixou de ser um espaço interessante para os comerciantes. “Há quase seis anos tínhamos 390 estabelecimentos comerciais funcionando aqui; hoje, contamos com apenas 220. E a tendência é um cenário ainda pior porque o centro histórico está abandonado”, disse o presidente da entidade, Lenner Cunha.
“Enquanto não houver uma integração entre todos os poderes (União, Estado e prefeitura), nada vai prosperar aqui. Temos de agir rápido porque o centro histórico de Salvador não pode ficar refém da prostituição, das pessoas com dependência química, dos catadores de produtos recicláveis e da miséria absoluta”, afirmou o subprefeito do bairro, José Augusto de Azevêdo Leal. “Sem um comércio atraente e com tantos problemas sociais, muitos turistas relutam em visitar o centro histórico”, afirmou.
Depois de muitas queixas dos comerciantes, turistas e moradores do centro histórico, a Polícia Civil apresentou esta semana um plano de segurança para mudar a realidade do Pelourinho. Orçado em R$ 800 mil, o plano prevê corredores monitorados por câmeras, distribuição de mapas e panfletos, policiamento ostensivo, sinalização para evitar que baianos e turistas entrem em áreas de risco, cadastramento de moradores de rua e menores, combate ao comércio ambulante e reforço na iluminação pública.
Lenner Cunha coloca em dúvida a concretização do plano. “Os moradores não foram ouvidos, os empresários não foram consultados. Então, existe uma tendência muito grande de a comunidade boicotar qualquer tipo de ação, até de forma inconsciente, porque não faz parte do jogo. É só interesse político.”
Azevêdo Leal afirmou que a revitalização econômica e cultural do centro histórico de Salvador passa pelas propostas apresentadas pela Polícia Civil. “A caracterização do problema não é novidade. O problema é resolver porque, de fato, o Pelourinho está mal cuidado mesmo, temos de ser realistas.”
Além das sugestões apresentadas pela Polícia Civil, o ministro do Turismo, Luiz Barreto, também anunciou esta semana em Salvador a implantação do projeto “Palco Articulado”, um palco móvel, a quatro metros do chão, ao custo de R$ 4 milhões. “Neste palco vão dialogar atrações musicais importantes e outros eventos”, disse o ministro. “Além de abrigar shows e afins, a ideia é que nele funcione um cinema cultural, assim como cursos. Trata-se de valorizar o patrimônio antigo, agregando modernidade”, ressaltou Antonio Carlos Tramm, secretário estadual do Turismo. Tramm disse, ainda, que o governo da Bahia tem investido em atrações artísticas e programas culturais para aumentar o fluxo de visitantes ao local.
Abandono total
Em sua primeira visita a Salvador, a publicitária mineira Denise Ramos, 25, disse que ficou decepcionada com o centro histórico de Salvador. “Vi muita sujeira, casarões em ruínas, ruas fechadas e ambulantes que dão a impressão que vão atacar os turistas a qualquer momento.”
O advogado carioca Roberto Menezes, 41, também criticou o “abandono” do centro histórico. “É lamentável que um lugar que carrega grande parte da história do Brasil seja tão carente de serviços básicos e essenciais, como a coleta de lixo e segurança.”
Azevêdo Leal disse que os turistas que criticam o centro histórico têm razão. “Não existe uma programação cultural para sustentar o movimento e a quantidade de mendigos e moradores de rua assediando os turistas é impressionante.”
Com aproximadamente 3.000 casarões dos séculos 16, 17 e 18, o centro histórico de Salvador passou por uma grande intervenção na década de 90, com a restauração de cerca de 700 imóveis, reformas de museus, inaugurações de restaurantes, lojas, joalherias e obras de infraestrutura que possibilitaram a criação de redes elétricas subterrâneas e a instalação de esgotamento sanitário. “Os serviços executados transformaram o centro histórico no local mais visitado de Salvador, mas, agora, a realidade é bem diferente”, afirmou o subprefeito.
Além da ausência de segurança para os visitantes e sujeira em suas ruas e ladeiras centenárias, o centro histórico de Salvador também convive com outro problema: a falta de manutenção de muitos casarões. Dos 111 imóveis tombados pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) e condenados pela Defesa Civil, 24 estão localizados no local.
Na última terça-feira (31), o Ministério da Integração Nacional liberou uma verba de R$ 6 milhões para a execução de obras emergenciais em 50 casarões. “Vamos atacar inicialmente os imóveis mais problemáticos”, disse o superintendente regional do Iphan, Carlos Amorim.
A turista argentina Mercedes Ortiz, 23, disse que “esperava mais” do centro histórico de Salvador. “As imagens e fotografias que vi são bem diferentes da realidade. O sítio é muito bonito, mas também é muito inseguro e tem muita sujeira acumulada pelas ruas.”
O subprefeito ressaltou que o centro histórico não precisa de “planos mirabolantes” para oferecer mais conforto aos seus visitantes e moradores. “Temos de fazer o básico para melhorar a infraestrutura do local. E o básico inclui a coleta de lixo, mais segurança, qualificação dos comerciantes e combate ao comércio clandestino. Se conseguirmos isso, o centro histórico tem tudo para voltar aos seus melhores dias.”
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