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Propina a agentes públicos em Londrina (PR) pode ter sido paga com carros novos e combinada por celular "doado"

Janaina Garcia<br>Do UOL Notícias<br>Em São Paulo

11/05/2011 17h53

Dois veículos novos de R$ 45 mil e R$ 29 mil pagos como propina e um telefone celular que servia de linha direta entre o corruptor e o agente público suspeito de corrupção. Segundo o Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) em Londrina, no norte do Paraná, essas são algumas das apreensões feitas nessa terça-feira (10) pela “Operação Assepsia”, deflagrada após quatro meses de investigações sobre desvios de verbas públicas do setor de saúde. Dos 15 presos na ação, apoiada por outros Gaecos do Paraná e homens das polícias Federal, Civil e  Militar, três eram agentes públicos --o procurador jurídico do município, Fidélis Canguçu, e dois conselheiros municipais de saúde.

Em entrevista ao UOL Notícias nesta quarta-feira (11), o coordenador do Gaeco, promotor Cláudio Esteves, afirmou que quatro presos temporários foram liberados por terem prestado informações consideradas relevantes às investigações. Eles fazem parte de empresas que teriam emitido notas frias a dois institutos que prestam serviços à Prefeitura de Londrina na área de saúde por meio de contratos emergenciais que, juntos, valem cerca de R$ 13 milhões para seis meses de execução. Ambos executam, por exemplo, programas federais como PSF (Programa Saúde da Família), Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), Sid (Sistema de Internação Domiciliar) e Policlínica e, conforme as investigações, teriam desviado recursos ao superfaturar valores ou obter notas frias para justificar serviços que não eram prestados.

O procurador, que foi exonerado pelo prefeito Homero Barbosa Neto (PDT) horas depois da prisão, integraria o esquema, por exemplo, ao chancelar decisões ou pagamentos por meio de pareceres jurídicos anteriormente negados por outros procuradores que ocuparam o posto --no qual ele estava havia menos de seis meses.

Os dois veículos estavam com Canguçu e a esposa, também presa na operação por suspostamente cobrar que o marido pedisse a propina e também por ser a destinatária do que seria pago pelos donos dos institutos --no caso, um dos veículos apreendidos. Ao todo, os policiais e promotores cumpriram 16 mandados de busca e apreensão. Um mandado de prisão temporária segue em aberto, com o suspeito foragido.

“Não temos ainda quanto o esquema movimentou, mas apuramos, por exemplo, se esses carros apreendidos eram pagamento de propina, até pelo que foi colocado em depoimento pelos colaboradores. Acreditamos que talvez nunca se saiba um valor exato --poderemos talvez é confirmar quantias”, disse o promotor. Um dos presos, por exemplo, afirmou ao Gaeco que a propina ao agente público teria chegado a R$ 120 mil, já computados os dois veículos. Já o celular, comprado pelo dono de um dos institutos a um dos agentes públicos para as tratativas, foi localizado com ele --cuja identidade não foi revelada --no momento da prisão.

Logo após a abordagem dos policiais ontem, às 6h, durante agenda com o prefeito em escola pública, Canguçu --com o qual, naquele momento, foram apreendidos R$ 20 mil -- disse rapidamente à imprensa que não participara de quaisquer irregularidades ou crimes investigados.

Sobre a participação de mais agentes públicos, Esteves não deu detalhes. “Temos mais pessoas ainda para serem interrogadas, entre presos e agentes”, resumiu. Entre elas, afirmou o promotor, estarão o prefeito e representantes da secretaria municipal de Saúde.

Prefeitura

A assessoria do Executivo municipal informou que a exoneração de Canguçu foi por conta da prisão. O chefe do órgão, José Otávio Ereno, disse ainda que desde fevereiro os contratos com os dois institutos estavam sendo auditados pelo município, que teria encontrado distorções que justificaram o não pagamento de uma parcela e o repasse de metade de outra. Sobre o ex-procurador, Ereno disse que o prefeito “foi pego de surpresa” com a notícia de suposto envolvimento dele no esquema apurado pelo Gaeco. O mandatário, por sinal, foi o primeiro a ser informado pelos agentes do grupo sobre a prisão do comissionado, no cargo há menos de seis meses. Antes, Canguçu chefiava a procuradoria da CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização), órgão da administração indireta que, dentre outras funções, responde pelos contratos de limpeza e pela arrecadação de multas de Londrina.

Novo escândalo

Os dois institutos alvos da atual investigação de promotores e delegados assumiram emergencialmente serviços de saúde que haviam sido rompidos na cidem Londrina e outras cidades brasileiras, ano passado, após investigações da CGU (Controladoria Geral da União) e do MPF (Ministério Público Federal) envolvendo a oscip Ciap (Centro Integrado e Apoio Profissional). Conforme as investigações, o Ciap teria desviado em cinco cidades, entre elas Londrina e Rio de Janeiro, cerca de R$ 300 milhões em verbas federais destinadas à saúde pública. Em Londrina, sede da oscip, o rombo apurado chegou à casa de R$ 10 milhões.