Para encontrar amante virtual em Goiás, jovem no Maranhão forja sequestro e polícia descobre

Uma suposta paixão por uma mulher que conheceu pela internet levou um estudante de engenharia mecânica a forjar seu próprio sequestro, deixar a família aflita e mobilizar a polícia e a Justiça em São Luis (MA) por cinco dias. Após perceber atos estranhos dos supostos sequestradores, a Polícia Civil descobriu a farsa do jovem, que estava em Goiânia (GO). O jovem voltou para São Luís no último domingo (18), e nesta segunda-feira (19) se apresentou à polícia.

A história do desaparecimento é digna de roteiro de filme. Na última quarta-feira (14), David Phillip da Luz Araújo, 20, desapareceu antes de encontrar-se com o cunhado para realizar a transferência de R$ 11 mil que estavam na conta dele e pertenciam ao sogro.

Um dia após o sumiço, a família do rapaz pediu ajuda à polícia e registrou um BO (Boletim de Ocorrência) para que o caso fosse investigado. A primeira hipótese levantada foi de sequestro relâmpago, pois haviam ocorrido dois saques em terminais bancários diferentes, compras de valores altos no cartão de crédito do jovem e os celulares estavam desligados.

Segundo o delegado da Depoc (Delegacia Especial da Cidade Operária), Dicival Gonçalves, ao saber da movimentação da conta, a polícia pediu a Justiça para bloquear a conta corrente do rapaz, acreditando ainda na hipótese de sequestro. Assim, os supostos criminosos libertariam a vítima. Porém, com o passar dos dias, a polícia passou a trabalhar com a possibilidade de sequestro com cativeiro, mas desconfiou também do sumiço de David tratar-se de um golpe. A suspeita veio após mensagens que foram enviadas para o celular do pai dele, pedindo que desbloqueassem a conta corrente de David.

“Criminosos que praticam um sequestro relâmpago tiram tudo que há de valor da vítima de uma maneira rápida e não demoram para soltar o refém. Sequestradores de cativeiro não iam se expor ao fazer saques em agências bancárias por conta do circuito de imagens, sempre os valores pedidos são entregues em mãos, jamais iriam pedir o desbloqueio de uma conta. Também não foi cobrado valor de resgate”, disse o delegado.

Durante o período em que David que esteve desaparecido, o pai do rapaz recebeu várias mensagens com ameaças de morte, caso a conta corrente de David não fosse desbloqueada. Ainda de acordo com o delegado, as mensagens eram escritas com erros de português para que não levantassem suspeita de que era o próprio David que estava as enviando. Em uma delas, em resposta ao pai do jovem --que havia pedido garantias de que ele estaria vivo-- foi: “Que que mande o dedo ou a urêia? [sic]”.

“Começamos a trabalhar com a realização de um sequestro mesmo. Com o aprofundamento das investigações, as imagens dos terminais em que David realizou os saques mostraram que ele estava sozinho, além de outras diligências confidenciais, descobrimos a farsa”, disse Gonçalves.

A viagem

Segundo a polícia, David confessou que viajou para Goiás sem dar notícias à família para ir supostamente se encontrar com uma mulher que havia conhecido pela internet e teria se apaixonado. A polícia disse que o jovem confessou ainda que simulou o sequestro para justificar sua ausência para a família.

Em depoimento, David afirmou que o encontro não deu certo porque a mulher que ele se apaixonou era casada, e o marido dela descobriu o namoro virtual assim que ele chegou a Goiânia. Apesar dele alegar que não chegou a se encontrar com a mulher porque o marido dela atendeu a uma ligação que ele fez para o telefone da namorada e dizer que ‘se ele não voltasse iria se dar mal’, a polícia investiga se ocorreu a prática de adultério e se existem outras pessoas envolvidas na simulação do sequestro.

Segundo o delegado, David deverá ser indiciado por extorsão e adultério, caso seja provado que ele tinha uma namorada em Goiânia, pois o jovem é casado há um ano e dois meses. A mulher dele está com quatro meses de gestação, ao saber da farsa e suposta traição, saiu da casa do casal, está morando com os pais no interior do Maranhão e afirmou que vai iniciar o processo de divórcio.

Defesa

O advogado de David Phillip, Luis Henrique Launé Fonseca, reconheceu que ele forjou o sequestro para justificar o sumiço, mas afirmou que não houve extorsão. “O jovem resolveu voltar para São Luis e, para justificar o sumiço, fez a armação, mas em nenhum momento ele extorquiu ninguém, nem tirou dinheiro que não era dele”, defendeu o advogado.

Fonseca afirmou que David teve um surto acometido por uma paixão avassaladora, mesmo sendo casado, e foi encontrar-se com a namorada virtual. “Foi um surto que ele teve e ao cair na real voltou espontaneamente para São Luís e se apresentou à polícia. David é uma pessoa de bem, estuda e já tem estágio. Não ocorreram essas mensagens para o celular do pai como a polícia está afirmando existir”, disse.

O advogado contou detalhes da viagem e disse que David se determinou que naquela semana iria encontrar-se com a "amante virtual". Segundo Fonseca, no dia em que David sumiu não existia voo para Goiás e ele foi para Teresina (PI) de ônibus e comprou as passagens aéreas a preços exorbitantes. “O casamento dele já não estava bem, e resolveu conhecer a namorada virtual, mas ao chegar a Goiânia descobriu que a mulher era casada e recebeu ameaças do marido da amante”, ressaltou.

O desaparecimento de David Phillip mobilizou familiares e amigos, que espalharam fotos do rapaz nas redes sociais na tentativa de localizá-lo. A irmã de David, Letícia Almeida, postou várias fotos em sua conta no Facebook na tentativa de alguém encontrá-lo. A reportagem do UOL entrou em contato com Letícia, mas ela não quis comentar o caso e disse que a família só tinha a dizer que David estava bem.