Topo

Operação da PM na cracolândia apreende quase 30 kg de drogas e detém 107 pessoas

Do UOL, em São Paulo

15/01/2012 09h47

Segundo o último boletim divulgado pela Polícia Militar, 107 pessoas já foram detidas na região da cracolândia, no centro de São Paulo. Entre os presos, 43 condenados foram capturados. Desde o dia 3 de janeiro, data de início da operação Centro Legal, foram feitas 4.412 abordagens. Em relação à droga apreendida, a PM informa que foram 2,355 kg de crack, 10,187 kg de cocaína e 17,195 kg de maconha.

Cerca de 100 toneladas de lixo também foram retiradas das ruas do centro. Entre as 1.357 abordagens de agentes de saúde, cinco grávidas foram encaminhadas para tratamento.

Churrascão

O coletivo Dar (Desentorpecendo a Razão), movimentos sociais, moradores, frequentadores e comerciantes da região central de São Paulo realizou neste sábado (14), o "churrascão da gente diferenciada" na rua Helvétia esquina com a rua Dino Bueno, na cracolândia.

A ação é uma reação à operação na região da cracolândia. “O churrascão é uma reação bem humorada e bem organizada para mostrar que nem todos concordam com a mera expulsão dos dependentes da região como meio de solucionar o problema das drogas: um problema de natureza muito mais complexa do que aquilo com que o tratamento policial, comprovadamente, pode lidar”, explicam os organizadores no blog Luz Livre.

Para o coletivo DAR, a ação da PM não oferece alternativas razoáveis aos dependentes e desrespeita os direitos humanos. Na página do evento no Facebook, o grupo classifica a ação como “higienismo, preconceito e segregação”.

"O modo como a ação policial está agindo com os dependentes que frequentam essa região vai contra o trabalho que ONGs realizam há anos com essas pessoas. Os dependentes estão machucados e feridos", afirmou Bruno Ramos Gomes, presidente da ONG Centro de Convivência É de Lei, que realiza desde 2003 um trabalho na cracolândia e participa da organização do "churrascão".

O churrasco foi decidido na segunda-feira (9) durante uma reunião entre participantes de movimentos sociais, moradores, comerciantes da região e dependentes que vivem na cracolândia. "Nossa ideia era fazer algo contra a ação que incluísse as pessoas que sofrem a repressão da PM. Foi um usuário e morador da cracolândia, o Paulo, que sugeriu o churrasco. Queremos mostrar que todos somos iguais", contou Roberta Marcondes Costa, do coletivo Dar.

Moradores e comerciantes do bairro estão envolvidos na organização. "Durante esta sexta-feira (13) conversamos com moradores e comerciantes e eles apoiam o evento. Vamos ter o churrasco e várias intervenções culturais de grupos de teatro, dança e música", afirmou Costa.

Localização da cracolândia

  • Arte UOL

"O churrascão não é apenas contra a ação da PM, ele visa também à ocupação dos lugares públicos da cidade, incluindo, a cracolândia", afirmou ao UOL Janaina Soares Gallo, advogada e frequentadora do centro de São Paulo, que participou da reunião.

Para o grupo que organiza o evento, este tipo de mobilização ficou “marcada na cidade como forma de combater, de forma bem humorada e crítica, o preconceito e o racismo dos políticos e das elites paulistanas”. O nome faz referência a um outro evento que aconteceu em São Paulo em maio de 2011. Uma moradora de Higienópolis usou o termo "gente diferenciada" para descrever “os mendigos e drogados” que, segundo ela, ocupariam o bairro se uma nova estação de metrô fosse instalada na avenida Angélica. Após o governo do Estado confirmar a mudança de local da estação, alegando questões técnicas, aconteceu o "churrascão da gente diferenciada” em frente ao shopping Higienópolis no dia 14 de maio como forma de protesto.

Tour pela Luz

Antes do início do churrasco na cracolândia, os organizadores do festival Baixo Centro, que acontece em março, vão realizar um tour pela região da Luz para registrar em fotos e vídeos a movimentação do bairro.

“Pensamos em fazer esse tour antes de sabermos do protesto do coletivo Dar. Ao sabermos do churrascão, conversamos com os organizadores  e mudamos um pouco o trajeto, para nos unirmos a eles no final do tour”, afirmou Lucas Pretti, produtor cultural da Casa da Cultura Digital e um dos articuladores do festival Baixo Centro.

Até agora, o tour tem mais de 80 pessoas confirmadas no evento do Facebook. “Temos um ônibus mesmo e vamos circular pelo centro. São 40 lugares, mas já temos mais pessoas confirmadas. Essa ação faz parte de um fim de semana de atividades que organizamos para chamar para o festival em março, que tem como objetivo a ocupação cultural do centro da cidade”, explicou Pretti. O ônibus vai sair às 15 horas da Casa de Cultura Digital, que fica na rua Vitorino Camilo, no centro de São Paulo.

Mais um evento está marcado para protestar contra a ação da PM. No dia 25 de janeiro, aniversário da cidade de São Paulo, deve acontecer o ato contra a higienização e a favor do tratamento digno para os dependentes de crack na Luz. Até a tarde desta sexta-feira (13), 214 pessoas haviam confirmado presença.

Críticas à ação

As críticas à operação Centro Legal vêm crescendo e, no último dia 10, o Ministério Público de São Paulo instaurou um inquérito civil para apurar os objetivos, responsabilidades e eventuais atos de violência praticados na ação integrada pela Polícia Militar.

Segundo os promotores de Habitação, Direitos Humanos (Inclusão Social e Saúde) e da Infância e Juventude, a ação foi desarticulada porque não ofereceu aos dependentes químicos expulsos da cracolândia nenhum atendimento baseado nos eixos saúde-assistência social-educação-moradia-segurança. “O tráfico de drogas é uma questão de polícia, mas o dependente químico, não. O dependente é uma questão de assistência social e saúde”, enfatizaram os promotores em entrevista coletiva concedida na terça-feira (10).

A Defensoria Pública de São Paulo informou na quarta-feira (11) que já coletou 32 denúncias de abusos cometidos durante a operação policial, segundo reportagem da Folha.

Segundo o coordenador do núcleo de Direitos Humanos do órgão, Carlos Weis, são casos "exemplificativos" de como a Polícia Militar e a Guarda Civil Metropolitana estão agindo. Para ele, os métodos das corporações são "absolutamente exacerbados, em face das pessoas, que são pobres, miseráveis e desarmadas".

Já a Secretaria de Segurança Pública alega que a ação é acertada, e não tem prazo para terminar. (Com reportagem de Bia Rodrigues, de São Paulo)