Em quatro anos, ao menos 40 mil cortadores de cana foram demitidos devido à mecanização em SP
Com o avanço da mecanização nos canaviais paulistas, foram fechados pelo menos 40 mil postos de trabalho no corte da cana-de-açúcar desde 2007, calcula o professor do Departamento Economia Rural da Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) José Giacomo Baccarin. No mesmo período, o setor sucroenergético abriu vagas suficientes para realocar apenas 10% dos ex-cortadores em atividades como a de tratorista. Outros postos abertos no ramo não são preenchidos por esses trabalhadores por causa da baixa escolaridade, segundo o professor.
Baseado em análises dos números do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) do Ministério do Trabalho, Baccarin aponta que em maio de 2010 – mês em que há o pico da safra – trabalhavam na colheita manual 166,4 mil pessoas. Ele estima que 150 mil desses cortadores de cana sejam dispensados até 2014, último ano para o fim da queima da palha da cana, necessária para o corte manual, em todas as áreas mecanizáveis do estado. O prazo foi estabelecido em um protocolo assinado entre o governo estadual e a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica).
O Ministério Público Federal tem pressionado por um processo de licenciamento mais rigoroso para permitir as queimadas no estado. No fim de janeiro, uma ação impetrada pelo órgão foi acatada pela Justiça Federal, que suspendeu a queima na região de Franca, interior do estado.
Para Baccarin, esse tipo de pressão ajuda a acelerar o processo de mecanização, mas não é o fator decisivo. “A questão é valorizar o etanol como combustível renovável e não agressor ao meio ambiente, é isso que está acontecendo”, destacou em entrevista à Agência Brasil. As queimadas pioram a qualidade do ar dos municípios produtores e a colheita manual é apontada como um trabalho muito penoso.
“O lado bom da mecanização é isso. As pessoas deixam de fazer esse serviço forçoso [pesado], no limite desumano, que é cortar cana”, analisa o coordenador de Relações Sindicais do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), José Silvestre Prado de Oliveira.
Ele pondera, no entanto, que a perda maciça de empregos impacta diretamente milhares de famílias e os municípios onde há o cultivo. “Tem o problema de ordem econômica e social que é o que fazer com as pessoas que viviam e dependiam dessa renda para viver.”
Algumas prefeituras têm buscado formas de amenizar esses efeitos, segundo Baccarin. “Uma coisa que já percebi que as prefeituras fazem é encaminhar o pessoal para o seguro-desemprego.”
A Unica desenvolve desde o ano passado um programa de requalificação de cortadores chamado Renovação. “É um modelo em que o trabalhador continua recebendo o salário dele, mas estuda em período integral”, explica a assessora de Responsabilidade Social Corporativa da entidade, Maria Luiza Barbosa.
O programa desenvolvido pela Unica tem foco, segundo ela, na capacitação de acordo com a disponibilidade de vagas em cada região. “É formar para o cara ter opção de trabalhar naquela área [sucroenergética] ou ser um profissional autônomo”. Ela afirma que o projeto tem “cunho social” e que os cursos oferecidos, com cerca de 300 horas de duração, são de alta qualidade. “É para aprender, não para falar que fez.”
A meta do projeto é, por ano, qualificar para outras atividades 7 mil trabalhadores braçais. Parte deles será realocada pela própria indústria canavieira, mas a maior parcela terá de ser absorvida por outros setores. Caso cumpra o proposto, o Renovação capacitará 35 mil cortadores até 2014.
O presidente do Sindicato de Trabalhadores Rurais de Regente Feijó (SP), Marcelino Sotocorno, afirma, no entanto, que as usinas têm preferido empregar trabalhadores mais qualificados a ex-cortadores na colheira mecanizada. Segundo ele, foi preciso pressionar as empresas para que os cortadores fossem qualificados para os postos.
Para o presidente do Sindicato de Empregados Rurais de Ribeirão Preto (SP), Sílvio Palviqueres, a requalificação ainda é “mínima” em comparação à velocidade da mecanização. Segundo ele, na região, uma das maiores produtoras de cana do estado, uma parte dos trabalhadores é absorvida pela construção civil. “Esses trabalhadores não têm escolaridade, sabem só assinar o nome, então eles não conseguem disputar uma vaga na área urbana. A única coisa que sobra para eles é a construção civil.”
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