Topo

Ameaça de corte de luz em Campos (RJ) revolta moradores alagados

Rodrigo Teixeira

Do UOL, em Campos de Goytacazes

06/01/2012 14h30

O clima ficou tenso no início da tarde desta sexta-feira (6) em Campos de Goytacazes, cidade do norte fluminense alagada após o rompimento de um dique. Os moradores se recusam em aceitar o corte de energia do município e chegaram a impedir que um funcionário da concessionária de energia acessasse o transformador de uma das entradas do bairro para desligar a luz.

A área foi completamente alagada depois que um trecho da rodovia BR-356, que serve como barragem para conter as águas do rio Muriaé, se rompeu, criando uma cratera de aproximadamente 20 metros. Cerca de 1.000 famílias moram na região

Localização do dique rompido em Campos

  • Arte UOL

A Defesa Civil Municipal afirmou que o corte é necessário para evitar acidentes com a rede elétrica, mas o secretário da Defesa Civil de Campos, Henrique Oliveira, chegou a dizer que a luz foi cortada na região de Três Vendas para forçar a saída de cerca de 500 famílias que se recusam a deixar o local. 

Os moradores querem manter a energia e ficar em suas casas por temerem saques. “Na última enchente, em 2008, (as autoridades) nem ligaram para Três Vendas. Se cortarem a energia, aí que os ladrões poderão saquear nossas casas”, diz o comerciante Cláudio Guimarães.

O diretor da associação de moradores de Três Vendas, André Guedes, afirma que metade da população ainda está no local. “Muitos moradores ainda estão aqui, o medo é de serem roubados, gente que construiu isso tudo em uma vida corre o risco de ser roubada. Permanecem em suas casas aqueles que têm um pavimento acima”, conta o líder comunitário.

A reportagem do UOL não viu nenhuma patrulha policial fazendo a segurança do local.

Como medida para forçar a saída das pessoas –já que a previsão é de que a água deixe as casas encobertas–, o governo decidiu cortar a luz na localidade. O subsecretário de Defesa Civil municipal, major Edson Pessanha, diz que o serviço deve ser interrompido até o final da tarde de hoje e que a prioridade é levar as famílias para abrigos.

“É importante que as pessoas deixem suas casas, lá poderão ser melhor atendidas. Estamos fazendo a vacinação da antitetânica e contra a hepatite em um posto montado na parte alta de Três Vendas e em alguns abrigos”, afirma o major.

Durante todo o dia, a Secretaria da Defesa Civil realiza operação para tentar convencer as famílias a saírem do segundo andar de suas casas. As famílias retiradas se encontram temporariamente em duas escolas municipais e em acampamentos. Ontem (5), cerca de 450 ônibus foram utilizados para levar os moradores de Três Vendas para locais considerados seguros.

“Há previsão de mais chuva durante todo o verão e as estruturas das casas podem não aguentar. Vamos de casa em casa de barco, com assistentes sociais, tentar convencer as pessoas sobre os perigos de doenças como a dengue, a leptospirose e explicar que essa situação deve se manter durante muitos dias ainda”, disse o secretário da Defesa Civil municipal, Henrique Oliveira, à Agência Brasil. "O trecho destruído da estrada só poderá ser reconstruído depois que o rio baixar. Por isso, é difícil ter uma previsão de quanto tempo vai levar para os moradores poderem voltar às suas casas”, disse Oliveira.

Ele lembrou que em 2007, o rio Muriaé já havia destruído parte da BR-356 e alagado Três Vendas. Os moradores ficaram quatro meses com suas casas sob as águas e perderam tudo. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes fez os reparos em 2008, o que não impediu uma nova tragédia.

Campos de Goytacazes não está na lista dos 251 municípios em áreas de risco (veja a lista em PDF) no mapeamento  feito pelo Serviço Geológico do Brasil (CPRM). O levantamento inclui as áreas mais propensas a sofrer algum tipo de desastre natural. Reportagem publicada pelo site Contas Abertas mostra que, desses 251 municípios, apenas 23 receberam recursos em 2011.

A moradora Bruna da Rocha, 28, comerciante, diz que a enchente é um problema recorrente no local e as autoridades não tomam providência. “Eu não entendo de obra, mas há três anos isso aconteceu aqui. É tragédia anunciada, a prefeitura deveria fazer alguma coisa.”
    
Seguido de perto por sua cachorra, o estudante Jeferson Ribeiro, 20, que teve que atravessar a enchente para ir ao encontro de sua mulher que está prestes a ganhar o primeiro filho do casal, estava desolado por ter perdido seus pertences. “Vou embora deste lugar, vou para a casa da minha sogra, onde está minha mulher que vai ganhar neném. Essa cheia foi a pior, esse lugar não dá mais, acabou para mim.”

Pescadores aproveitam vazão do Muriaé

Na localidade de Sapucaia, que antecede o bairro de Três Vendas, alguns moradores aproveitam a vazão do rio Muriaé para pescar.

“Estou aproveitando a fartura de peixes, estou de férias, bom mesmo é pescar, aqui está dando curimatá, conhecido como papa-terra e também o bagre africano, hoje vamos comer peixe assado”, diz o auxiliar de serviços gerais Tiago Silva.

Enquanto isso, o agricultor Manoel Santos passa com sua canoa pelo rio. “Estou aqui no meu barco, ontem isso era uma estrada , hoje uma rio, é a força da natureza”, finaliza.

(Com Agência Brasil)