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Rio se inspira em Barcelona e investe R$ 8 bi para recuperar zona portuária para Olimpíadas

Imagem de projeto para revitalizar a zona portuária do Rio de Janeiro - Divulgação CDURP
Imagem de projeto para revitalizar a zona portuária do Rio de Janeiro Imagem: Divulgação CDURP

Fabíola Ortiz

Do UOL, no Rio de Janeiro

28/06/2012 06h00

De olho nas Olimpíadas de 2016 e no seu legado, o Rio de Janeiro se inspira em Barcelona para a recuperação de sua zona portuária. A operação urbana chamada de Porto Maravilha começou em 2010 e é maior PPP (Parceira-Público-Privada) do país, envolvendo recursos da ordem de R$ 8 bilhões. A promessa é de recuperação de uma área urbana de 5 milhões de metros quadrados em pleno centro do Rio de Janeiro.

Em seis anos, contando a partir de 2010, a meta é construir 4 km de túneis, abrir uma via expressa de alta velocidade às margens da Baía de Guanabara, próximo aos armazéns portuários, uma nova avenida chamada Binário, além de demolir, a partir de 2013, 4,5 km do viaduto da Perimetral, o ponto mais polêmico do projeto.

Hoje, a zona portuária tem um IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,775, considerado médio. Os bairros do entorno como Gamboa, Saúde, Morro da Conceição e Morro da Providência carecem de infraestrutura urbana, falta de saneamento, iluminação e segurança. A população da área soma cerca de 30 mil habitantes, e há poucas escolas e hospitais para atender aos moradores. A região sofre ainda com problemas de esgoto e alagamentos no período de chuvas. Com a requalificação urbana, a população será quintuplicada e passará dos atuais 30 mil para 150 mil.

Das experiências de recuperação de zonas portuárias pelo mundo, o Port Vell, em Barcelona, e o Porto Madero, em Buenos Aires, são os exemplos mais próximos do Rio, segundo disse ao UOL Jorge Arraes, presidente da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (CDURP), empresa pública criada para planejar e articular a operação urbana.

“Barcelona é a que mais parece com a gente, pois reúne a característica de ter sido uma cidade olímpica, uma cidade portuária, o tamanho do espaço e o fato de ser uma área que estava degradada. Essas características fazem que Barcelona seja uma referência”, explicou Jorge Arraes.

Exemplo de Barcelona

A partir de 1950, as cidades que tinham vocação portuária, como Barcelona, Lisboa, Gênova e Buenos Aires, tiveram suas atividades de porto afastadas dos centros urbanos -- as cidades portuárias sofreram um processo de desindustrialização, as fábricas começaram a deixar os centros urbanos e foram se sediar em locais cada vez mais distantes. Os portos foram precisando cada vez de mais espaço para os navios de grande calado; assim, portos com novas tecnologias foram construídos em outras áreas.

Ao longo das últimas quatro décadas, muitas cidades no mundo têm traçado estratégicas de revitalização de seus portos para reverter o cenário de degradação das áreas do entorno. Assim como no Rio, em outras cidades, a desindustrialização deixou para trás vazios urbanos, edifícios obsoletos e uma área subutilizada com um enorme potencial construtivo.

No entorno do porto do Rio, não foi diferente. Lá, desenvolviam-se atividades econômicas importantes, mas, com a degradação do porto, as áreas do entorno ficaram abandonadas e ociosas.

Com vistas às Olimpíadas de 1992, Barcelona viveu um período de renovação urbana, a partir dos anos 80. O antigo porto da cidade, Port Vell, representa hoje uma grande área turística com atividades culturais como o Aquário de Barcelona e o Museu de História da Catalunha.

Em Barcelona, o projeto, segundo Arraes, continua em expansão. “É a nossa melhor referência. A cidade levou, pelo menos, 15 anos para consolidar o projeto.”

O prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), candidato à reeleição em outubro, afirma que Barcelona acertou nas transformações urbanísticas. “A capital da Catalunha é o elemento permanente de inspiração”, afirmou Paes durante o II Seminário Rio-Barcelona – As Olimpíadas e a Cidade, que pretende, até esta quarta-feira (27), discutir experiências e legado urbano para os Jogos de 2016.

“Barcelona é uma cidade que aproveitou as Olimpíadas para se transformar, era uma realidade antes e virou uma cidade completamente diferente depois das Olimpíadas. Quando a gente fala de legado com a possibilidade de transformação, Barcelona é o maior exemplo da história das Olimpíadas”, afirmou.

