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Especialistas elencam medidas para o Rio driblar falta d'água que atinge SP

Em setembro o Paraíba do Sul, principal fonte de abastecimento da cidade do Rio, chegou a 12,9%, seu pior nível histórico - Tomaz Silva/Agência Brasil
Em setembro o Paraíba do Sul, principal fonte de abastecimento da cidade do Rio, chegou a 12,9%, seu pior nível histórico Imagem: Tomaz Silva/Agência Brasil

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

04/11/2014 06h00

Apesar de ainda não estar em uma situação tão grave como o Estado de São Paulo, o Rio de Janeiro precisa, segundo os especialistas ouvidos pelo UOL, tomar medidas urgentes para evitar que a estiagem afete o fornecimento de água para a população. A principal é admitir que a escassez é uma realidade e alertar a população sobre a existência do problema.

“A questão não é alarmar a população, mas alertar”, afirma o procurador Eduardo Santos de Oliveira, do Ministério Público Federal de Campos dos Goytacazes, que entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal pedindo o reconhecimento da “calamidade hídrica” no Estado. “Uma vez que você reconhece isso começa a se discutir os usos da água e o uso prioritário.”

Segundo Oliveira, a água no país tem vários usos que competem entre si e, com a seca, o consumo humano torna-se prioridade. “A água é uma matriz energética, utilizada em larga escala pela agricultura, pelo agronegócio, por indústrias e por pessoas”, afirma. “Enquanto você não reconhece a escassez, você não discute esses usos. Talvez seja preciso diminuir o uso para a indústria por um determinado período, desviar a água da produção de energia e buscar fontes alternativas para isso, como o uso de termoelétricas. Temos que começar a discutir a crise.”

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Professor da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e assessor de meio ambiente do Crea-RJ (Conselho Regional de Engenharia do Rio de Janeiro), o engenheiro Adacto Ottoni vê como prioritário o reflorestamento das margens do Paraíba do Sul -- o rio tem hoje apenas 26% de cobertura vegetal ao longo de suas margens, conforme levantamento da ONG S.O.S Mata Atlântica.

“Quando chove em uma área com floresta, a água fica armazenada nos lençóis freáticos, na bacia hidrográfica. É assim que a natureza produz água doce. A floresta regularizada o regime do rio”, explica. Segundo ele, tanto a Cantareira quanto o Paraíba do Sul estão com suas margens impermeabilizadas, o que contribuiu para a situação atual. “O grande problema não foi a seca, mas o descaso das autoridades com a gestão desses mananciais ao longo dos anos.”

Como o plantio e crescimento da mata ciliar, no entanto, demanda tempo, Ottoni sugere a construção de pequenos diques e valas de contenção a fim de reter a água da chuva no solo como medida emergencial, além de barreiras para evitar a erosão das margens. “São obras de engenharia simples que ajudam o solo a reter a água. Recuperando a bacia você evita a seca e a enchente também”, afirma.

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Já para Paulo Carneiro, pesquisador do laboratório de recursos hídricos da Coppe-UFRJ (Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro), é importante estabelecer como prioridade o uso humano da água e a partir daí avaliar a necessidade de suspender atividades como irrigação, compensando o possível prejuízo dos agricultores. “Isso já foi adotado no nordeste, mas é uma medida emergencial”, afirma.

Carneiro lembra ainda que temos que levar em conta o abastecimento “urbano”, não apenas humano, que envolve, além das necessidades básicas, o funcionamento de escolas e hospitais, entre outros. “Também existem indústrias que captam direto do rio Paraíba, que podem ter essa captação reduzia, mas isso precisa ser feito com cautela”, alerta.

Vera Lúcia Teixeira, vice-presidente do Ceivap (Comitê de Integração da Bacia Hidrográfica do Paraíba do Sul), vai mais longe e acha importante que um programa de racionamento comece a ser pensando pelo poder público o mais breve possível. “A população aumentou, a demanda de água aumentou, o rio diminuiu e o cenário próximo não é animador”, diz. “Precisamos fazer racionamento, rever os nossos usos e diminuir as nossas perdas com urgência. Não dá para agir como se a seca não existisse”, afirma, ao insistir na importância de conscientizar a população sobre o problema.

Em setembro o Paraíba do Sul, principal fonte de abastecimento da cidade do Rio de Janeiro e da região metropolitana, chegou a 12,9%, seu pior nível histórico, segundo a ANA (Agência Nacional de Águas). No mesmo período do ano passado, o nível dos reservatórios era de 51,2% e, em 2003, ano mais crítico já registrado até então, 15,7%.

Procurado pela reportagem, o governo do Estado afirmou que o Inea (Instituto Estadual do Ambiente) vem monitorando o comportamento dos reservatórios no Estado e que simulações elaboradas pelo próprio órgão indicam a "inexistência de risco de desabastecimento para os próximos meses".

As chuvas no Rio estão abaixo do normal. Em setembro choveu na estação do Rio de Janeiro 29,2 mm, quando a média histórica, para o período, é de 68,3 mm. O prognóstico do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) é de que volte a chover nos próximos três meses na região do Rio de Janeiro, em quantidade menor, no entanto, que o esperado para a época.