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TJ do Paraná contraria Lei de Acesso à Informação Pública e veta divulgação de salários

Rafael Moro Martins

Do UOL, em Curitiba

19/06/2012 15h32

O Tribunal de Justiça do Paraná vetou nesta segunda-feira (18) a divulgação dos salários dos servidores públicos estaduais dos três poderes por considerá-la “inconstitucional”. A decisão do Órgão Especial da corte foi tomada em julgamento de ação direta de inconstitucionalidade contra a Lei Estadual da Transparência, em vigor desde o ano passado.

Com a decisão, os desembargadores paranaenses se colocam na contramão da Lei Federal de Acesso à Informação, que entrou em vigor em maio e garante ao cidadão acesso a informações de despesas feitas pelos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário – incluindo salários.

“O TJ do Paraná está em descompasso com o momento histórico do país”, afirmou, ao UOL, o presidente da seção paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-PR), José Lúcio Glomb. Co-autora da Lei Estadual da Transparência, a OAB-PR irá recorrer da decisão tomada pelo Órgão Especial. “Iremos ao STF se for preciso”, disse Glomb.

“Independentemente do recurso, o TJ terá de cumprir a lei federal (de Acesso à Informação), que não pode declarar inconstitucional”, disse o presidente da OAB-PR. “Não vejo em quê a divulgação dos salários dos magistrados diminue o Poder Judiciário. Ao contrário, ela só o engrandece. Acima de qualquer privacidade está o interesse público.”

“Se eles [os desembargadores paranaenses] acharem que ela é inconstitucional, devem ingressar com ação no STF. Mas o Supremo já sinalizou que a Lei de Acesso à Informação é constitucional ao abrir o acesso aos vencimentos de seus membros e servidores”, afirmou Glomb.

Outro lado

No julgamento da ação direta de inconstitucionalidade movida pelo ex-deputado estadual Jocelito Canto (que há poucos dias desfiliou-se do PMDB), o órgão especial do TJ considerou ilegais as obrigações de tornar públicas a remuneração individualizada de servidores públicos e a publicação de atos do Tribunal no “Diário Oficial do Estado”.

Para os desembargadores, a publicação de nomes, locais de trabalho e vencimentos fere o direito à privacidade dos servidores públicos. O Órgão Especial é uma espécie de câmara recursal do TJ, formada por 25 desembargadores. Apenas um deles, Jorge de Oliveira Vargas, foi favorável à Lei da Transparência.

Outros pontos da lei, que obrigam os três poderes a divulgar a nomeação, exoneração e aposentadoria de servidores públicos concursados e comissionados, publicar notas fiscais de gastos públicos e manter “portais da transparência”na internet, seguem em vigor.

Procurado pelo UOL, o relator do processo, desembargador Jonny de Jesus Campos Marques, disse que não irá comentar a decisão, segundo a assessoria de imprensa do TJ.

Em seu voto, Campos Marques anotou que “embora a questão se mostre aparentemente polêmica, a verdade é que a divulgação do nome do servidor, acrescido dos valores que percebe a título de subsídios, vencimentos ou proventos, é inconstitucional, haja vista o dispositivo citado, pois pode acarretar-lhe um sem número de dissabores, não só em termos de segurança”.

O dispositivo citado é “o direito a privacidade e a intimidade de que trata o artigo 5.º da Constituição Federal.” Para Campos Marques, o STF, “em decisão monocrática de seu então presidente, o ministro Gilmar Mendes, deixou bem clara esta preocupação, ao consignar que 'também por  meio da interpretação do artigo 5.º da Constituição apreende-se que a divulgação pública de informações e dados de  domínio estatal está condicionada à preservação da inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas'”.

“De fato, cabe perguntar qual é o interesse público na divulgação do quanto percebe determinado funcionário público – o sr. José de tal, por exemplo?”, disse Campos Mendes. Para ele, a Lei de Acesso à Informação fala “na observância da publicidade como preceito geral e do sigilo como exceção”.

“Este, tenho para mim, é bem o caso, em homenagem aos referidos princípios da inviolabilidade da intimidade e da vida privada, de modo que qualquer determinação em sentido contrário, com o maior respeito, se mostra demagógica, a que, é claro, não podemos jamais estar vinculados, além de servir para alimentar o sensacionalismo que vem presidindo a atuação da mídia em nossos dias”, afirmou o magistrado.

O TJ informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que “os salários de servidores e magistrados já se encontram no Portal da Transparência desde 2010, em cumprimento à Lei Estadual 16.595/2010”, e que um grupo de trabalho “já iniciou gestão para cumprimento da Lei de Acesso à Informação”.