O porto catalão também se assemelha ao do Rio. “No caso deles, era mais grave ainda porque ali era a única zona da cidade que olhava para o mar e havia uma linha de trem, diferente do elevado da Perimetral que temos aqui. As pessoas não conseguiam olhar para o mar, tinha um obstáculo físico para se chegar ao mar. Eles fizeram algo parecido que estamos fazendo, um túnel, e permitiu que o trem passasse por baixo, facilitando o acesso ao mar, o que transformou a cidade”, argumentou.

O então prefeito de Barcelona, Pasqual Maragall, na época de preparação dos Jogos de 1992 dizia que os jogos deveriam para a cidade e não uma cidade para os Jogos Olímpicos”.

Convidado para vir ao Rio de Janeiro, Maragall relembrou que a participação da população no projeto que visava a transformar a cidade foi predominante para o sucesso do empreendimento e do evento esportivo.

“A implicação das pessoas, os cidadãos, muita gente se envolveu. As transformações  foram na cidade, Barcelona é muito densa com 10 mil habitantes por quilômetro quadrado e estava sempre congestionada. Como uma cidade portuária, o porto é um importante contato com o mundo. Sempre que há um grande acontecimento, a cidade muda. Todos têm um projeto comum, aquele fervor”, admitiu Maragall 20 anos após as Olimpíadas.

Segundo ele, o Rio de Janeiro tem a vantagem de ter abundância de território para recuperar no centro.

Demolição da Perimetral

Em ano de eleição para a Prefeitura do Rio, a demolição da Perimetral tem sido polêmica e motivo de controvérsias entre candidatos -- alguns afirmam que a retirada deste trecho do viaduto prejudicará ainda mais o trânsito no centro do Rio.

De acordo com Eduardo Paes, a demolição de 4,5 km do elevado da Perimetral, importante via de escoamento da cidade, deixará de ser um “obstáculo” para se chegar ao mar.

“As obras de mobilidade e a revitalização da zona portuária são uma mudança radical. A cidade tem no seu centro uma área de 5 milhões de metros quadrados que ninguém usa, é uma área desvalorizada e esvaziada pela maneira como foi tratada, mas também por causa da Perimetral. A cidade vai deixar de ter esse obstáculo e a gente vai dobrar a capacidade com a avenida do Binário e os túneis que estamos fazendo”, defendeu.

O deputado federal Otávio Leite (PSDB), aposta do partido para a prefeitura do Rio que há 12 anos não lança candidatura própria na cidade, é crítico à derrubada do elevado. O candidato tucano já anunciou que tentará impedir a demolição de trecho do viaduto da Perimetral. “No nosso governo, a perimetral não será derrubada. Nada contra o Porto Maravilha, mas tudo a favor do elevado da Perimetral. Lá passam 100 mil veículos por dia, é uma obra que vai derrubar e construir um túnel e custará R$ 1.5 bilhão reais e poderia ser destinado a outros setores de forma mais inteligente”, alegou o candidato ao lançar a sua pré-candidatura, em abril.

Segundo Jorge Arraes, da CDURP, o potencial construtivo da região é de 6 milhões metros quadrados com prédios de até 50 andares. A meta é fazer um mix de construções, tanto residenciais quanto comerciais -- a intermodalidade é uma característica dos projetos de recuperação das áreas portuárias, disse.

O VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) já terá licitação programada para o segundo semestre e está orçado em R$ 1,1 bilhão, com metade dos recursos financiados pelo PAC da Mobilidade (Programa de Aceleração do Crescimento). Este é primeiro projeto no Brasil com o objetivo de integrar os modais, ônibus, VLT, teleférico (a ser construído no Morro da Providência), barcas e próximo à Central do Brasil, onde há estação de metrô e ramais de trem.

Primeiro trecho

A zona do porto já começa a esboçar uma cara nova a partir deste domingo (1º), quando será inaugurado o primeiro trecho de urbanização do Cais do Valongo e Cais da Imperatriz – onde no período colonial desembarcaram 2 milhões de escravos no Rio de Janeiro –, e ruas do entorno, como Barão de Tefé, Venezuela, Camerino e Sacadura Cabral.

Os morros da região como da Conceição e da Saúde serão reurbanizados. A meta, segundo a CDURP, é recuperar 70 km de vias, 650 mil metros quadrados de calçadas, implantar 17 km de ciclovias e aumentar a área verde com o plantio de 15 mil árvores até 2016.

A Praça Mauá ganhará ainda o Museu do Amanhã, projetado pelo arquiteto espanhol Santiago Calatrava, e o Museu de Arte do Rio (MAR).